Está Aberta a Temporada das Cesáreas de Natal
O Brasil é o segundo país do mundo com maior proporção de cesáreas — 55,6% em 2016 —, ficando atrás apenas da República Dominicana. Considerando apenas o setor privado de saúde, em 2014, a proporção de cesarianas chegou 85,6% dos partos. Em 2018, apesar de ter havido uma ligeira queda da taxa, as cirurgias ainda representaram 83% do total de partos no setor.
Além disso, dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) — vinculada ao Ministério da Saúde do Brasil, que regula o mercado de planos privados de saúde — mostram que a quantidade de cesarianas costuma diminuir no período entre Natal e Ano Novo, evidenciando a opção pelo agendamento do parto como forma de evitar o nascimento durante o período festivo. Na semana de 24 a 31 de dezembro de 2018, foram registradas, em média, 1,5 mil cesáreas a menos do que a média semanal do ano. Em 2017, foram cerca de 680 procedimentos desse tipo a menos que a média do ano. E, em 2016, o setor de planos de saúde registrou naquela semana, em média, 2,8 mil cesarianas a menos que a média semanal do ano.
Tão certa quanto a chegada do Papai Noel nos shoppings é a lotação das maternidades durante as próximas semanas. E a partir de agora, um sem número de diagnósticos catastróficos começam a ser feitos nos consultórios de todo o Brasil, pode reparar. Bebês até então com o percentil normal começam a ficar “grandes demais”, sendo impossível que nasçam de parto normal, bora marcar uma cesárea ur-gen-te para trazer essa criança ao mundo? Que tal sexta às 18h, no final do expediente? (Mas hoje ainda é quarta, não era urgente?!)
Também começam a surgir crianças enroladas em cordões umbilicais que, parece, têm vida própria e ficam agitados nessa época do ano. Será que decidem se transformar em laços bem grandes como os dos pacotes de presente de propósito, pura inveja, ameaçando enforcar os bebês que se atreverem a nascer como Jesus, filho de Maria e José? Para essas crianças travessas que se mexeram demais e se enlaçaram todas nos úteros de suas mães, cesáreas de emergência, marcadas para dali a dois três dias. (Mas não era uma emergência?)
As mamães também não colaboram, que genética ruim é essa a das novas gerações? Mesmo depois de engordar mais de uma dezena de quilos durante nove meses e de não entrar em nenhuma calça do planeta (porque o quadril triplicou de tamanho), a mulher brasileira não tem “passagem” para dar à luz seus filhos, são “estreitas demais”. Nós, brasileiras abençoadas por Deus e cadeirudas por natureza, seríamos geneticamente incapazes de colocar nossos filhos no mundo? Enquanto fazemos essa pergunta, assistimos do sofá, resignadas e com uma cicatriz na barriga, à magrela Kate Middleton parir como uma rainha três principezinhos pesando mais de 3 quilos cada um. Kate saiu linda e loira do hospital dias depois – a genética desses britânicos deve ser uma coisa de louco mesmo.
Brincadeiras à parte e ironia a postos, atenção: Um país que ostenta o título de campeão mundial de cesáreas tem algum problema, não é possível. Se nos é tirado o direito de parir, que a gente não abra mão do direito de pensar: se a cesariana é tão boa por que o Brasil ainda tem índices assustadores de morte materna e neonatal? Por que as UTI´s estão sempre cheias de recém-nascidos que tiveram problemas para respirar em seus primeiros instantes de vida? (Atenção, spoiler: porque ainda não estavam prontos para nascer e foram retirados da barriga de suas mães uma, duas e até três semanas antes do tempo, obrigada, de nada.)
Por conta disso, a Agencia Nacional de Saúde Suplementar (ANS), juntamente com o programa Parto Adequado, estão engajados em uma campanha de mobilização para sensibilizar, especialmente gestantes e profissionais de saúde, sobre os riscos da realização de cesáreas desnecessárias. A iniciativa foca na disseminação de informações sobre a importância do parto normal e do respeito às fases da gestação — dando seguimento às ações iniciadas em 2015 para reduzir as alarmantes taxas de cesarianas no país e melhorar a experiência da maternidade para mães e bebês.
E como o Natal é uma época de desejar coisas boas ao mundo, a você, gestante, eu faço votos que abra o olho. Papai Noel não existe e um monte das mentiras cabeludas que nos contam também. E às mulheres que devem entrar em trabalho de parto neste final de ano eu desejo vaga nas maternidades. Elas estarão lotadas com aqueles bebês que estavam precisando de um tempinho extra na barriga, mas que foram retirados de lá em nome de qualquer coisa, menos da saúde e do bem estar deles e de suas mães.
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Fontes: Revista Crescer
Rita Lisauskas