Tribuna rememora histórias dos 35 anos do Estádio Mário Helênio
Com três décadas e meia de histórias, equipamento municipal atualmente não é utilizado; apesar dos poucos jogos, local faz parte da memória afetiva da cidade
O Estádio Municipal Radialista Mário Helênio completa, nesta segunda-feira (30), 35 anos da sua inauguração. No dia 30 de outubro de 1988, milhares de torcedores compareceram às arquibancadas para acompanhar as partidas inaugurais: primeiro entre Tupi e Sport, vencida pelo Sport por 2 a 0, e em seguida, Flamengo e Argentinos Juniors, com vitória rubro-negra por 2 a 1. Desde então, o local foi palco de partidas entre grandes clubes brasileiros e para jogadores históricos do futebol nacional, como Zico, Bebeto e Romário, além de marcar a vida de juiz-foranos que frequentam o espaço. Neste domingo, a Tribuna relembra histórias dos bastidores da construção do local e traz histórias que marcaram a vida de torcedores.
A construção de um estádio em Juiz de Fora sempre foi um desejo da população, conforme relembrou Tarcísio Delgado, em entrevista concedida à Tribuna em 2018 para a série sobre os 30 anos do Municipal. Antes da aprovação do projeto das obras do Municipal, houve outras três tentativas frustradas. A primeira aconteceu entre as décadas de 1960 e 1970, durante o mandato de Itamar Franco. A ideia era de que o estádio seria no Jóquei Clube, próximo ao Parque de Exposições. A segunda, no Governo Mello Reis, previa sua construção no Borboleta. A terceira, já com Tarcísio Delgado, avaliava o Centro Olímpico da UFJF.
A quarta e acertada tentativa aconteceu no Bairro Aeroporto, ainda com Tarcísio Delgado. De acordo com o prefeito à época, a escolha do espaço não foi ao acaso. “O Sindicato dos Bancários pediu para olharmos uma água que estava minando na sede deles. Com o secretário de Obras, o José Maurício, fomos ver o local e na volta resolvi voltar por outro caminho. Quando chegamos onde hoje é a cabine de rádio do estádio, pedi para parar o carro. Ali tinha um lago enorme, era uma fazenda que tinha loteado e já havia algumas casas. Perguntei ao José Maurício: ‘Vê se adivinha o que estou vendo aqui’, ele deu na pinta: ‘o estádio’. Daí tomamos as providências para construir”, relatou Tarcísio.
‘Minha segunda casa’
A partir da inauguração, o Estádio Municipal passou a ser o principal palco esportivo de Juiz de Fora e a integrar a vida dos torcedores apaixonados por futebol da cidade. Um deles é Leonardo Costa, editor de vídeo da Tribuna e frequentador assíduo do Mário Helênio. Durante sua infância, Leonardo acompanhou as obras no local, e esteve presente na inauguração. Costa relata como foi observar todo o processo, desde o início da construção até os grandes jogos. “Desde que começaram (as obras), já se criou uma identificação muito grande. Eu vi o feto, vi ele nascendo, vi ele crescendo. E até aquela preparação toda pra hora que anunciou que, na inauguração, seria o Flamengo que ia jogar no estádio. Era o meu time de infância, juntamente com Tupi, e seriam os dois times que eu ia assistir. E o Flamengo, eu nunca tinha ido no Maracanã, então a primeira vez que eu vi o Flamengo jogar foi aqui”, relembra.
Os jogos de inauguração do estádio marcaram a vida do jovem torcedor. À época com 11 anos, ele pôde ver de perto grandes ídolos, como Leonardo, Bebeto e Zinho. Além disso, aquelas partidas são parte de sua relação com o pai. Costa conta que como sempre gostou e fotografia, ganhou do pai uma câmera para acompanhar os jogos. Anos depois, a câmera passou a ser seu principal instrumento de trabalho. “No primeiro jogo, meu pai foi comprar uma câmerazinha descartável para eu levar e fazer as fotos. Meu pai tinha a máquina profissional, mas não levou, eu fui com a minha câmerazinha e tirei fotos. Eu nem pensava em ser fotógrafo, mas adorava fotografia”, conta.
A partir desse episódio, Leonardo se tornou figura presente nas arquibancadas do Municipal. “Eu vivi todo o processo do estádio, todos os jogos do Flamengo lá eu fui. Dos jogos da série B, eu estava em 98% das vezes no campo trabalhando e o restante eu estava na arquibancada. Então, todos os jogos aqui, de 2008 pra cá, eu estava presente. Sempre foi a minha segunda casa.”
Além da memória afetiva, Leonardo ressalta que os principais momentos de sua carreira profissional também aconteceram no Mário Helênio. “As minhas melhores conquistas, as fotos que eu mais gosto, os momentos mais emocionantes, que eu tive na minha carreira foram ali dentro do estádio. Principalmente o título do Tupi contra o Santa Cruz (Série D de 2011), e o primeiro jogo do acesso para a Série B (contra o Asa, em 2015), que o time fez 2 a 0, são os momentos mais inesquecíveis para mim como profissional, junto com o dia que eu fotografei o Zico no jogo de homenagem dos 25 anos do último jogo dele pelo Flamengo”, conta.
‘Fiquei deslumbrado’
O Estádio Municipal também faz parte da história de Léo Lima, professor de educação física e torcedor fanático do Tupi. Léo, assim como seu xará, também esteve presente na inauguração do Mário Helênio. “Eu tive prazer e a honra de estar presente. Em 1988 eu tinha 12 anos de idade e era louco com futebol. A grande emoção, primeiro, foi estar lá dentro, espremido, porque o estádio estava lotado. Eu fiquei apertado na arquibancada, mas estava deslumbrado. A gente parava de assistir ao jogo para ficar vendo só a arquibancada, aquela multidão”, recorda Lima, que já teve a oportunidade de jogar no gramado do Mário Helênio. “Felizmente, eu também tive esse prazer de realizar o sonho de ter jogar lá. Primeiro, como adolescente, e depois já adulto.”
Como torcedor, Léo acompanhou gloriosos momentos do Tupi no Estádio Municipal, como o título da Série D de 2011, ou o acesso à Série B em 2015. Mas, para ele, o momento mais marcante aconteceu em 2006, e ficou conhecido como “milagre carijó”. “O que mais me marcou nem foi um título. Foi um acesso do Módulo II para o Módulo I do Campeonato Mineiro em 2006. No hexagonal final, o Tupi precisava vencer e torcer por uma combinação de resultados em mais dois jogos, que aconteceram. Aquele acesso foi apelidado de milagre carijó, e esse é um daqueles momentos que não sai da memória. O Estádio Municipal vai ficar na minha vida para sempre”, relata.
Léo também esteve presente no Municipal em momentos negativos para o futebol juiz-forano. Atualmente, a cidade não conta com nenhum clube nas principais divisões estaduais e nacionais, fazendo com que o calendário das equipes seja mais curto. “É muito frustrante ver esses jogos reduzidos que o Tupi tem hoje em dia. São poucos jogos na cidade, lá no estádio. Isso é frustrante, porque a alegria do torcedor é ver o time em campo, independente da divisão, mas o Tupi já teve anos em que era um ano inteiro de futebol, calendário cheio. Então é uma tristeza muito grande como torcedor”, lamenta.
Iluminação definitiva
Além de momentos históricos que aconteceram dentro das quatro linhas, um capítulo importante da história do Estádio Municipal foi a instalação dos refletores para iluminação definitiva, o que permitiu que partidas a noite acontecessem no Mário Helênio. Um dos responsáveis pela obra é João Batista de Oliveira, engenheiro eletricista e de segurança do trabalho. Para João, ter a oportunidade de trabalhar em parte da construção do estádio foi uma honra. “Eu me senti muito gratificado ao ser convidado pelo Tarcísio Delgado, para conduzir esse trabalho. Fiquei muito satisfeito, fizemos tudo com muito carinho, com muito zelo, apesar das dificuldades da época. Havia uma dificuldade financeira, mas superamos isso tudo. Eu me senti muito bem na elaboração desses trabalhos”, relata.
A inauguração da iluminação aconteceu no dia 30 de novembro de 1997, na partida entre Tupi e Sampaio Corrêa, válida pela quinta rodada do quadrangular final da Série C. Em caso de vitória do Galo Carijó, a equipe iria para a última rodada com grandes chances de conseguir o acesso à segunda divisão, mas foi derrotada por 1 a 0. João Batista recorda que chovia muito no dia, e aquilo foi um grande teste para a iluminação, que não foi afetada pela tempestade. “No dia da inauguração da iluminação, aconteceu o maior teste, porque chovia muito. Caíram muitos raios, e a iluminação não falhou uma única vez, isso pra mim foi muito gratificante. Eu gostei e fiquei muito emocionado de acontecer aquilo tudo e a iluminação funcionar com aquela plateia imensa de torcedores.”
Homenagem a Mário Helênio
O juiz-forano Mário Helênio de Lery Santos foi um dos grandes nomes do jornalismo esportivo do Brasil, e ficou marcado em Juiz de Fora por apresentar, durante 39 anos, o programa “No giro da bola”, na Rádio Solar. Márcio Guerra, secretário de Comunicação da PJF, e um dos autores da biografia “Mário Helênio: a história do cronista esportivo mais jovem do brasil”, lançada em 2014, conta que Mário, por causa de seu brilhante trabalho, contribuiu de forma significativa para o esporte local. “O Mário foi um nome tão importante que abria portas para os clubes, para os dirigentes da cidade, em todas as esferas das federações, confederações. Foi também um profissional diferenciado no estímulo a todas as modalidades do esporte da cidade. Ele fazia questão de divulgar tudo, bocha, malha, tudo isso ia para o seu programa com muita vibração”, conta.
Mário Helênio faleceu aos 70 anos, no natal de 1995. Para homenageá-lo, o colunista social da Tribuna de Minas, Cesar Romero, iniciou uma campanha para que o estádio, até então nomeado Estádio Regional, passasse a se chamar Estádio Municipal Radialista Mário Helênio. A proposta foi levada à Câmara Municipal por Gilberto Vaz de Melo e, no dia 2 de fevereiro de 1996, a lei foi sancionada, rebatizando o maior palco esportivo de Juiz de Fora.
*Vinícius Soares, estagiário sob a supervisão da editora Carolina Leonel