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Ação humana está por trás de queimadas em JF e região

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Queimada no Morro do Cristo em agosto destruiu 6,5 hectares, segundo o Corpo de Bombeiros (Foto: Leonardo Costa)
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Apesar de a fumaça que encobriu Juiz de Fora e região ter dado uma trégua nos últimos dias, as queimadas alastradas pelo Brasil revelam a emergência climática e a necessidade de políticas mais incisivas para coibir a ação humana que estaria por trás da maioria dos focos de incêndio. Embora a longa estiagem deste ano tenha agravado essas ocorrências, o gatilho delas estaria em atos da população, sejam eles criminosos ou não, conforme afirma o próprio Corpo de Bombeiros, que tem se desdobrado para dar conta de debelar as chamas em áreas verdes, muitas delas, inclusive, de proteção ambiental. Só entre agosto e 15 de setembro deste ano, a corporação registrou 267 incêndios em vegetação no município, 60,8 % a mais do que o contabilizado no mesmo período de 2023, quando houve 166 casos. O número total de ocorrências em 2024 chega a 710 e também já supera em quase 60% os 444 registros de todo o ano passado.

“É muito difícil determinar a causa e autoria do incêndio sem um relato de testemunha ou registro como filmagem. A grande maioria é fruto de ação humana, acidental ou não, que indica cometimento de crime, no entanto, não é possível precisar um número exato”, pondera o assessor de comunicação do 4º Batalhão de Bombeiros Militar (BBM), tenente João Victor Alves de Oliveira. Ele reforça: “A grande maioria dos incêndios ocorre por fatores humanos. As principais causas de queimada usualmente são limpeza de vegetação, queima de lixo e renovação de pasto.” O assessor enfatiza que meios acidentais, como cigarros acesos, faíscas de escapamentos de veículos, de atrito ou calor de trilhos de trem, ou por arco elétrico (descarga) em instalações elétricas são raros e incomuns.

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O tenente João Victor acrescenta que as únicas queimadas naturais já registradas na região foram provocadas por descargas elétricas, mas, na atual situação do clima seco, essas não ocorrem. “Não há registro de combustão natural em nossa área”, aponta, reiterando: “Os incêndios têm como sua principal causa a ação humana, mesmo que acidentalmente. No entanto, não é possível afirmar isso com certeza, sendo necessário um trabalho quase impossível de investigação de todos os registros para obtenção de tal dado de maneira certeira”, avalia.

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Terrorismo climático

No dia 14, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, afirmou que o Brasil vive um “terrorismo climático” e uma espécie de “aliança do crime com a emergência climática”. “Há uma proibição em todo o território nacional do uso do fogo, mas existem aqueles que estão fazendo um verdadeiro terrorismo climático usando a temperatura alta e a baixa umidade e ateando fogo no nosso país, prejudicando a saúde das pessoas, a biodiversidade, destruindo as florestas”, disparou ela, sobre os perigos da cortina de fumaça.

Em toda a região coberta pelo 4º BBM, foram registradas 2.396 queimadas em vegetação até 15 de setembro, 57,8% a mais do que o total de casos em 2023, quando houve 1.518 ocorrências. Os registros de crimes ambientais são de responsabilidade da Polícia Militar do Meio Ambiente, enquanto a investigação cabe às polícias Civil e Federal. “Quando temos indícios de autoria, passamos para eles tomarem as providências, sejam essas de multa, condução ou de prisão”, informa o tenente João Victor. Dados divulgados pela 4ª Companhia da Polícia Militar de Meio Ambiente (PMMA) revelam que setembro é o pior mês de 2024 relacionado a queimadas na Zona Rural, nos 149 municípios da região cobertos pela unidade. Só nos primeiros dez dias de setembro, ocorreram 46 incêndios, mesmo número contabilizado desde janeiro até a mesma data em 2023. Mais de três milhões de metros quadrados de área já foram queimados, equivalente a mais de 300 campos de futebol oficiais.

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Devido à escassez de chuva significativa, que tende a piorar, a PMMA anunciou, no dia 10, a segunda fase da Operação Verde Minas, integrando órgãos ambientais para combater o fogo. Na ocasião, o tenente Lucas Carvalho afirmou que os problemas com queimadas têm se acentuado e que a ação humana está contribuindo para isso. Nesse sentido, já foram aplicados mais de R$ 3 milhões em multas este ano, sujeitas a defesa e recurso.

Três grandes incêndios ocorridos neste mês na região e provocados por limpeza de lote foram destacados pela PMMA. Um deles aconteceu dia 6 no Bairro Igrejinha, Zona Norte de Juiz de Fora. Dois dias antes, em Ritápolis, a cerca de 131 quilômetros de distância. O terceiro foi registrado dia 9, no Parque Estadual da Serra do Brigadeiro, em Ervália. Os relatórios foram enviados para a Justiça, e os autores respondem pelo artigo 41 da Lei de Crimes Ambientais, cuja pena pode chegar a quatro anos de prisão.

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Na noite de quarta-feira (18), outra situação semelhante com indícios de crime culminou na prisão em flagrante de um homem, de 31 anos, suspeito de atear fogo em um terreno baldio em Santa Rita do Ibitipoca, situada a menos de 100 quilômetros de Juiz de Fora. O fogo na vegetação alta e seca foi descoberto durante um patrulhamento na região central da cidade. Houve risco para residências próximas, sendo mobilizados caminhões-pipa da Prefeitura e dos Bombeiros de Barbacena.

PF tem 85 inquéritos de queimadas

A Polícia Civil de Juiz de Fora afirma estar trabalhando para identificar possíveis infratores. “Temos feito levantamentos junto à PM Ambiental e o Corpo de Bombeiros para uma atuação em conjunto em ocorrências do tipo, buscando identificar as causas dos incêndios e a possível responsabilização dos envolvidos”, garante o delegado responsável pelo Núcleo de Atendimento às Ocorrências de Maus-Tratos a Animais, Marcos Vignolo, por meio da assessoria.

Já a Polícia Federal não informou dados da cidade e região, mas destacou à Tribuna que o número atual de inquéritos em andamento, relacionados aos incêndios em vegetações, é de 85, em todo o país. “As investigações estão em andamento, mais informações serão divulgadas em momento oportuno.”

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Incêndio destrói cerca de 6,5 hectares de mata no Morro do Cristo

Agosto foi o mês com mais queimadas em vegetação neste ano em Juiz de Fora, com 179 incêndios ou 82,6 % a mais que os 98 registros do mesmo mês de 2023. Um dos casos mais graves foi na área de preservação do Morro do Cristo. De acordo com a assessoria do 4º BMM, o fogo que atingiu a mata próxima ao mirante, no Bairro São Pedro, Cidade Alta, consumiu uma área de 6,5 hectares ou 65 mil metros quadrados da Unidade de Conservação Municipal, correspondente a mais de seis campos de futebol.

Os diversos focos espalhados por pontos de difícil acesso entre os dias 20 e 21 de agosto chegaram perto de edificações, enquanto a fumaça tomava a cidade e piorava a qualidade do ar, no momento em que a população já sofria com a baixa umidade. “O Corpo de Bombeiros tem atuado intensamente no combate e prevenção a queimadas, não adentrando na área de responsabilidade criminal ou de investigação, contando com o apoio de outros órgãos, como as polícias Militar e Civil, para tal verificação”, destaca a corporação.

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Conforme a assessoria, entre as principais dificuldades enfrentadas pelos bombeiros nas ações de combate a essas queimadas estão: as altas temperaturas durante o dia; os terrenos irregulares, como morros, pedras e barrancos; os ventos intensos e irregulares que mudam de direção com facilidade e intensificam as chamas e alteram a progressão dos incêndios; as grandes proporções, que podem chegar a quilômetros de extensão; o tempo seco, que deixa a vegetação mais propícia ao incêndio e contribui para reignição; o elevado número de ocorrências, de forma que com os recursos limitados, os militares têm que priorizar aquelas que representam mais risco para a sociedade; além do desgaste constante.

“Com o elevado número de incêndios, os militares se deslocam incessantemente de um incêndio para o outro, desgastando o militar pela atividade exaustiva de andar por terrenos irregulares por grandes distâncias e combater os focos, carregando materiais pesados, como sopradores e bombas costais. O combate às chamas desidrata os militares, e a fumaça irrita os olhos e a respiração dos militares, mesmo com a utilização de EPI’s”, observa o tenente João Victor.

Como evitar as queimadas?

Bombeiros estão desgastados com a quantidade de queimadas em JF e região (Foto: Divulgação Corpo de Bombeiros)

“A principal forma de evitar queimadas é não utilizar fogo em vegetação”, resume o assessor de comunicação do 4º BBM, tenente João Victor. “Limpeza, renovação de plantio e descarte de lixo possuem alternativas que são mais benéficas para o solo e principalmente para a sociedade, sem riscos de causar incêndios.”

Uma forma eficiente de prevenção para evitar que as chamas se alastrem por grandes terrenos verdes é o aceiro, que consiste na limpeza total dos limites das partes a serem preservadas. “Dessa forma, a chance do fogo prosseguir para outras áreas é reduzida. O aceiro deve ter largura igual ou superior a uma vez e meia a altura da vegetação”, orienta o bombeiro.

Além disso, o tenente João Victor acredita ser importante disseminar a cultura de que a queimada é prejudicial. “A população detém o poder da opinião pública, que é capaz de mudar a mentalidade e a cultura de uma sociedade. O trabalho de conscientização pode e deve ser feito por todas as pessoas.” Aliado a isso, é preciso denunciar os autores. “É essencial que as pessoas denunciem e testemunhem contra os responsáveis pela causa do incêndio. O ideal é que a denúncia seja feita enquanto a pessoa está atuando, para que a polícia tenha autonomia de efetuar a condução do suspeito”, recomenda.

Denúncias podem ser feitas pelos telefones 190 (PM), 181 (Disque-Denúncia Unificado) ou 193 (Bombeiros).

 

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