Palanques ativos
Prisão de suspeitos de articularem atentados contra autoridades, em vez de ser um mero trabalho policial, tornou-se uma desnecessária discussão política
A polarização nas urnas de outubro dificilmente vai ser vista como um rio que passou ante tantas questões que permeiam o noticiário. A cada dia, uma novidade. A mais recente discussão envolve a ação da Polícia Federal que desmobilizou uma eventual série de atentados contra autoridades, entre elas o senador Sérgio Moro. Ele seria alvo por ações quando juiz na Justiça Federal de Curitiba e também quando ministro da Justiça.
O que seria uma ação policial a ser comemorada acabou virando um debate político – deveras insosso por ser repetitivo. Os mineiros senador Cleitinho Azevedo e o deputado Nikolas Ferreira ousaram nos adjetivos. O senador destacou que o presidente da República, ao não se solidarizar com o ex-ministro, teve uma atitude semelhante a um homicida. Ele é um dos mais destacados bolsonaristas em Minas e vai manter a temperatura elevada ao curso do mandato.
Por sua vez, o presidente, em vez de jogar água na fervura, lançou dúvidas sobre a postura de Moro, observando estar convencido de que o senador “armou” toda a cena para ficar em evidência. Lula disse que não tinha provas e que não falaria mais sobre o assunto até ter algum tipo de confirmação, mas o dano já está feito, bastando acompanhar o debate nas redes sociais, espaço de livre hermenêutica que produz interpretações de acordo com o interesse do freguês. Lula, é fato, não esqueceu, e nem vai, da sua condenação e prisão autorizada por Sérgio Moro e tem como missão colocá-lo no limbo.
O grave desse enredo é o fato de o país ter demandas mais sérias para resolver a acaba queimando energia ainda sob os ecos da campanha eleitoral. A Polícia Federal fez prisões com base em investigações e, como destacam os seus próprios representantes – a começar pelo seu diretor-geral -, não se baseou em posições ideológicas ou filiação partidária. Como polícia de Estado deve, por ofício, agir dessa maneira.
Há em curso na instância econômica discussões que vão carecer de empenho coletivo para a sua aprovação, já que a base do Governo ainda não tem a maioria necessária para cuidar de seus próprios pleitos. A reforma tributária e o teto de gastos são duas pautas importantes e que deveriam ter prioridade nas discussões dentro e fora do parlamento. Quando se estica a corda, a discussão cai de nível e o bom senso sai pela porta.
Na sua viagem à China, que começa neste fim de semana, o presidente terá na sua comitiva aliados e adversários, muitos deles bolsonaristas de primeira hora, mas todos envolvido em negócios de interesse do país. Esse viés republicano deveria ser a agenda prioritária do Governo e de seus adversários, já que não faz sentido manter os palanques ativos cinco meses após o fechamento das urnas.
Ademais, os políticos precisam ler pesquisas. Levantamento efetuado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas (Ipec), divulgadoRena no início desta semana, aponta que a maioria dos brasileiros aposta numa terceira via para as próximas eleições, dando mostra de descontentamento com a polarização, sobretudo por sua permanência na agenda dos parlamentos.