As mudanças nos paradigmas da Igreja Católica


Por Matheus dos Reis Gomes, bacharel em Ciências Humanas e pós-graduado (lato sensu) em Ciência da Religião

17/09/2019 às 06h52

Os debates que surgiram na III Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos em 2013 – Os desafios pastorais sobre a família no contexto da evangelização – suscitaram, no coração da Igreja, dos padres sinodais e do Sumo Pontífice, a consciência da situação das famílias no mundo contemporâneo. A liberdade com que o Papa trabalhou as questões doutrinárias, morais, espirituais e pastorais na exortação apostólica pós-sinodal intitulada Amoris Laetitia: sobre o amor na família, sob uma égide teológica tomista, marca, nitidamente, um projeto de “Igreja em saída” do enclausuramento teológico-doutrinário que é passível de interpretações contemporâneas.

Esse projeto de “Igreja em saída” que o Papa anuncia é, na verdade, uma (re)construção de uma proposta teológica pautada em que as discussões doutrinais, morais ou pastorais não devem ser apenas e unicamente resolvidas através de intervenções magisteriais. Relembrando as palavras do Pontífice, “naturalmente, na Igreja, é necessária uma unidade de doutrina e práxis, mas isso não impede que existam maneiras diferentes de interpretar alguns aspectos da doutrina ou algumas consequências que decorrem dela. (…) Além disso, em cada país ou região, é possível buscar soluções mais inculturadas, atentas às tradições e aos desafios locais”. O anúncio do Evangelho não pode estar desligado dos problemas reais da existência humana, configurando-o apenas a um anúncio teórico.

Vieram em uma enorme escala inúmeras críticas ao documento do Pontífice. Intelectuais, bispos e cardeais ligados à área mais conservadora da Igreja manifestaram veementemente algumas posturas sobre a moral católica que Francisco propõe. A Amoris Laetitia aponta para uma abertura que permite – em determinadas circunstâncias – que divorciados ou pessoas que se casaram novamente no civil participem, por completo, do sacramento da comunhão na santa missa. A eleição de novos cardeais feitos pelo Papa Francisco está reestruturando o poder do Colégio de Cardeais no Vaticano. Claramente, como disse o rev. Caio Fábio, um Francisco não faz verão. O cardeal Pietro Parolin salienta que está sendo uma mudança de paradigmas dentro da Igreja Católica.

Talvez seja um horizonte que Francisco quer apontar, sabendo que não conseguirá sozinho fazer todas as reformas sonhadas para a Igreja. É nítido perceber que o Pontífice está dando grandes passos na evangelização, no acolhimento da Igreja com os pobres, marginalizados e na reestruturação política da instituição Igreja. A América Latina possui inúmeros exemplos de avanços políticos frente à opressão governamental. A Teologia do Povo, ramo importante da Teologia da Libertação na América Latina, é, talvez, um dos pontos-chaves para entender a teologia que Francisco está fazendo. Francisco está para além da religião institucionalizada. Está para a relação do Evangelho com os pobres e os oprimidos. Ou seja, está para o povo de Deus.

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