Produtor de café é condenado a pagar R$ 300 mil em indenização por manter trabalho escravo
Justiça do Trabalho ainda aplicou multas a fazendeiro condenado
O proprietário de uma fazenda em Ilicínea – cidade mineira distante cerca de 273 quilômetros de Juiz de Fora – foi condenado ao pagamento de uma indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 300 mil, por submeter trabalhadores a condições análogas à escravidão. No julgamento realizado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG), o desembargador relator do caso destacou a gravidade das condições e a necessidade de medidas para coibir a repetição dessas práticas.
De acordo com os relatórios de fiscalização, os trabalhadores da fazenda foram encontrados em situação de extrema precariedade. Eles não tinham Carteira de Trabalho assinada, eram obrigados a comprar seus próprios equipamentos de proteção e a pagar pela alimentação, que era descontada dos seus salários. “Tudo o que nós comprávamos era descontado, inclusive luvas e panos de colheita utilizados”, declarou um dos trabalhadores, ouvido como testemunha.
Além disso, segundo a Justiça do Trabalho, os trabalhadores estavam alojados em locais inadequados e trabalhavam de domingo a domingo, das 6h às 18h, sem direito a descanso. Inclusive, na véspera da fiscalização, um dos funcionários havia sofrido um grave acidente, já que ele não estava habilitado para conduzir um trator.
O Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou a ação civil pública após uma fiscalização constatar as condições degradantes. A pasta argumentou que as práticas na fazenda configuravam condições análogas à escravidão, citando as irregularidades relatadas e mais outras.
Defesa do condenado
O proprietário da fazenda de café alegou que as condições de trabalho não eram degradantes e que os trabalhadores estavam livres para sair quando quisessem. Em depoimento, o fazendeiro comparou o alojamento precário dos trabalhadores com hotéis e pousadas do litoral, onde os veranistas, quando são em grande número, dormem em colchonetes e sacos de dormir. Ele também questionou a legitimidade do MPT para mover a ação e afirmou que os depoimentos dos acusadores eram inconsistentes.
Na decisão de primeiro grau, o juízo da 1ª Vara do Trabalho de Varginha reconheceu as condições precárias, determinando a regularização da situação dos trabalhadores, fixação de multas diárias e pagamento de indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 50 mil. As obrigações determinadas na sentença incluem proporcionar capacitação aos trabalhadores para manuseio e operação segura de máquinas, equipamentos ou implementos.
Em recurso, o relator rejeitou as alegações do fazendeiro. Ele realizou exame detalhado das provas produzidas no processo e, entre elas, estavam depoimentos de trabalhadores colhidos durante a fiscalização e em processos conexos. Destacaram-se os depoimentos que foram utilizados como prova emprestada. Ele frisou que o material apresentado pelo MPT, incluindo depoimentos de trabalhadores e o relatório de fiscalização, eram suficientes para confirmar a existência de condições análogas à escravidão.
“Os trabalhadores estavam submetidos a condições degradantes, sem equipamentos de proteção, alojados em locais inadequados e sem registro formal”, pontuou o relator. “Para a caracterização do trabalho em condição análoga à de escravo, nos termos do Código Penal, não é necessário que se comprove cerceio da liberdade de ir e vir ou mesmo o cerceamento da liberdade de locomoção, bastando a submissão da vítima ‘a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, ‘a condições degradantes de trabalho’. Basta uma delas e não a combinação de todas para a configuração do tipo penal”, completou.
Multas e indenizações
Em decisão unânime, os julgadores da 11ª Turma do TRT-MG confirmaram a decisão de primeiro grau e aumentaram o valor da indenização por danos morais coletivos de R$ 50 mil para R$ 300 mil, quantia a ser revertida a entidade pública ou privada sem fins lucrativos.
Além disso, foram impostas multas diárias para assegurar a regularização das condições de trabalho na fazenda. As multas aplicadas tiveram valores de R$ 30 mil por descumprimento de cada obrigação de fazer e não fazer, além de R$ 1 mil por trabalhador prejudicado.
As obrigações impostas, acrescentadas pelo relator, incluem evitar a manutenção de empregado trabalhando sob condições contrárias às disposições de proteção do trabalho, seja submetido a regime de trabalho forçado ou reduzido à condição análoga à escravidão. O fazendeiro deverá também conceder aos empregados o repouso semanal remunerado de 24 horas seguidas, de preferência aos domingos.
De acordo com a decisão, o fazendeiro deverá projetar, construir, operar e manter todas as partes das instalações elétricas de maneira a prevenir, por meios seguros, os perigos de choque elétrico e outros tipos de acidentes.
*Estagiário sob supervisão do editor Gabriel Silva