Tecnologia no carro Ă© bom, mas exige prudĂȘncia
Telas interativas e aplicativos de trùnsito são aliados do motorista, mas compartilhar a própria atenção enquanto dirige pode ser um grande perigo
O mercado automotivo vive a era da informação. Afinal, nunca antes foi tão fåcil para qualquer um de nós se manter conectado à internet, graças à popularidade dos smartphones e à redução do custo dos planos de dados. E esta realidade chegou ao trùnsito, para o bem e também para o mal. Nas lojas virtuais de aplicativos, como Android e iOS, são centenas de facilidades que se apresentam para tornar o håbito de dirigir melhor. SoluçÔes de navegação, identificação de consumo e desempenho do carro disputam os downloads, o que despertou o interesse das próprias montadoras.
Estamos falando dos “infotainment”, popularmente conhecidos como centrais multimĂdia, que, alĂ©m de facilitar na navegação, tambĂ©m funcionam para executar mĂșsicas, vĂdeos, realizar chamadas e exibir mensagens. Se atĂ© entĂŁo os smartphones eram a casa destes aplicativos, agora estas soluçÔes estĂŁo no prĂłprio carro. E todo este aparato tecnolĂłgico Ă© encarado como diferencial na hora de comprar o seu veĂculo, embora a utilização errada possa representar muito perigo.
Pesquisa recente desenvolvida pela Associação Americana de Automobilismo (AAA), em parceria com a Universidade de Utah, nos Estados Unidos, provou que estas ferramentas são as principais responsåveis pela distração do condutor no trùnsito. A AAA desenvolve pesquisas nesta årea desde 2013, com objetivo de auxiliar as montadoras sobre a melhor forma de relacionar tecnologia com segurança.
O estudo mais recente, divulgado no segundo semestre deste ano, avaliou 30 modelos de carros ano 2017 com centrais multimĂdia e o comportamento de 120 motoristas, entre 21 e 36 anos. No teste, os participantes foram orientados a dirigir enquanto faziam uso destas ferramentas, como executar comandos de voz, usar a tela touch para fazer chamadas, enviar mensagens, escolher uma mĂșsica e usar o GPS. O resultado Ă© assustador: todos os motoristas se distraĂram por mais de 40 segundos. E segundo a prĂłpria AAA, nĂŁo precisa mais que 2 segundos para o risco de acidentes dobrar.
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NĂŁo Ă© difĂcil concluir que o estudo feito nos Estados Unidos representa uma realidade que extrapola os limites norte-americanos. Em Juiz de Fora, basta alguns minutos no trĂąnsito para flagrar motoristas usando as telas interativas ou o prĂłprio smartphone. Nos semĂĄforos, ou em engarrafamentos, Ă© comum, por exemplo, o trĂąnsito fluir, mas o carro manter-se parado, por causa da distração do condutor.
E aà não estamos falando mais apenas das telas interativas e os aplicativos voltados a facilitar a relação entre condutor e måquina, mas também de outras inovaçÔes que roubam a nossa atenção, como as redes sociais WhatsApp, Telegram, Instagram, Twitter e Facebook.
Percepção sobrecarregada
Para o doutor em psicologia FĂĄbio de Cristo, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e administrador do Portal de Psicologia do TrĂąnsito (Psitran), a percepção do motorista, quando dividida com estas distraçÔes, fica limitada. âĂ como um computador. Se vocĂȘ abrir vĂĄrios programas ao mesmo tempo, ele vai ficar mais lento para processar as informaçÔes. Em nosso corpo ocorre o mesmo fenĂŽmeno, pois ao sobrecarregar a percepção, estamos colocando em risco a capacidade de detectar os estĂmulos que sĂŁo importantes”, explica.
A tendĂȘncia Ă© acabar privilegiando uma informação em detrimento da outra. E nesta briga, os equipamentos, em geral, saem ganhando. O problema Ă© que vivemos uma fase em que queremos integração o tempo todo, e isso acaba desviando a atenção para a via, que deveria ser o Ășnico foco.
Fåbio de Cristo, doutor em psicologia
Ao que tudo indica, na avaliação do professor, trata-se de um mercado ainda em crescimento. âNĂłs estamos habituados ao uso da internet, nĂŁo apenas na direção. Os hĂĄbitos mudaram bastante. Hoje saĂmos de casa com quase nada, sĂł que nunca deixamos o celular. O uso se tornou habitual, ou seja, utilizamos sem atĂ© dar conta, sem consciĂȘncia. E para o trĂąnsito, este Ă© um grande risco, nĂŁo apenas para os motoristas, como tambĂ©m para motociclistas, ciclistas e pedestres.â
Caminho sem volta
O especialista, que tambĂ©m Ă© um dos organizadores do livro “Pesquisa sobre o comportamento no trĂąnsito”, avalia que Ă© importante os ĂłrgĂŁos reguladores criarem critĂ©rios para o uso da tecnologia na direção veicular e estabelecer formas de fiscalizar os abusos. Isso porque todas as evidĂȘncias mostram tratar-se de um caminho sem volta, uma vez que a indĂșstria de automĂłveis expande o uso das telas interativas, por se tratar de uma demanda de mercado, e os desenvolvedores de aplicativos criam a cada dia novos facilitadores para smartphone.