Como é envelhecer em Juiz de Fora?
Entre os municípios com mais de 500 mil habitantes, Juiz de Fora é o terceiro do Brasil com maior concentração de idosos em sua população: 13,6%. Com base no Censo 2010, o ranking dos municípios enviado à Tribuna pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que a cidade só fica atrás de duas capitais: Porto Alegre (15%) e Rio de Janeiro (14,9%), que também ultrapassam o índice nacional, de 10,8%. Dados do último levantamento demográfico dão conta de que existem 70.288 pessoas na terceira idade em JF, mas, conforme estimativas do IBGE divulgadas em 2014, a tendência é que este número também tenha aumentado, uma vez que a população apresentou crescimento de 6,6%, passando de 516.247 para 550.710 habitantes.
O número de idosos desperta o seguinte questionamento: “Como é envelhecer em Juiz de Fora?” A resposta, para estudiosos, revela uma incógnita, pois Poder Público e sociedade ainda desconhecem quais são as necessidades desta faixa etária para o envelhecimento com dignidade, estrutura e respeito. Por parte da população idosa, embora existam lacunas, muitos daqueles ouvidos pela Tribuna classificam a cidade como um lugar onde é possível chegar à terceira idade com qualidade de vida e tranquilidade. Os oito personagens ouvidos para esta matéria classificaram a tranquilidade como um dos pontos positivos da cidade, enquanto a maior parte deles reclamou de questões como desrespeito e preconceito.
“Se tem um motivo que me faz ficar em Juiz de Fora é o de estar sempre perto das amizades que conquistei, por isso, digo que envelhecer aqui é muito gostoso. Juiz de Fora é uma terra linda, mas, para ela abraçar o idoso de vez, falta ter mais respeito conosco”, destaca o aposentado José Francisco Garcia, o Zezé Garcia, 80 anos. A falta de educação a que Zezé se refere é o tratamento dado ao idoso por parte dos mais jovens, como por exemplo, a ausência de gentilezas dentro dos coletivos onde os lugares nem sempre são cedidos aos mais velhos. “Eles se esquecem que também irão envelhecer”, diz Zezé, acrescentando que a única coisa ruim de envelhecer é receber a aposentadoria. “Nunca é o suficiente, e precisamos fazer bicos para complementar a renda. Acho muito injusto.”
Somado ao desrespeito, o preconceito também é um fator observado pelos idosos. A aposentada Sirley Golhath Werneck, 79, já sentiu e presenciou atitudes assim. “Eu acabo deixando passar e faço vista grossa, mas a gente sente. Não precisa dizer nada, percebemos só da forma com que olham e tratam a gente. Para você ver, isso acontece até na família. Ao invés de tratarem o idoso como alguém vivido e experiente, que tem muito a ensinar, colocam a gente de lado”, pontua. Para Sirley, a cidade oferece um ótimo ambiente e equipamentos públicos para a terceira idade, mas falta investir em uma programação cultural, aos finais de semana, voltados para o idoso.
A observação feita por Sirley reforça os estudos do assistente social e gerontólogo José Anísio Pitico da Silva, autor do livro “Gestão da política nacional do idoso à luz da realidade de Juiz de Fora”. Para ele, a cidade, embora apresente certa qualidade de vida, ainda não respondeu, publicamente, ao progressivo aumento de idosos. “E isso também não sensibilizou os gestores públicos a implantarem medidas mais significativas”, destaca. Pitico classifica o ato de envelhecer como um estágio de vida difícil, tanto para aquele idoso independente como para aquele que necessita de políticas públicas. “Uma coisa é fato: em boa condição financeira ou não nenhum deles está isento de sofrer preconceito, principalmente o da idade. O bom é associado ao que é novo, bonito, produtivo e útil. Ser velho é ser um fardo para outras pessoas.”
A coordenadora do Polo de Enriquecimento Cultural para a Terceira Idade da Faculdade de Serviço Social da UFJF, Sandra Arbex, pontua que falta uma mudança na forma como os idosos são vistos na sociedade .”Ainda precisamos evoluir no que tange à cultura e à mudança do comportamento perante o idoso. O fato de Juiz de Fora estar em terceiro lugar em número de idosos nos desafia a pensar que cidade deixaremos para as próximas gerações”.
Descentralizar serviços para facilitar acesso
Tanto para o gerontólogo José Anísio Pitico da Silva, como para a coordenadora do Polo de Enriquecimento Cultural da Terceira idade da Faculdade de Serviço Social da UFJF, Sandra Arbex, é necessário pensar em descentralizar os serviços públicos e atendimentos destinados à terceira idade no município. Sandra defende que, no momento em que a cidade enfrenta o envelhecimento de sua população, são necessárias medidas simples, como levar programas para terceira idade a bairros e lugares mais afastados, equipar as unidades de saúde, disponibilizar equipes multidisciplinares habilitadas para exercer a função. “É preciso aumentar os serviços e descentralizá-los, para que mais idosos possam ter acesso. Isto é um desafio coletivo, em que o Poder Público municipal, as instituições de ensino e famílias precisam tomar consciência e mudar de perspectiva e de postura. Exige o envolvimento de cada em todos os segmentos da população, independentemente da idade.”
“Durante o levantamento para meu estudo, observei que nenhum dos gestores públicos procura apresentar mudanças em suas pastas. Por isso defendo que o idoso precisa ter organização política, afinal, pelo seu quantitativo, muita coisa poderia ser mudada. Você constrói o envelhecimento a cada dia. Ignorar o idoso é ignorar a própria história e a própria identidade”, comenta Pitico.
Hoje em Juiz de Fora, conforme a Secretaria de Desenvolvimento Social, os serviços de assistência ao idoso acontecem por meio do Centro de Convivência do Idoso, no Centro. No local, passam diariamente cerca de 300 pessoas. Além disso, há parceria com o Abrigo Santa Helena, responsável por acolher estas pessoas, oferecendo assistência médica, ambulatorial, psicológica e social, além de recreação e lazer. A pasta ainda informa que os serviços assistenciais também ocorrem de forma descentralizada, em espaços localizados nos bairros Benfica, Milho Branco, Ipiranga, Nossa Senhora Aparecida, Linhares, Costa Carvalho, Grama, São Benedito, Bandeirantes, Vila Olavo Costa e Granja Betânia, utilizando espaços da comunidade.
Ainda de acordo com a secretaria, há atenção especializada de apoio, orientação e acompanhamento a idosos em situação de ameaça ou violação de direitos, que ocorre nas três unidades do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), duas delas localizadas no Centro e uma no Jóquei Clube. Neste serviço, durante o primeiro semestre deste ano, foram atendidos 565 idosos em situação de violência intrafamiliar e 133 em situação de negligência ou abandono. Não há, por enquanto, projetos voltados para a expansão destes serviços.