Nova espécie de bromélia-peluda é descoberta em Minas
Planta com folhas aveludadas e coberta por pelos foi encontrada nas montanhas do Vale do Rio Doce e corre risco de extinção
Em novembro do ano passado, um morador do município de Alvarenga, interior de Minas Gerais, encontrou, enquanto andava por uma região com muitas cachoeiras, uma nova espécie de bromélia-peluda. Em meio às montanhas do Vale do Rio Doce, as plantas de folhas aveludadas e cobertas por pelos com uma pequena flor de cor rosa chamaram a atenção do cidadão cientista, que enviou fotos para pesquisadores que realizam estudos na região. A espécie recebeu o nome de Krenakanthus ribeiranus e foi publicada em artigo no início do mês na revista “Phytotaxa”.
A parceria entre cientistas e cidadãos a favor da pesquisa científica é chamada de ciência cidadã e pode ser feita de diversas formas, como, por exemplo, durante coleta, interpretação e análise de dados, elaboração conjunta de projetos para responder questões científicas e identificação de novos elementos, como foi o caso de Júlio César Ribeiro. “Além de ser uma planta que eu nunca tinha visto na região, as folhas peludas, como as do capim, chamaram a minha atenção, e também as flores saindo no meio das folhas”, contou o morador à Agência Bori.
O estudo reuniu pesquisadores brasileiros do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) e das universidades federais de São João del-Rei (UFSJ), do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Rio de Janeiro (UFRJ). O professor da UFSJ Paulo Gonella destacou a contribuição de Júlio desde o momento em que ele se questionou a respeito de qual espécie era aquela até a coleta de dados que foi essencial para os pesquisadores confirmarem que se tratava de uma espécie nova, que está ameaçada de extinção. Dessa maneira, o nome dado à planta, “ribeiranus”, foi uma homenagem ao mineiro. “A homenagem é um reconhecimento ao olhar apurado do Júlio, que já contribuiu na descoberta de outras espécies da região, atuando como cidadão cientista.”
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A nova espécie se distancia das bromélias mais comuns pelo fato de as folhas serem cobertas por pelos (tricomas) brancos, uma característica rara. “Quando se fala em bromélias, a imagem mais comum que vem à mente é de plantas com folhas brilhantes que acumulam água ou de plantas espinhentas como o abacaxi. É difícil imaginar uma bromélia com folhas aveludadas e cheia de pelos e isso é só um dos motivos que tornam essa descoberta tão empolgante”, explica Dayvid Couto, pesquisador do INMA. O especialista comenta que, no momento em que as fotos de Júlio chegaram até os pesquisadores, eles acharam que poderiam ser várias outras espécies, menos uma bromélia.
Esses pelos da bromélia-peluda podem absorver água ou proteger contra a perda de água para o ambiente. “Antes da descoberta dessa nova espécie, apenas uma outra espécie, que não é peluda, era conhecida do gênero Krenakanthus, cujo nome significa ‘flor dos Krenak’, uma homenagem ao povo originário dessa região, no Vale do Rio Doce”, lembra Gonella. Mas essa não foi a única descoberta na região das serras do Leste de Minas Gerais. Nos últimos dez anos, mais de 30 novas espécies de planta foram descobertas na região, o que a torna uma das últimas fronteiras do conhecimento botânico no Sudeste do Brasil.
“Além de abrigarem uma biodiversidade única, essas serras funcionam como ‘caixas d’água’, protegendo nascentes que abastecem os municípios da região e que foram fundamentais para assegurar água de qualidade para muitas cidades quando o Rio Doce foi afetado pelo desastre de Mariana”, comenta o professor da UFSJ.
Espécie está ameaçada de extinção
Embora tenha sido categorizada há pouco tempo, os pesquisadores já constataram que a Krenakanthus ribeiranus corre o risco de ser extinta. “Com base na distribuição muito restrita e no avançado grau de degradação da região onde foi encontrada, nós avaliamos essa espécie como criticamente em perigo de extinção, o grau mais alto de risco”, afirma Eduardo Fernandez, coordenador de Projeto Núcleo de Avaliação do Estado de Conservação da Flora, do Centro Nacional de Conservação da Flora (CNCFlora), órgão do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) responsável pela elaboração da Lista Vermelha Nacional.
Ao longo das pesquisas, foi possível identificar ameaças à espécie e ao seu habitat, como o desmatamento para abertura de pastagens, o aumento na frequência e na intensidade de incêndios descontrolados e a expansão das lavouras de café. Por isso, Fernandez ressalta que medidas urgentes precisam ser tomadas para a conservação dessa espécie, “como um estudo para a criação de uma unidade de conservação e a inclusão da espécie em políticas de conservação que vêm sendo elaboradas para a região. Essas medidas, combinadas a outras estratégias de conservação, podem nos ajudar a assegurar um futuro próspero para a bromélia-peluda”.