Produção de peixe emite 10 vezes menos gases de efeito estufa que pecuária, aponta estudo da UFJF
Apesar do consumo da proteína ainda ser baixo no país, atividade possui alto potencial econômico e ambiental

Um estudo desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) mostrou que a aquicultura, atividade destinada ao cultivo de peixes, apresenta baixa pegada de carbono. A pesquisa constatou que as emissões de gases de efeito estufa (GEE) por quilo de alimento são muito inferiores às emitidas pela produção de outras fontes de proteína, como o gado e a soja. Para se ter uma ideia, a aquicultura emite dez vezes menos GEE que a pecuária. Além disso, os pesquisadores também observaram um alto poder restaurativo da atividade em áreas já degradadas.
Os artigos foram publicados em janeiro e fevereiro em duas das principais revistas ligadas à área, Nature Sustainability e na Resources, Conservation and Recycling. Apesar do baixo consumo de peixes no país, a pesquisa destaca o alto potencial econômico e ambiental da produção dessa proteína. Dados de 2014 e 2023 revelam que, em nove anos, o número de produção e consumo per capita de peixes cresceu em 308 mil toneladas e 1,35 kg, respectivamente. De acordo com o pesquisador do departamento de Biologia da UFJF, Nathan Barros, um dos autores do estudo, a aquicultura é uma solução com muitas vantagens para geração de renda com baixa pegada de carbono.

“Um dos destaques é como atividade necessita de um espaço muito menor para produzir a mesma quantidade de alimento (de 20 a 100 vezes menos terra por tonelada de proteína animal produzida em relação à pecuária), além de ser uma cultura regenerativa. Outro ponto fundamental é que a aquicultura utiliza terras já degradadas, poucas criações são feitas em áreas de floresta, ao contrário do gado e da soja. Desta forma, a aquicultura viabiliza a utilização de áreas consideradas improdutivas. O fato demonstra o potencial sustentável e restaurativo da atividade”, esclarece.
Alternativas de menor impacto ambiental
Além de expor os benefícios da prática, o trabalho também aponta alternativas para tornar o impacto ambiental de todo o processo ainda mais baixo. Atualmente, a aquicultura é responsável por 0,49% das emissões antropogênicas globais de gases de efeito estufa e o foco da pesquisa é apontar caminhos para torná-la ainda mais sustentável. Uma dessas iniciativas seria o investimento em disseminar o uso do Sistema de Aquicultura Recirculante (RAS), como uma alternativa para aliar produtividade e sustentabilidade.
No sistema RAS, o biofiltro (sistemas de tratamento de água) é responsável por quase todas (98%) as emissões diretas, sendo a infraestrutura a principal causadora das emissões totais. Dessa forma, ações como o manejo correto do sistema do biofiltro, colocadas pelos pesquisadores, podem diminuir o impacto ambiental e promover meios de subsistência equitativos. “Utilizando um manejo adequado é possível tornar a aquicultura uma produção de Carbono Zero”, afirma Barros.
Estudo foca no impacto da aquicultura na Amazônia
O estudo chama atenção para o fato de que a carne bovina e os peixes nativos são os alimentos de origem animal predominantes na Amazônia, que contribuem para problemas no bioma. A produção de gado impacta significativamente no meio ambiente, com desmatamento em larga escala e altas emissões de carbono, já a sobrepesca – extração superior a capacidade de reposição dos rios – leva à perda da biodiversidade aquática. Diante deste cenário, a aquicultura na Amazônia se apresenta como um alternativa com grande potencial de atender a crescente demanda por alimentos que respeitam a biodiversidade e a herança cultural da região, além de oferecer oportunidades econômicas em uma região que enfrenta a perda de biodiversidade.
Além de gerar renda para a população local, a aquicultura também colabora para a reintrodução de espécies, servindo como um berçário de espécies nativas. O trabalho também foca na segurança alimentar e no desenvolvimento econômico da Amazônia proporcionado pela atividade, como destacado pelo líder do estudo, Felipe Pacheco, da Universidade de Cornell (EUA). “Sendo bem planejada, a aquicultura pode ser uma aliada na conservação da Amazônia, oferecendo uma alternativa sustentável para a produção, sem comprometer a biodiversidade e também sem comprometer o serviço de ecossistemas que a região pode oferecer para sua população”, disse Pacheco.
Uma outra pesquisa, dentro deste grande projeto, analisou, especificamente, a criação de um dos principais peixes produzidos no Brasil, a tilápia do Nilo, no sistema RAS, ainda pouco utilizado no país. O método funciona com o reuso de água por meio da recirculação, removendo resíduos com tratamentos mecânicos e biológicos, permitindo a reciclagem de nutrientes, a redução do uso de água e de área, uma menor fuga de espécies exóticas e melhor controle ambiental e produtivo, em comparação aos sistemas convencionais.
Para o pesquisador, um dos principais desafios da contemporaneidade é desenvolver com sustentabilidade. “Nosso objetivo é que a aquicultura prospere de forma sustentável, duradoura e resiliente, principalmente na Amazônia, bioma mais biodiverso do mundo”. Conforme a pesquisa, algumas demandas são fundamentais para que a aquicultura se consolide como grande mercado de produção de alimentos no país, como: investir em estruturas regulatórias fortes, planejamento do uso da terra, gestão cuidadosa e mudança cultural para aumentar o consumo de peixes no Brasil.
Tópicos: amazônia / aquicultura / economia / meio ambiente / peixes / ufjf