Rio Grande do Sul tem primeira morte por leptospirose
Óbito foi confirmado no município de Travesseiro, no Vale do Taquari
Um idoso de 67 anos morreu de leptospirose no município de Travesseiro, no Vale do Taquari, no Rio Grande do Sul, uma das cidades atingidas pelas enchentes que assolam o Estado gaúcho. Ele começou a apresentar sintomas no dia 9 de maio, mas o óbito aconteceu em 17 de maio, segundo informou a Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul na tarde de segunda-feira (20). É a primeira morte confirmada em decorrência da doença desde que o Estado vive a pior catástrofe climática da sua história.
“A confirmação se deu após o resultado positivo na amostra analisada pelo Laboratório Central do Estado (Lacen), em Porto Alegre”, disse a pasta. As enchentes são reconhecidas como ambientes propícios para a disseminação da doença, elevando o risco para aqueles expostos às águas.
Vale ressaltar que a leptospirose é uma doença infecciosa geralmente adquirida por meio da água contaminada por urina de animais infectados, principalmente ratos. Além disso, uma de suas principais características é que o surgimento dos primeiros sintomas pode variar muito de pessoa para pessoa, podendo acontecer de dois até 30 dias após a infecção, de acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Justamente por isso, pessoas que tiveram contato com águas possivelmente contaminadas, como de enchentes, precisam ficar atentas durante todo esse período.
A secretaria estadual, por meio do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs), vem fazendo o monitoramento de casos suspeitos a partir das notificações realizadas pelos municípios. Nas últimas semanas, de acordo com a pasta, foram identificadas 304 ocorrências não confirmadas de leptospirose e 19 casos confirmados. “Antes do período de calamidade enfrentado pelo Rio Grande do Sul, com dados até 19 de abril, o Estado já havia registrado, em 2024, 129 casos e seis óbitos. Em 2023, foram 477 casos e 25 óbitos”, afirmou a SES.
Leptospirose
A leptospirose é uma doença infecciosa febril aguda e transmitida a partir da exposição direta ou indireta à urina de animais (principalmente ratos) infectados, que pode estar presente na água ou na lama de locais com enchentes. “O contágio ocorre através do contato da pele com a água contaminada ou por meio de mucosas”, reforça a Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul.
Episódios como alagamentos aumentam a chance de infecção pela doença. “Esse é o primeiro caso de óbito confirmado no Rio Grande do Sul, após as enchentes registradas desde o fim de abril. Contudo, não é o primeiro do ano no Estado, visto que a leptospirose é uma doença considerada endêmica, ou seja, com circulação sistemática no ambiente”, alerta a secretaria estadual.
Diante da notificação, a secretaria alerta para a importância de a população procurar um serviço de saúde caso observe os seguintes sintomas:
- Febre;
- Dor de cabeça;
- Fraqueza;
- Dores no corpo (em especial, na panturrilha);
- Calafrios.
Além disso, o Ministério da saúde destaca que podem ocorrer diarreia, vermelhidão ou hemorragia conjuntival (na região dos olhos), fotofobia, dor ocular, tosse, manchas vermelhas na pele, aumento do fígado e/ou baço e aumento de linfonodos (gânglios presentes principalmente no pescoço, axilas e virilhas).
De acordo com a Fiocruz, apesar de os sintomas terem potencial de manifestação de dois a 30 dias após a infecção, na maior parte dos casos os infectados começam a apresentar os primeiros sinais da doença de sete a 14 dias depois da contaminação. Ao identificar os primeiros sintomas, a orientação é procurar um serviço de saúde imediatamente e relatar se houve contato com alagamentos.
“Considerando o atual cenário de chuvas e cheias em várias regiões do Estado, casos suspeitos oriundos de áreas de alagamento e com sintomas compatíveis com leptospirose devem iniciar tratamento medicamentoso imediato. Quando possível, deve ser coletada amostra a partir do sétimo dia do início dos sintomas para envio ao Lacen”, orientou a secretaria.
Automedicação não é indicada
Segundo a pasta, o tratamento com o uso de antibióticos deve ser iniciado no momento da suspeita e com orientação de um profissional de saúde. “Para os casos leves, o atendimento é ambulatorial, mas, nos casos graves, a hospitalização deve ser imediata, buscando evitar complicações e diminuir a letalidade”, afirmou ainda.
Orientações a serem seguidas:
- Nos locais que tenham sido invadidos por água da chuva, recomenda-se fazer a desinfecção do ambiente com água sanitária (hipoclorito de sódio a 2,5%), na proporção de um copo de água sanitária para um balde de 20 litros de água;
- Mantenha os alimentos guardados em recipientes bem fechados;
- Mantenha a cozinha limpa e sem restos de alimentos e retirar as sobras de alimentos ou ração de animais domésticos antes do anoitecer;
- Mantenha o terreno limpo e evitar entulhos e acúmulo de objetos nos quintais ajudam a evitar a presença de roedores;
- A luz solar também ajuda a matar a bactéria;
- Evitar o contato com água ou lama de enchentes e impedir que crianças nadem ou brinquem nessas águas. Se não for possível, é indicado o uso de botas e luvas de borracha (ou sacos plásticos duplos amarrados nas mãos e nos pés);
- Para o controle dos roedores, também recomenda-se a desinfecção e vedação de caixas d’água, vedação de frestas e aberturas em portas e paredes, etc. O uso de raticidas (desratização) deve ser feito somente por técnicos devidamente capacitados.
Tive contato com água possivelmente contaminada: o que fazer?
De acordo com o infectologista e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Renato Grinbaum, a primeira coisa a se fazer após o contato com a água possivelmente contaminada é lavar o corpo prontamente para reduzir o tempo de exposição e minimizar o risco de infecção.
Além disso, recentemente, a SBI, a Sociedade Gaúcha de Infectologia e a Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul divulgaram nota técnica orientando sobre a melhor forma de realizar a profilaxia (medidas utilizada na prevenção ou atenuação de doenças) para prevenir a doença em casos onde há exposição contínua e inevitável com água de enchentes, como tem acontecido no Rio Grande do Sul.
Embora o uso de antimicrobianos não seja recomendado como conduta de rotina, sendo administrado apenas quando há o diagnóstico da doença, a nota ressalta que em situações de alto risco, onde há muita exposição a alagamentos e águas possivelmente contaminadas, essa intervenção pode ser considerada com o objetivo de minimizar os riscos, desde que seja realizada sob orientação médica.
A principal recomendação das entidades responsáveis pelo documento é o uso de doxiciclina, administrada em dose única para adultos em pós-exposição de alto risco. Para crianças, a dose é calculada com base no peso corporal, com dose máxima estabelecida. Como alternativa, a azitromicina pode ser utilizada nas mesmas condições.
Considerando esses pontos, as recomendações para identificar pessoas em situação de alto risco e elegíveis para o uso de medicamentos de emergência são as seguintes:
Equipes de socorristas de resgate e voluntários com exposição prolongada à água de enchente, quando equipamentos de proteção individual não são capazes de prevenir a exposição;
Pessoas expostas à água de enchente por período prolongado com avaliação médica criteriosa do risco dessa exposição.
É importante frisar que a profilaxia deve ser feita apenas com orientação médica. Além disso, ela não oferece uma proteção absoluta contra a leptospirose, e mesmo aqueles que fazem uso dos medicamentos recomendados ainda podem contrair a doença. Além disso, gestantes e lactantes não devem utilizar doxiciclina como medida preventiva.