Quase metade dos estudantes da UFJF são cotistas
Além disso, percentual de alunos negros triplicou ao longo dos últimos dez anos; para Universidade, percentual representa avanço, mas política corre riscos
A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) possui 46,9% de seus estudantes beneficiados por cotas. Destes, 24,21% são negros e indígenas – percentual três vezes maior do que o registrado há dez anos atrás. Os números são fruto da política de cotas instalada na universidade desde 2006 e caminham para alcançar a meta estipulada pela Lei nº 12.711, de agosto de 2012, que reserva 50% das matrículas para alunos de escola pública.
O percentual representa um avanço, mas corre riscos, afirma o diretor da Diretoria de Ações Afirmativas (Diaaf) da UFJF, Julvan Moreira de Oliveira.
De acordo com ele, o corte de verbas de mais de R$ 30 milhões da universidade prejudica a permanência desses estudantes no ensino superior. “Hoje, mais da metade dos estudantes são oriundos de famílias com até 1,5 salário mínimo. E, em sua maioria, são jovens negros. É justamente na permanência desses estudantes que o corte de verbas vai afetar com mais intensidade, visto que muitos dependem de bolsas de assistência estudantil.”
Julvan ainda ressalta que, mesmo que o número de cotistas tenha aumentado significativamente ao longo dos últimos anos, a quantidade de alunos negros ainda deixa a desejar. Segundo dados do último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Minas Gerais possui 53,5% da sua população formada por negros. “Na UFJF, nós temos apenas 24,2% de autodeclarados negros, um número muito abaixo do ideal.”
Apesar disso, Julvan comemora o sucesso da política de cotas. “É muito bom saber que a política fez efeito e nós estamos quase chegando aos 50% de estudantes cotistas. Isso mostra a democratização da educação pública e da universidade como um todo. Uma forma que nós temos que tentar combater a tamanha desigualdade que nosso país vive.”
Primeira de Minas a adotar cotas
Em 2006, a UFJF se tornou a primeira do Estado de Minas Gerais a implantar cotas. Naquele ano, de um total de 2.182 ingressantes do primeiro e segundo semestres nos cursos da universidade, somente 407 discentes optaram pela entrada via sistema de cotas, sendo 87 pertencentes ao grupo A, daqueles autodeclarados negros ou indígenas, o que representa um percentual de apenas 3,9%.
Os números foram crescendo de forma tímida até 2012, ano anterior à implementação de fato da lei federal das cotas (nº12.711). Naquele ano, dos 4.791 alunos matriculados na UFJF, 1.613 eram cotistas (33,66%), sendo 393 autodeclarados negros ou indígenas (8,2%). A grande mudança no panorama aconteceu em 2013 com o ingresso nas normas da lei. Dos 3.963 alunos que entraram na UFJF, 1.900 se utilizaram do sistema de cotas (47,8%), sendo 1.001 (25,25%) autodeclarados negros ou indígenas. Os números se mantêm estáveis desde então _ do total de ingressantes no primeiro semestre de 2022, 46,9% são cotistas, sendo 24,21% negros e indígenas.
Revisão da Lei pode acontecer neste ano
Em 2022, a Lei das Cotas tem previsão para ser revisada, quando completa dez anos de vigência. O 7º artigo da lei recomenda que a revisão seja feita, porém não define quais órgãos são responsáveis pela discussão desta análise. Até o momento, ainda não há data definida para que a discussão se inicie.
Apesar de suscitar polêmicas, a política de cotas é aprovada pela maior parte da população brasileira. Em pesquisa realizada em março deste ano pelo Datafolha, em parceria com o Centro de Estudos de Opinião Pública da Universidade Estadual de Campinas (Cesop-Unicamp), metade da população brasileira se declara a favor das cotas raciais nas universidades públicas. Cinquenta por cento das 2.090 pessoas ouvidas pelo estudo se mostraram a favor das cotas, 34% contra, 12% dos entrevistados não souberam responder e 3% se mostraram indiferentes.
A cientista social Mirian Stela Marques ressalta a importância das cotas para busca de uma condição mais igualitária do acesso à educação. “As condições entre negros e brancos são diferentes. E, para além da raça, a diferença está no acesso à educação, às oportunidades e aos meios de ingresso no ensino superior. Enquanto as políticas públicas não investirem na base educacional, o ciclo da nossa história se repete.”
Ela, que é formada pela UFJF, afirma que, em sua turma de 2006, haviam 31 alunos, sendo que 27 eram brancos e apenas quatro negros. “Naquela época, as cotas eram algo muito recente, muito novo. Alguns professores incentivavam a gente a fazer uso das cotas para alunos da rede pública. Acreditavam ser uma política temporária, para sanar as desigualdades de ensino e raciais”, lembra.