Perspectiva 2025: gestão de recursos e qualidade de ensino são desafios da educação
Reportagem da Tribuna conversou com professoras municipais, sindicato e com pesquisador em educação da UFJF para traçar perspectiva da educação municipal no próximo mandato
Com as adequações do novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), os recursos para a educação municipal aumentaram. Por meio da medida, a contribuição da União para a pasta da educação municipal dobrou – um aumento de 10% para 20%.
Apesar disso, conforme explica o professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Eduardo Magrone, a eficiência no enfrentamento dos desafios da educação durante o próximo ano depende da gestão destes recursos pelos titulares da Secretaria de Educação da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF).
Em entrevista exclusiva à Tribuna, a Prefeita Margarida Salomão ressaltou que o foco para a educação em 2025, ano que marca o início do quadriênio relativo ao novo mandato, já está definido. Os pilares a serem seguidos pelo município prezam principalmente pela qualidade da educação fundamental e educação infantil em Juiz de Fora. Segundo a líder do executivo, os impactos só serão perceptíveis daqui a vinte anos.
Para tecer o panorama de tópicos acerca da educação que precisam de atenção, a reportagem da Tribuna conversou com duas professoras municipais, o sindicato da categoria, e com Eduardo Magrone, professor e pesquisador da UFJF. Eles traçaram um cenário que perpassa a distribuição de recursos, desigualdade social e uma busca incansável por melhores condições de trabalho – aspectos cujo desenvolvimento ficará a cargo da Secretária de Educação, Nádia Ribas, durante os próximos anos.
Verbas para educação
As verbas do Fundeb são destinadas aos municípios, estados e ao Distrito Federal com a finalidade de manutenção e desenvolvimento da educação pública básica. O direcionamento da verba para a educação infantil e o ensino fundamental, inclusive na educação de Jovens e Adultos – EJA, cabe ao municipio, enquanto o estado fica responsável pelo ensino fundamental e médio.
A distribuição do financiamento, que agora conta com aumento, é feito com base no número de alunos, com base em dados do último Censo Escolar. Assim, ele serve tanto para a arrecadação de recursos para as instituições escolares quanto como indicador da qualidade do ensino. Um exemplo disso é o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (ldeb), as taxas de rendimento e de fluxo escolar, além da distorção idade-série.
A cidade de Juiz de Fora não atingiu o padrão esperado pelo Ideb, além de lidar com a evasão escolar. Na visão de Eduardo Magrone, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o Ideb é um indicador poderoso, uma vez que articula a proficiência na avaliação de competência dos alunos em português e matemática, ao passo que também conjuga os índices de fluxos escolares.
“Não é um indicador simpático a governos. Ele revela o quanto a educação está distanciada de padrões minimos. Entretanto, o Ideb não mostra o processo, apenas o resultado, e o processo também precisa ser estudado”, analisa Magrone. Em pergunta feita diretamente à Prefeita pela Tribuna, ela ponderou que os investimentos na melhora da qualidade da educação vêm sendo feitos, mas é um resultado que só poderá ser visto a longo prazo. “Eu acho que a gente deu um salto esse período, uma evolução que não vai ser vista de imediato, pois na educação, a gente implanta (medidas) e vai desenvolvendo. Investir em educação é sempre um ato de muita coragem, porque ela não te dá retorno instântaneo”, ponderou Margarida Salomão.
Ela também acrescentou que essa é uma das agendas fundamentais do seu governo, “porque conforme seja a infância de uma criança, você também estará profetizando como sera sua vida adulta”. A Prefeita finalizou dizendo que os resultados se darão em cerca de vinte anos, “quando eu não estarei mais aqui. Mas ela vai mudar a vida das pessoas e eu não tenho dúvida disso”, afirmou à Tribuna.
Na esteira dos indicadores sobre a qualidade escolar no município, o professor Magrone teceu outra ponderação, que ressalta o fato de não se culpabilizar ou responsabilizar os professores. Ele diz que é preciso também haver questionários contextuais que revelem as condições das escolas e da realidade dos alunos, algo que também deve ser avaliado.
“O aluno de classe média começa a se ambientar com a linguagem da escola já na família, o aluno pobre não tem essa vantagem. O esforço dos professores é sobre uma base que já não parte do mesmo nível. É complexo interpretar esses resultado e a procura por culpados”. Para ele, não se trata de buscar aumentar a pontuação do Ideb, mas de melhorar as condições sob as quais que os alunos aprendem e, por consequência, isso fará a nota do indicador aumentar.
Acessibilidade nas escolas municipais melhora a qualidade da educação
Para o professor Magrone, a escola que valoriza a inclusão de pessoas com deficiência por si só já melhora a qualidade do ensino. Essas medidas de acessibilidade englobam condições estruturais e físicas adequadas, como também a capacitação dos profissionais da escola. Mas, ele ressalta, “não é só porque uma escola tem rampas e letras escritas em braille que ela vai ter uma qualidade mais elevada. A presença desses aspectos, desses profissionais, e uma visão de escola que incorpore alunos com deficiência junto com essa arquitetura, essa ergonomia, dentro de uma visão de inclusão, de recepção e respeito a diferença ao outro. é que são efetivos para um bom resultado”, explica.
Durante a cobertura das eleições municipais, a Tribuna flagrou a dificuldade de pessoas com mobilidade reduzida para acessarem um dos locais de votação, algo que ocorreu, por exemplo, na Escola Municipal Manoel Bandeira, localizada no Bairro Nossa Senhora Aparecida, na Zona Leste da cidade. O caso chamou atenção para como durante o período regular, crianças, adolescentes ou pais e responsáveis teriam desafios quanto à falta de acessibilidade do local e a importância de estruturas físicas e sociais para os colégios serem, de fato, para todos.
Outro ponto levantado sobre as instituições do município trata do atraso para contratação dos professores de apoio e do pagamento da gratificação proporcional dos docentes que atuam com os alunos da educação especial. É o que apontou a professora de história Edylane Eiterer. “Há demora na triagem e deferimento ou indeferimento dos alunos da educação especial, e consequentemente, o atraso na contratação dos profissionais que atuam junto deles”, observa.
A professora Jessica Oliveira, que leciona em outra escola municipal, também apresentou uma realidade que, para ela, vem chamando atenção dentro de sala de aula: o grande número de alunos e o impacto disso na educação. “O maior desafio que enfrentamos atualmente seria o da ‘superlotação’ das salas. As escolas têm uma metragem a seguir, e elas cumprem o que está na lei. Isso não podemos negar. Entretanto, nos anos iniciais, acredito que sala com número reduzido de alunos ajudaria a melhorar a qualidade da educação, pois a demanda da educação pública é diversa, vai desde de questões cognitivas a socias ( como fome e violência, desleixo, precariedade sanitária entre outros)”, compartilha a docente, ao enfatizar que as aulas humanizadas também dependem da atenção dada aos alunos e da integração deles com os professores.
Educação integral
A implementação da educação integral nas escolas municipais já começou, mas é um projeto ainda em curso. Os desafios já enfrentados durante o modelo regular precisam também ser trabalhados para esse modelo. Os acenos para mais tempo do aluno no colégio, entretanto, já se apresentam como algo positivo, segundo o diagnóstico do professor Magrone.
“O ensino integral é uma maneira de fazer com que o jogo se equilibre entre as classes sociais, entre as raças aqui no Brasil. É uma maneira de fazer com que o estudante fique mais tempo na escola e fique mais tempo também aprendendo”, explica, à medida que comenta que isso implica para além do desenvolvimento acadêmico, explorando a sociabilidade, desenvolvimento do corpo e da criatividade.
“É a dimensão mais importante da democratização do ensino, o direito a aprender, e o ensino real tem a ver com isso, só que há de se fazer uma política muito equilibrada, ponderada e considerando a realidade brasileira, da juventude brasileira”, fala Magrone. Ele se refere ao cenário em que muitos jovens entram no mercado de trabalho ainda muito cedo, e repartem a rotina de sala de aula com o trabalho para ajudar com o dinheiro em casa. “O trabalho começa muito cedo na vida escolar dos alunos brasileiros. Então, a educação em tempo integral muitas vezes esbarra nesse problema, que é um problema de natureza social, social, socioeconômica e cultural”, contou o professor.
Para Margarida, a educação integral vai ajudar também a mitigar o quadro de insegurança familiar de muitas famílias, em que as crianças passam a ter a garantia de café da manhã, almoço e, por vezes, até jantar nas escolas. “Se o aluno se alimenta, diminui o estresse das famílias, é um esforço importante. As crianças que eu tenho que cuidar não são aquelas que recebem smartphone”, disse a Prefeita, que, por fim ressaltou também a importância da educação continuada também para os professores.
Sindicato aponta desafios centrais na cidade
O Sindicato dos Professores informou a reportagem quais são as principais lutas da categoria no próximo ano. De acordo com Lucia Lacerda, coordenadora geral do Sinpro-JF, o magistério se reuniu em assembleia em novembro, na data, as principais reivindicações foram elencadas.
Dentre elas estão: a valorização dos professores; a efetivação do maior número possível de aprovados em concurso público; redução da jornada de trabalho dos secretários escolares; reajuste salarial; retorno do laboratório de aprendizagem; e garantia da extensão do atendimento aos alunos com deficiência, através da mediação dos AEE’s e atenção a educação inclusiva. “O Magistério reafirmou o compromisso com essa pauta. colocando na sua campanha salarial o cumprimento da Lei 14.960/24, com a universalização do Atendimento Educacional Especializado em todas as escolas para atender a todos os alunos com deficiência ou atípicos”, apontou Lúcia.
O diretor do sindicato, Roberto Kalam, também conversou com a Tribuna, e apresentou um cenário de falta de diálogo da Secretaria de Educação de Juiz de Fora. “É necessário que o discurso da gestão municipal se aproxime da prática, que haja disposição para ouvir e respeito ao lidar com as diferenças e divergências”, explicou. “É preciso entender a dinâmica que ocorre na educação, só assim, com a sensibilidade e serenidade necessárias, a gestão da rede terá capacidade de apresentar e discutir soluções”, completou o professor.
Tópicos: educação / juiz de fora