O sonho bom de Villani-Côrtes


Por MAURO MORAIS

29/10/2015 às 07h00- Atualizada 29/10/2015 às 08h35

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Na memória de Edmundo Villani-Côrtes, a paisagem da Juiz de Fora que deixou para trás em 1970. “A cidade cresceu, mudou a fisionomia. Na minha época, havia muitas árvores, era tudo muito bonito”, recorda-se, citando o córrego que cortava a então Avenida Independência, hoje Presidente Itamar Franco, a mesma onde ainda mora seu irmão, José, que lhe hospedará para o concerto da sexta edição do Circuito Música Brasilis, que acontece nesta quinta, às 20h, no Cine-Theatro Central.

Ao lado do barítono Lício Bruno, da pianista Cláudia Marques, do violonista Luis Leite e do narrador Pascoal da Conceição, o maestro e pianista Villani-Côrtes tem sua carreira, de mais de 60 anos, reverenciada, num diálogo a outra ode, ao escritor Mario de Andrade. Dirigido e idealizado pela cravista e pesquisadora Rosana Lanzelotte, o evento que já percorreu sete cidades brasileiras busca resgatar e divulgar partituras de compositores nacionais, disponibilizadas virtualmente (www.musicabrasilis.org.br). Recolhidas por Mario de Andrade, as modinhas imperiais editadas por ele em 1930 dividem a rede com criações do artista juiz-forano premiado duas vezes pela Associação de Produtores e Críticos de Arte de São Paulo por suas peças.

Executando obras de Cândido Inácio da Silva, Heitor Villa-Lobos, além do próprio Villani-Côrtes e de outros compositores brasileiros, o juiz-forano apresenta seu virtuosismo iniciado pela influência de um pai flautista e de uma mãe pianista. “Quando eu era muito jovem, lembro-me de muitos grupos de choro que iam lá na minha casa”, conta, recordando-se de quando o pai viveu dificuldades financeiras e viu no piano uma possibilidade de fôlego para suas finanças. “Não desisti e fazia aulas na casa de uma tia.”

Em sua cronologia de despedida da terra natal – “Quando comecei a estudar, ia para o Rio de Janeiro fazer aulas e acabei me fixando. Voltei à cidade, mas em 1970 mudei-me para São Paulo” -, Juiz de Fora é o nascedouro de uma trajetória ascendente e também das belas paisagens que sempre lhe inspiraram. “Foi uma cidade que me marcou profundamente. Fazia natação, participei de campeonatos quando criança. Estudei no Granbery. A vida era um sonho bom”, emociona-se ele, que sempre recorreu ao belo para criar suas mais de 700 composições, segundo o último levantamento que realizou, em 2012.

“Quando comecei a compor, meu objetivo principal era fazer o que gostava. Sempre gostei muito de tocar. É uma forma de expressão suprema. Buscava aquela emoção estética que sentia ao ver as nuvens, as árvores, as flores. A abstração da música me permitia fazer isso. O som tem uma comunhão profunda com a natureza”, comenta o ex-professor da Academia Paulista de Música e do Instituto de Artes da UNESP, além de reconhecido arranjador para TV e parceiro de palco de Maysa.

Aos 85 anos, orgulha-se em dizer dos dias que correm. “A vida está cada vez mais agitada. Este ano já fui a mais de 15 cidades diferentes, recebendo homenagens e fazendo concertos. É muito gratificante viver isso agora”, diz, elencando lugares distantes entre si, como Manaus, Belo Horizonte e Recife. Entre suas recentes alegrias, está a eleição para a Academia Brasileira de Música, instituição fundada por Villa-Lobos. “Nunca passou pela minha cabeça participar de uma academia”, pontua o ocupante da cadeira de número 11, cujo patrono é o compositor e professor Domingos Moçurunga.

Sem nostalgias, Villani-Côrtes diz sentir falta de quando “o mundo era diferente, as coisas eram mais simples”, mas acompanha a cena contemporânea da música sem pessimismos. “Infelizmente, o que tem qualidade, as pessoas profundas e verdadeiras, o que é um pouco raro, não tem muita aceitação do grande público. Mas a história da humanidade sempre foi assim, não é uma questão da atualidade”, comenta, dizendo-se à vontade na academia, onde encontra pares com afinidades e verdades semelhantes às suas. “Não posso reclamar dos dias de hoje quando o que está acontecendo comigo vai muito além do que eu poderia esperar. Recebo muito carinho das pessoas, elas estão interessadas no que faço”, comemora.

CIRCUITO MÚSICA BRASILIS

Nesta quinta-feira, às 20h

Cine-Theatro Central

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