“Uma resposta ao mercado editorial brasileiro”

Por Marisa Loures

jô ramos
Diretora da ZL Editora, Jô Ramos coordena a primeira edição do Salão Internacional do Livro do Rio de Janeiro – Foto Divulgação

Lançar um livro, fazer com que ele aconteça, não é fácil no Brasil. Sem o respaldo das grandes editoras e, consequentemente, fora de boa parte das festas literárias mais badaladas do país, o jovem autor independente encontra dificuldades para tornar sua escrita conhecida do grande público. Foi pensando nisso que, há sete anos, a escritora e diretora da ZL Editora, Jô Ramos, criou o Salão Internacional do Livro. Depois de percorrer Nova Iorque, Portugal, Alemanha, Canadá e França, o evento chega ao Rio de Janeiro,  no próximo dia 28 de março, para uma temporada até 4 de abril, na Casa França-Brasil. Foi preciso conhecer o mundo, para depois voltar para a terra onde foi idealizado.

“Aqui, sempre tivemos muita dificuldade para conseguir espaço e apoios. Tudo o que conseguirmos foi da Europa e dos Estados Unidos. Fomos fazer onde estava sendo oferecida esta oportunidade”, conta Jô, enfatizando que a proposta do projeto é clara e urgente: divulgar o novo autor brasileiro. “Ele pretende ser uma alternativa quando a Bienal do Livro não acontece no Rio de Janeiro. Então, um ano sim e outro não, estaremos no Rio, mostrando para o público, com entrada gratuita, a nova produção literária do autor novo e independente.”

Na primeira edição brasileira, o homenageado será o poeta e ensaísta Ferreira Gullar. Para participar, os escritores só precisam de ter, pelo menos, um livro publicado. A inscrição deve ser realizada até a próxima quinta-feira através do e-mail [email protected]. De acordo com Jô, será uma grande festa, com DJ, gastronomia e conferências abertas ao público e totalmente gratuitas. Entre os assuntos discutidos durante os oito dias de programação, estão a “Diversidade e a representatividade na literatura”, “Jovens escritores e o mercado editorial brasileiro”, “Geração Literária” e “1968 – O Ano que abalou o mundo – meio século depois.”

O Sala de Leitura de hoje traz um bate-papo com Jô Ramos, não só a organizadora do Salão Internacional do Livro, mas a jornalista, escritora, editora chefe da Revista Lapa Legal Rio, documentarista, autora do projeto Jovens Escritores das Escolas Brasileiras e coordenadora do Movimento Defesa da Mulher, que trabalha pelo fim da violência contra mulheres no mundo.

Marisa Loures – Como o mundo tem recebido a nossa literatura?

Jô Ramos – Todo mundo, agora, tem interesse em saber o que está acontecendo não só no Brasil, mas em todos os países que falam a Língua Portuguesa, porque a produção literária, mesmo que não seja tão divulgada, é muito forte. Nós produzimos muito, temos muitos jovens escrevendo coisas maravilhosas. Cada vez mais a procura é maior. Fiz um Salão do Livro em Berlim, na Alemanha, e foi um sucesso, assim como no Canadá e em Nova Iorque. É preciso que a gente esteja atento à nova procura da nossa cultura.

– Em todas as entrevistas que você concede sobre o Salão do Livro, percebo que você fala muito que o autor brasileiro independente precisa de divulgação. O público e as editoras têm resistência a esse autor?

– O público não tem resistência, porque não conhece. Não há divulgação, portanto não conhece. Temos poucos eventos literários onde esse autor pode se mostrar, porque tudo, no Brasil, é extremamente caro. E o autor tem dificuldade de ter acesso à participação em grandes eventos. Há uma série de contratempos, mas acho que não tem nenhum problema nesse sentido de resistência, porque o autor brasileiro está em franca expansão. A criatividade é notável, a quantidade de jovens que escrevem e publicam pequenos livros de poesias, principalmente, é muito grande. O público não tem aversão. O que não temos e precisamos é de divulgação e de criar cada vez mais eventos literários onde esses autores tenham oportunidades de mostrar seu trabalho.

– Você fez questão de dizer em uma entrevista que não trabalha com autores famosos. Por que a ZL Editora resolveu trilhar esse caminho?

– Não trabalho com autores famosos porque os famosos já são famosos. Eles já têm a mídia toda do lado deles e já são convidados para os grandes eventos. Eles já têm as grandes editoras dando respaldo. Então, não precisam do meu trabalho. Não que a gente não os aceite no nosso salão, não que eles não possam participar. Evidentemente que sim. Vamos receber no Salão Internacional a escritora Ana Arruda Callado, que tem mais de 11 livros lançados, que escreve maravilhosamente bem sobre mulheres brasileiras. Ela é uma grande intelectual brasileira, foi casada com Antônio Callado, grande escritor já falecido. Todos podem participar. Claro que a gente quer dar ênfase a essa nova produção editorial e a esse novo autor que não tem espaço.

“Acho que rede social é uma maravilha, propicia a divulgação dos autores, mas, é como todo meio de comunicação. Existem uns bons e não muito bons, os menos favoráveis. Aí fica a critério do público, de ele fazer a sua escolha. Acho que criticar as redes sociais pelo surgimento de autores de vários níveis não é a saída. A saída é dar espaço para que tudo possa ser oferecido.”

– Vivemos um momento em que as redes sociais colaboram demais com o surgimento de novos autores. Como você vê o surgimento desses novos autores neste cenário?

– Rede social é isso, é uma rede. Então, quando você joga na rede, vem tudo. Acho que é uma questão de tempo para que a gente tenha o discernimento do que é bom, do que vai ficar, e do que é produzido,  mas que não merece tanta atenção nossa, vamos dizer assim. Acho que rede social é uma maravilha, propicia a divulgação dos autores, mas, é como todo meio de comunicação. Existem uns bons e não muito bons, os menos favoráveis. Aí fica a critério do público, de ele fazer a sua escolha. Acho que criticar as redes sociais pelo surgimento de autores de vários níveis não é a saída. A saída é dar espaço para que tudo possa ser oferecido. No caminho, vai haver uma seleção natural do que é bom e do que não é muito bom.

“Acredito que isso, além de ser uma resistência do novo autor, é uma resposta ao mercado editorial à mídia, dizendo: “nós estamos aqui, independentemente de vocês não nos aceitarem, de você não quererem publicar nossa obra.” Acho fantástica essa nova posição não só do autor, mas do cidadão do mundo. A gente não está mais aqui para ficar esperando as grandes corporações, as grandes mídias e as grandes empresas nos procurarem.”

– A produção independente de livros é, de fato, uma tendência do mercado ou renovação editorial?

– As duas coisas. É uma renovação editorial e uma tendência. Finalmente, estamos colocando em prática nosso poder de ação. Não vamos ficar esperando que venha uma grande editora e mande um convite para você lançar seu livro. Não temos tempo para isso. Estamos numa época muito corrida, numa época em que, a cada minuto, acontece algo novo no planeta. O autor está sabendo disso e não quer ficar esperando por nada. Ele vai interagir, vai fazer sua própria produção, criar outra saída para que sua produção literária seja lançada e divulgada. Acredito que isso, além de ser uma resistência do novo autor, é uma resposta ao mercado editorial à mídia, dizendo: “nós estamos aqui, independentemente de vocês não nos aceitarem, de você não quererem publicar nossa obra.” Acho fantástica essa nova posição não só do autor, mas do cidadão do mundo. A gente não está mais aqui para ficar esperando as grandes corporações, as grandes mídias e as grandes empresas nos procurarem. Hoje, há caminho, e esse caminho deve ser percorrido como alternativa de divulgação de um belo trabalho editorial que está sendo realizado no país.

 – Jornalista, escritora, editora chefe da Revista Lapa Legal Rio, editora na ZL Editora,  documentarista. Fundou e coordena os projetos do Movimento Defesa da Mulher, que trabalha pelo fim da violência contra mulheres no mundo. Como todas essas Jôs caminham?

– Caminham juntas, porque a profissional não pode estar afastada da sua posição de cidadã, posição de atuar no mundo. Tenho oito livros lançados em quatro línguas sobre violência contra mulheres no Brasil. Sou jornalista formada há mais de 20 anos. Trabalhei muito tempo na área, depois comecei a escrever sobre violência contra a mulher, especializei-me nisso e comecei a fazer salões de livro. Fundei o movimento “Violência contra mulheres”, com o qual percorro várias comunidades brasileiras, principalmente, no Rio. Daí vem minha produção literária. Fui convidada na Suíça, ganhei um prêmio lá pelo trabalho junto às mulheres. E minha função como cidadão é prestar alguma coisa para a sociedade. Acho que esse é o caminho. Há mais de 15 anos que venho com essa prática de defesa da mulher, levando esclarecimento para a mulher. Tenho um livro em que falo sobre todas as leis que protegem as mulheres, todas as leis que possam dar a ela subsídio para que ela possa se defender de todo tio de violência. Esse livro percorre o mundo todo, foi lançado em vários países. E continuo trabalhando com isso, essa é a minha proposta de vida.

Salão Internacional do Livro do Rio de Janeiro

De 28 de março a 4 de abril, na Casa França-Brasil (Rua Visconde de Itaboraí 78 – Centro – Rio de Janeiro).

Inscrições até 1º de março através do e-mail [email protected]

 

Sala de Leitura

Quinta-feira, às 9h40, na Rádio CBN Juiz de Fora (AM 1010).

 

Marisa Loures

Marisa Loures

Marisa Loures é professora de Português e Literatura, jornalista e atriz. No entrelaço da sala de aula, da redação de jornal e do palco, descobriu o laço de conciliação entre suas carreiras: o amor pela palavra.

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