Para além de Machado de Assis: 5 clássicos da literatura brasileira que merecem viralizar
Nas últimas semanas, “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, escrito há mais de 100 anos, viralizou nas redes sociais e chamou atenção para a rica produção literária do país
“Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico com saudosa lembrança estas memórias póstumas”. Há grandes chances desta ter sido a frase mais reproduzida nas redes sociais dos brasileiros nas últimas semanas. Uma das dedicatórias mais conhecidas da literatura nacional, a abertura do livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, escrito por Machado de Assis em 1881, viralizou na internet e ganhou diferentes versões pronunciadas de acordo com os sotaques espalhados pelas regiões do Brasil. Antes, o livro havia alcançado a primeira posição entre os mais vendidos da Amazon após uma estadunidense ter publicado um vídeo dizendo estar fascinada pela obra. Toda essa repercussão chamou atenção para a rica e vasta produção literária brasileira. Pensando nisso, a Tribuna listou 5 clássicos que também merecem viralizar e conquistar mais leitores.
A função dos memes vai muito além de fazer rir. A doutora em Comunicação pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e vice-coordenadora do Observatório da Qualidade no Audiovisual, Daiana Sigiliano, explica que apesar do humor ser muito característico na produção de conteúdo em rede no Brasil, o meme vai além. “O meme nos ajuda a refletir sobre o contexto social, cultural e político que estamos inseridos, acionando diversas camadas interpretativas, estabelecendo uma inter-relação entre a compreensão crítica e a produção criativa na internet.” Em relação à viralização da dedicatória de Machado de Assis, a pesquisadora aponta que esse movimento não incentiva apenas a leitura de obras clássicas, mas também a produção de conteúdo a partir dessas obras, seja reforçando, ampliando e até ressignificando a história.
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“Nós observamos a importância das redes sociais na popularização de filmes, livros, séries e outros produtos midiáticos. Isto é, a partir de um vídeo publicado no TikTok – rede social essa que recentemente também popularizou diversos filmes nacionais (Cidade de Deus, Gabriela, Eu Sei Que Vou Te Amar, etc) entre a geração Z por conta de edits – a discussão se espalhou em diversos âmbitos. Deste modo, temos tanto conteúdos mais aprofundados como, por exemplo, os vídeos em que a tradutora Flora Thomson-DeVeaux detalha todo o processo de tradução da obra para o inglês, até conteúdos colaborativos nas redes sociais, como uma Thread no Twitter que reúne o aúdio da leitura da dedicatória em diferentes sotaques”, analisa Daiana.
Confira a lista com clássicos da literatura brasileira além dos livros de Machado de Assis:
Grande Sertão: Veredas
Escrita em 1956 por Guimarães Rosa, essa obra revolucionou a literatura brasileira com inovações na linguagem e na estrutura narrativa. O autor trouxe expressões regionais, neologismo, símbolos e mitos para criar um universo mítico do sertão mineiro. O livro gira em torno de Riobaldo, um jagunço que conta sua trajetória de vida desde a juventude até chegar em um bando, retratando temas como amor, sofrimento, força, violência e alegria. Riobaldo conta sua história a um interlocutor desconhecido, que nunca se pronuncia, a quem ele chama de “Senhor”, “Moço” ou “Doutor”. Mas vários outros personagens, como Diadorim e Zé Bebelo, contribuem para que a trama seja um clássico.
As Meninas
Primeira mulher brasileira a ser indicada ao Prêmio Nobel de Literatura, Lygia Fagundes Telles escreveu esse livro em 1973, em plena Ditadura Militar, falando sobre a trajetória de três amigas, Lorena, Lia e Ana Clara, que vivem em um pensionato no centro de São Paulo, em meio a um mundo conturbado por rápidas transformações. As meninas criam uma forte rede de apoio entre si e temas como sexo, drogas e repressão política rondam a narrativa. Cada capítulo é narrado sob a perspectiva de cada uma das personagens. O livro ousou ao colocar os personagens masculinos em papel secundário, algo incomum para a época.
Quarto de despejo: diário de uma favelada
Livro de estreia de Carolina Maria de Jesus, lançado originalmente em 1960, “Quarto de despejo: diário de uma favelada” já vendeu mais de 1 milhão de cópias e foi traduzido para quatorze idiomas. A obra é um relato duro da realidade de Carolina, que era catadora de papel e escrevia nos cadernos que encontrava no lixo. As páginas dos diários da autora contam com um olhar sensível, mas realista o que ela viu, viveu e sentiu quando vivia na favela do Canindé, em São Paulo, com três filhos. A narrativa trata de questões de raça, classe e gênero em um cenário de extrema pobreza e sem dúvidas é um documento fundamental para entender a realidade brasileira.
A Paixão Segundo G.H
Quando se fala em clássicos, Clarice Lispector está no topo da lista. Embora seja uma autora com grande apelo nas redes sociais através de frases soltas, é importante saber que nem todas são de sua autoria. Para isso, que tal mergulhar na obra de Clarice e por que não começar por um dos mais falados? “A Paixão Segundo G.H”, publicado pela primeira vez em 1964, conta o pensar e o sentir de G.H., a protagonista-narradora que despede a empregada doméstica e decide fazer uma limpeza geral no quarto de serviço, que ela supõe imundo e repleto de inutilidades. As descobertas vão muito além de uma barata na porta do armário, acompanhamos os devaneios e reflexões de G.H sobre vida, morte e tudo o que há nesse caminho.
Capitães da Areia
As obras de Jorge Amado conquistaram as telas da televisão brasileira. Seus romances deram – e ainda dão – vidas a minisséries, filmes e novelas. Esse título mesmo, “Capitães da Areia”, um dos livros mais vendidos do autor baiano, virou filme em 2011. Publicado em 1937, o livro causou escândalo e muitos exemplares chegaram a ser queimados por determinação do Estado Novo. Mas até hoje desperta o interesse de várias gerações. Cinco adolescentes pobres que cresceram nas ruas de Salvador e moram juntos em um trapiche abandonado dão vida a essa história. A narrativa acompanha as vivências desse grupo, que praticam furtos e são constantemente perseguidos pela polícia. Jorge Amado aguça a curiosidade do leitor que se envolve com o desejo de saber o destino desses jovens.