Em que lugar foi parar nosso rio de águas pardas?

Por Marcos Araújo

Todos os domingos, costumo acordar mais cedo para fazer minha caminhada semanal às margens do Rio Paraibuna. Normalmente, essas voltas são realizadas entre as pontes de Santa Terezinha e Manoel Honório. Só não vou contar aqui o número de idas e vindas. Não quero passar vergonha! Digo apenas que a quantidade é o quanto minhas pernas aguentam para manter minha consciência sem culpa. Bom, mas não é sobre minha resistência física que quero falar aqui!

Nas últimas semanas, notei que as águas do ilustre ribeirão, que nasce nas terras de Antônio Carlos, perderam o seu tom original. Suas matizes amarronzadas, pintadas pelo barro, foram tingidas por um verde escuro, quase cinza manchado de veneno. Quando o rio foi batizado, na língua tupi “pará y b´una”, que significa grande rio de águas escuras, com certeza, os índios não imaginavam que, em pleno século XXI, seu curso estaria turvo de poluição. Essa degradação solta aos olhos nestes períodos de estiagem.

Seu leito, de tanto acumular os rejeitos das residências e das fábricas, se transformou num veio malcheiroso que corta a cidade de norte a sul. A triste ideia que nos passa é a de ser uma grande valeta de esgoto a céu aberto, na qual a podridão obscurece o reflexo azulado que vem do firmamento. O que suas águas refletem agora é a agonia de seu perecer.

Não é preciso caminhar muito para que se constate a presença de sacos plásticos, garrafas, carcaças de móveis velhos, pneus e animais mortos que se colocam como obstáculo para a rasa correnteza que insiste em correr lentamente, quase que arrastada, rumo ao encontro do Paraíba do Sul. Sim, porque nosso rio padece!

Quando criança, morava no Bairro Cerâmica, e ouvia histórias sobre uma embarcação que levava gente de Benfica até à altura da Praça da Estação, no Centro. Ficava fascinado pensando como seria navegar pelo Rio Paraibuna e como seria fantástico se isso ainda fosse possível. Ainda mais quando pensamos na precariedade do atual sistema de transporte público. Também ouvia casos de que era possível nadar e pescar, mesmo aqui no perímetro urbano. Como seria maravilhoso se isso voltasse a acontecer numa cidade carente de espaços de recreação! Cresci torcendo para que essas possibilidades fossem realidade num futuro próximo. Todavia, hoje, quando lembro disso, percebo o quanto minha inocência infantil não me deixava entender que, já naquela época, o rio pedia socorro. Atualmente, ele não pede, mas suplica por ajuda antes que se afogue nas próprias águas.

Para nós, juiz-foranos, é urgente que nossos governantes olhem para o rio com respeito, reconhecendo sua importância na história do município e para as próximas gerações. É preciso que a população também tenha apreço e não faça do Paraibuna local de descarte. O poeta Murilo Mendes, no tempo dele, disse que tinha pena do Paraibuna. Tantos anos depois, pena ainda é uma palavra que serve para definir nosso sentimento em relação ao rio, cujas águas pardas perdemos de vista em que lugar elas correm.

Marcos Araújo

Marcos Araújo

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