Um psicólogo no campo de jogo


Por José Aparecido da Silva, professor visitante na UFJF

24/09/2019 às 06h54

 

Times de futebol são únicos no sentido de que o estágio final da produção (a partida entre dois times) é algo observado, característica esta que apresenta oportunidades para que se estude o comportamento dos atores envolvidos numa partida. Um desses comportamentos, que gera interesse científico, é o dos árbitros de futebol. Juízes têm a tarefa de implementar regras do futebol, por meio das quais é possível assegurar a obediência dos jogadores em campo. Em jogos europeus, um árbitro faz, em média, 137 intervenções observáveis numa partida, incluindo tiro-livre e pênaltis (aqui com atribuição de decidir se uma falta merece uma advertência, na forma de cartão amarelo ou vermelho), escanteios, laterais e interrupções do jogo por contusão grave. Desde que várias dessas tomadas de decisão são orientadas por julgamento subjetivo, os árbitros de futebol são, frequentemente, acusados de serem inconsistentes e enviesados nelas.

Essas inconsistências e esses vieses têm sido registrados em várias ligas domésticas europeias. Por quê? Uma fonte potencial de viés do árbitro é a pressão social (influência da torcida). Pesquisas também revelaram que as condições arquitetônicas do campo de futebol desempenham papel-chave no viés do juiz, ou seja: tamanho absoluto (quantidade de pessoas) e tamanho relativo da torcida (quantidade de pessoas em relação à capacidade total do estádio), bem como a proximidade dos torcedores às margens do campo (a presença de pista de atletismo).
Parece que o tamanho relativo da torcida importa mais que o tamanho absoluto: tanto o time da casa quanto o time visitante são mais prováveis de incorrer em sanções disciplinares quanto mais próximo estiver o estádio de sua capacidade total. A presença de pista de atletismo tem o efeito de aumentar sanções disciplinares dadas ao time da casa.

Em relação aos efeitos da nacionalidade, dados revelaram que árbitros de grandes associações (Inglaterra, França, Alemanha, Itália e Espanha) são menos predispostos a favoritismo explícito comparados a outras associações de pequenas ligas. Isto é, tendem a conceder poucas sanções disciplinares ao time da casa. Pressão social da torcida influi em partidas de futebol, e, em contextos internacionais, nacionalidade também influi na tomada de decisão dos árbitros.

O papel da distância geográfica no desempenho de times de futebol profissionais, em termos de gols feitos e tomados, revela que tal desempenho diminui com o aumento da distância física do campo no qual se realiza a partida. Pesquisas sugerem que a distância exerce impacto significativamente negativo, e não monotônico, no desempenho defensivo do time de futebol. Com isso, o sucesso do time visitante, para impedir um gol, diminuiu quanto mais distante foi o campo do time adversário. Todavia o impacto da distância foi não monotônico, indicando que o desempenho do time jogando fora de casa torna-se pior até certa distância. Para além desse “ponto crítico”, estimado por volta de 450km, o comportamento defensivo do time melhora novamente. O que isso significa? Que a distância aumenta a probabilidade de o time visitante conceder gols, exibindo um negativo, mas insignificante, impacto sobre a habilidade de fazer gols. Ademais, focalizado o resultado final da partida (ganhar, empatar ou perder), como medida do sucesso global do time, os dados revelaram efeitos negativos significantes da distância.

Estudos investigando como os times de futebol lidam com a potencial desvantagem da distância causada por jogar fora de casa analisaram a suposição de os times poderem aprender a lidar com possíveis desvantagens de viagem a locais distantes. Dados indicaram que o impacto global da distância não é característico de um ano específico nem se torna mais fraco, ou mais forte, ao longo do tempo. Dados também indicaram que a relação estimada entre distância e desempenho do time não parece ser afetada pela composição de times experientes ou menos experientes, dentro de um campeonato específico.

Portanto, apesar da consistência desses dados, fica difícil discriminar, entre causas puramente físicas, psicológicas e organizacionais, as que expliquem as desvantagens provocadas pela distância.

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