Atrito entre motoristas e taxistas chega à polícia
A falta de táxis nas ruas, reconhecida pelo Poder Público e percebida pela população, provocada pelo imbróglio jurídico travado entre a categoria, é um dos motivos que tem estimulado o crescimento do mercado da Uber em Juiz de Fora. Nas ruas, a disputa por passageiros entre motoristas da Uber e taxistas que, até então, parecia amistosa, ganhou novos contornos nos últimos dias, já havendo registro de ocorrências policiais envolvendo as partes.
Um dos casos de atrito ocorreu no último domingo (4), quando um motorista da Uber acionou a polícia porque teve o carro danificado por taxistas. Por volta das 3h, ele estava na porta de uma boate, na Rua Engenheiro Gentil Forn, e afirmou à polícia que, assim que a passageira embarcou, um taxista teria arremessado garrafas de vidro contra o veículo, provocando danos no teto e no pára-brisas do carro. As descrições do autor foram repassadas à polícia. Ainda segundo o motorista, na via estavam estacionados cerca de onze táxis.
Há pouco mais de uma semana (30), outra ocorrência foi formalizada, desta vez, na Rua Benjamin Colucci. Por volta das 11h, outro motorista da Uber estava buscando um passageiro quando teria sido ameaçado por um taxista, que teria dito que encontraria a vítima “mais tarde”, em tom ameaçador.
O presidente do Sindicato dos Taxistas, Aparecido Fagundes, lamenta as ocorrências e destaca que a orientação dada aos taxistas é de evitar confrontos, deixando que a fiscalização atue no combate à prática. Aparecido identifica que, em função do déficit de táxis nas ruas, há o crescimento expressivo da concorrência desleal. “Agora eles (os motoristas da Uber) estão mais audaciosos. Param nos pontos de táxi e trabalham de forma mais aberta, o que deixa os taxistas mais irritados.”
Segundo o presidente, os atritos não são favoráveis à classe. “A imagem da praça fica ruim.” Reforçando o entendimento de que a Uber realiza transporte irregular na cidade, o presidente torce pela solução do imbróglio jurídico envolvendo as permissões, que, no seu entendimento, penaliza não apenas os taxistas, mas também a população. A Settra, por meio de sua assessoria, ressaltou que é contra qualquer tipo de violência.
Motoristas da Uber podem chegar a 300
Apesar de a empresa não informar o número de condutores na ativa, nem confirmar se houve incremento da demanda, informações de bastidores dão conta de que hoje mais de 300 motoristas parceiros estão rodando na cidade. O início da operação em Juiz de Fora aconteceu no dia 10 de novembro, quando, na época, não havia mais de 60 associados – uma adesão cinco vezes maior em um intervalo de sete meses. Vale lembrar que a modalidade de transporte já era proibida por legislação municipal mesmo antes de começar suas atividades.
O número de motoristas parceiros, se confirmado, é muito próximo do total de táxis disponível em Juiz de Fora. Conforme a Tribuna noticiou há menos de um mês, existem hoje apenas 380 táxis em atividade, uma defasagem de 165 carros na comparação com a frota que atuava em 2015, antes da licitação. Na comparação com a frota incorporada após o certame, que atingiu o total de 650 veículos, o déficit é ainda maior e chega a 270 táxis.
A Settra mantém os números divulgados em maio e volta a reconhecer que a quantidade é insuficiente para atender a população. Outro motivo que tem estimulado a procura pela modalidade de transporte, não reconhecida pela Prefeitura, é a economia em relação à tarifa praticada pelo táxi, que, inclusive, sofreu aumento de 6,8% em maio.
Auxiliares migram para aplicativo
Uma curiosidade, porém, é que muitos auxiliares que perderam o trabalho, por conta do impedimento legal de renovar as permissões obtidas sem licitação ou transferidas entre particulares em Juiz de Fora, hoje atuam na Uber. Um motorista, que prefere não ser identificado, enquadra-se exatamente nesta condição. Hoje ele transporta passageiros exclusivamente pela plataforma e estima que pelo menos metade dos profissionais na mesma situação também migraram para o aplicativo. Segundo ele, o aumento da procura – e da adesão de novos motoristas – é perceptível, assim como o clima pouco amistoso entre as partes.
Uma percepção é o aumento das corridas partindo dos pontos de ônibus, solicitadas por passageiros que vão para o mesmo destino e decidem ratear a corrida. Procurado, o Consórcios Integrados do Transporte Urbano (Cinturb) afirmou que o sistema de transporte não tem dados que permitam mensurar se houve impacto na demanda em função da Uber. O posicionamento é que todas as alterações verificadas foram sazonais, normais durante o ano. “Acreditamos que o usuário que está sendo impactado é o do táxi, não o do transporte público”, afirmou, por meio de sua assessoria.
Peneira
Embora o número de motoristas parceiros esteja em alta, nem todos conseguem se manter em atividade. A Uber, por meio de sua assessoria, explica que o motorista precisa manter a média de 4.6, do total de 5, na avaliação feita pelos passageiros, que considera quesitos como direção, navegação, limpeza do carro, ar condicionado, cordialidade e profissionalismo. Também podem levar à desativação da conta do condutor a oferta de muitas corridas grátis (tentativa de burlar o aplicativo, fazendo corridas “por fora” e recebendo o pagando em dinheiro), cancelar muitas corridas (a recomendação é manter a taxa de cancelamento abaixo de 10%), ter outra pessoa (não-passageira) no carro e evitar trajetos curtos.
A empresa não se posicionou sobre o possível aumento da demanda na cidade, mas afirmou que está sempre atenta ao equilíbrio entre a oferta e a demanda nos municípios em que atua. O posicionamento é que o tempo médio de espera no país é de cinco minutos e é essa a meta perseguida em Juiz de Fora.
Settra autua 40 por transporte clandestino em JF
A Settra informou que cerca de 40 veículos já foram autuados pela prática de transporte clandestino na cidade. O posicionamento é que há aumento das denúncias e que a pasta está trabalhando “de forma regular” para impedir a prática. A fiscalização, informa, acontece normalmente durante a rotina de trabalho dos agentes de transporte e trânsito.
Segundo a Settra, quem for flagrado nesta condição recebe três tipos de penalidades previstas no Código de Trânsito Brasileiro e em normas municipais. Na legislação municipal, o veículo é autuado pela Lei 13.271/2015, que proíbe o uso de veículos particulares cadastrados em aplicativos para o transporte remunerado individual de pessoas. Há, ainda, a Lei 9.520 que proíbe a exploração de transporte coletivo de passageiros por ônibus, micro-ônibus e veículos sem a devida regulamentação legal junto ao Município.
STF pode se posicionar hoje sobre situação
É esperada para esta quinta-feira (8), uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) referente ao agravo impetrado pela Associação dos Condutores Autônomos do Serviço de Táxi de Juiz de Fora (Acast) contra a decisão judicial que impede a renovação das permissões obtidas sem licitação ou transferidas entre particulares na cidade. O parecer do relator Ricardo Lewandowski foi contrário à reclamação, mas é preciso aguardar o julgamento do mérito.
Em 2014, a Associação dos Taxistas do Brasil (Abratáxi) impetrou ação civil pública pedindo a suspensão da renovação das então 433 placas de táxis adquiridas nas décadas de 1970 e 1980, antes de o serviço ser estruturado na cidade. Em setembro de 2015, a 2ª Vara da Fazenda Pública Municipal acatou o pedido da entidade. A decisão foi assinada pelo juiz Rodrigo Mendes Pinto Ribeiro e define que o Município não deve proceder a renovação das permissões/concessões outorgadas sem prévio processo licitatório ou que tenham sido objeto de transferência entre particulares, ainda que anteriormente outorgadas com licitação.
A Prefeitura fez uma apelação da sentença, porém o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a decisão em segunda instância. A medida começou a vigorar em maio de 2016, mas só começou a ser aplicada, na prática, no início deste ano, por conta do calendário de renovação anual, que aconteceu de janeiro a março. Seguindo o cronograma, que leva em conta o número final das placas, cerca de 225 taxistas nesta condição não conseguiram renovar o alvará de permissão, estando, portanto, impedidos de circular nas ruas.
Outra ação
Em relação à decisão liminar obtida pelo Sindicato dos Taxistas no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que impede o Município de realizar qualquer ato de convocação tendo por base a última licitação para o serviço de táxi, pelo menos até o julgamento do agravo de instrumento ajuizado pela entidade de classe, sob pena de multa, houve a manifestação da Prefeitura pedindo a revogação da liminar e a manifestação dos auxiliares solicitando o ingresso no processo, também com o objetivo de anular a medida.
O desembargador Renato Dresch, relator do agravo, concedeu vistas para o advogado do sindicato, Flávio Tavares, que está apresentando a defesa contra essas duas manifestações. A expectativa dos auxiliares é de uma possível reversão do quadro nas próximas semanas. Com a medida, a convocação de 243 taxistas, publicada dia 11 de abril, que serviria também para substituir as permissões cuja renovação não foi autorizada, segue sem efeito. Em março, o Sindicato dos Taxistas ajuizou ação civil na 1ª Vara da Fazenda Pública, questionando o “desvio de finalidade” da licitação, que teria sido criada originalmente para ampliar a frota em 105 veículos.
*Colaborou Marcos Araújo