Há um homem andando pelas ruas da Zona Sul.
É um homem forte, com barba rala e feições de índio.
Quase sempre está sem camisa, usando apenas uma calça esfarrapada e tênis mulambentos. Em outras ocasiões, pode ser visto usando camisa de malha furada imunda, bermuda e descalço, a sola do pé grossa como os pneus de caminhão estourados no meio da BR-040. Em oportunidades mais raras, perambulando pela Cidade Alta, usa agasalho contra o frio que nesses dias lapida afiado nossos mares de morros.
Esse Homem que Anda Pelas Ruas da Zona Sul locomove-se exclusivamente pelas pistas de rolamento. Recusa-se a dividir espaço com os pedestres nas calçadas. É de outra estirpe.
É um príncipe e um general. Um santo e um samurai.
Caminha por entre os carros e as motocicletas, obstinado, o semblante convicto e inabalável, nós que desviemos nossas máquinas e motores do dínamo que ele carrega no peito e faísca seus olhos negros, alimentado pela energia das pernas e braços que não param de se movimentar enquanto ele avança sobre faixas duplas e contínuas e seccionadas.
O Homem que Anda Pelas Ruas da Zona Sul nunca foi visto parado.
Mas também não corre, tampouco molenga. Mantém a mesma marcha, dura, sem malemolência, decidida a ir a algum lugar que talvez ele não saiba onde. Ou talvez um lugar que nós não saibamos imaginar, ignorantes que estamos do maravilhoso e do fantástico.
Ou não.
Talvez o Homem que Anda Pelas Ruas da Zona Sul seja apenas um reflexo da nossa própria inquietude e impaciência. Dessa nossa necessidade de ir, seja lá onde for.
Talvez o Homem que Anda Pelas Ruas da Zona Sul não seja, enfim, um príncipe. Ou um santo.
Talvez o Homem que Anda Pelas Ruas da Zona Sul seja apenas eu.