Fala Quem Sabe
O povo e a esperada renovação política
Como é que a Cidade Maravilhosa não percebeu a tempo as tenebrosas transações que a transformaram num cenário de horror? A maioria de sua elite política e econômica, se não está agora na cadeia, está ameaçada de prisão. A vida desandou num dos estados mais importantes da federação. Mas não é uma pergunta justa. Ela se aplica ao Brasil como um todo, e o Rio é um emblema transparente de um país embrulhado numa crise gigantesca. Todo o sistema de representação – majoritário e contra majoritário – previsto na Constituição vive em crise e enovelado por conflitos e jogos que apenas reiteram uma situação de impasse e de afastamento da sociedade.
A imprensa, fundamental numa democracia, deixou-se envolver pela busca obsessiva da mãe de todos os escândalos, adotando quase sempre uma postura arbitrária e autoritária. As redes sociais, a grande novidade deste século, se encheram de ódio e burrice, reclamando a capacidade de fuzilar instantaneamente reputações e pessoas.
Neste teatro meio enlouquecido e conturbado, um ator crucial joga parado: o povo, a multidão, na sua multiplicidade e variedade. Ele está assuntando e esperando. Mas esperando o que? Que se faça justiça, sem dúvida. Que este nó entre o sistema político e um capitalismo dependente do Estado seja rompido. Mas está à espera, sobretudo, de que a própria dimensão da política se renove na prática e na imaginação, livrando-o da necessidade de uma escolha entre o muito ruim e o pior no próximo ano. Porque ela, a multidão, vai ter que escolher.
(Rubem Barboza Filho é professor, cientista político e leitor convidado)
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