Ela voltou caminhando por entre as mesas com um andar um pouco duro, de quem ainda está se acostumando com o comprimento das próprias pernas, que não param de crescer. Há beleza num certo desengonçamento do balanço dos braços longos, o rosto de criança, como se faltasse ao tempo e ao espaço alguma noção de proporcionalidade.
Eu tomo uma cerveja, uma red ale que não vale tanto quanto cobram por ela.
Ela toma sorvete de creme com calda de chocolate e carolinas. Um balde daquilo. E toma com gosto.
Retornando do banheiro, sorvete indo pela metade, ela se senta e confidencia.
– Pai, é ruim quando a gente sorri para uma pessoa e ela só, tipo… – e faz uma cara blasé de quem pensa “estou cagando pro seu sorriso, menina”.
Aquilo me dói.
Penso com o que pode ser confundido um sorriso. Os lábios separados, os dentes à mostra… escárnio? A força do musculoso do circo levantando um peso impossível? O rosnar do cão acuado?
Esses pensamentos correm aos saltos pela minha mente em uma fração de segundo até que eu responda:
– É, filha, é muito ruim.
Levanto a mão e peço a conta enquanto vamos terminando um pouco apressadamente nossa cerveja e sorvete, sem sequer nos darmos conta do porquê daquela voracidade súbita.
Pago os R$ 48,80. Crédito, por favor. E, acuado, agradeço com um sorriso.
– Muito obrigado.
Mudo e autômato, o rapaz começa a retirar copo, talheres e guardanapos usados da mesa. Há um pouco de batom em um deles.
Na garrafa sobram dois dedos da cerveja.
Do sorvete, nada.