Celulares no Lajinha

Por Wendell Guiducci

Há um drama em andamento no Parque da Lajinha. Com a iminente chegada da primavera, cresce o número de visitantes e, com eles, aumenta também a demanda pelos simpáticos pedalinhos. Usuários típicos, crianças e casais apaixonados têm disputado lugar na fila com pessoas em busca de uma boa foto, geralmente tirada no modo “selfie”. Elas pedalam um pouquinho, encontram um local onde a luz as favoreça e gastam ali uns 15 minutos se autofotografando. Ocorre que, não raro, esses entusiastas da câmera frontal se atrapalham e deixam cair o celular, com sete ou oito prestações a pagar, no lago. A frequência da trapalhada tem desagradado sobremaneira os habitantes aquáticos.
A Associação dos Peixes, Anfíbios e Moluscos do Parque da Lajinha (Apampa) encaminhou um protesto formal à Prefeitura de Juiz de Fora na última semana. Segundo o presidente da entidade, um veterano bagre de longos bigodes, “é um problema flagrante de poluição hídrica”. “É um absurdo o que estamos vivendo. Esses apatetados, com o perdão da palavra, não têm consideração alguma pela vida lacustre. Será que desconhecem o número de elementos tóxicos contidos em uma bateria de celular? É lítio, níquel, cádmio, chumbo, mercúrio…”, desabafa o bagre. Em uma breve, aliás brevíssima nota, a Secretaria de Sustentabilidade em Meio Ambiente e Atividades Urbanas (Sesmaur) informou que está “ciente do problema e buscará uma solução em diálogo com os entes envolvidos”.
A prefeita, que se notabiliza por não ser mulher de mandar nota, se manifestou antes, furando a assessoria de imprensa. Em vídeo compartilhado em suas redes sociais, a chefe do Executivo municipal, ela mesma uma entusiasta da câmera frontal, disse que já mandou criar “com urgência” uma mesa de mediação de conflitos para cuidar da questão. “Minhas amigas, meus amigos, eu tomei ciência agora cedinho, enquanto eu saía para visitar as obras de macrodrenagem do nosso município, do problema envolvendo os peixes do Parque da Lajinha. A gente entende que o progresso tecnológico é inevitável, mas é preciso que haja harmonia com o meio ambiente, que o uso dos novos artefatos de comunicação seja sustentável e não atrapalhe a vida dos nossos irmãos peixes, nossos irmãos sapos, nossos irmãos caramujos. Vocês podem ter certeza que nós vamos solucionar isso, e rápido”, afirmou a prefeita, a caminho do Bairro Industrial ou da Rua Cesário Alvim, diretamente do banco do carona.
O bagre que preside a Apampa diz crer na boa vontade do Município, mas exige celeridade na resolução da querela. “Porque não é apenas uma questão de poluição química do nosso ecossistema, por si só algo muito grave”, alerta. “Tem também o problema da perturbação do sossego. Hoje em dia esses smartphones são à prova d’água, e muitos deles têm a bateria muito resistente, então fica aquele trem lá no fundo da lagoa, piscando, vibrando e emitindo sons. E tem uns toques que são realmente pavorosos, umas músicas tétricas que assustam nossos filhotes, assustam nossos idosos, perturbam o nosso sono… já teve fêmea aqui que teve desova prematura, tamanho o susto.” O bagre confirmou participação na mesa de mediação de conflitos, mas aguarda informações mais aprofundadas sobre como se darão os encontros. Não se sabe ainda, por exemplo, se o grupo trabalhará em ambiente terrestre ou aquático.

Wendell Guiducci

Wendell Guiducci

Wendell Guiducci é jornalista formado pela UFJF. Foi repórter e editor da Tribuna entre os anos 2000 e 2024. Hoje assina, como colaborador, a coluna de crônicas "Cronimétricas". É autor dos livros de minificções "Curto & osso" e "Suíte cemitério", e cantor da banda de rock Martiataka. Instagram: @delguiducci

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