21 de abril


Por Paulo Roberto de Gouvêa Medina/ Professor emérito da UFJF

20/04/2017 às 19h00

O 21 de abril, dia consagrado ao martírio de Tiradentes, convida-nos a uma reflexão sobre as causas por que lutou o herói da Inconfidência Mineira. A defesa da liberdade, a conquista de uma pátria independente, a instituição de um regime republicano e o respeito à vontade do povo foram os grandes ideais que inspiraram os inconfidentes. Mas a motivação imediata do movimento resultou do inconformismo daqueles bravos mineiros com os abusos praticados pelos governantes da capitania. O alvo inicial do sentimento de rebeldia era o grotesco Luís da Cunha Meneses, que se tornou famoso, entre 1783 e 1788, pelo autoritarismo e pela falta de escrúpulos.

Em poema satírico cuja autoria é atribuída a Tomás Antônio Gonzaga, o governador foi estigmatizado como o Fanfarrão Minésio. Os versos compunham as Cartas Chilenas, assinadas com o pseudônimo de Critilo e endereçadas, supostamente do país andino, a um certo Doroteu, que era, na verdade, o inconfidente Cláudio Manoel da Costa. Nesse poema, peça importante da nossa literatura política, os atos de corrupção de Cunha Menezes são criticados de forma velada, em estilo alegórico, como se fosse ele um general chileno que governava uma capitania no seu país. Alude-se, por isso, aos “grossos devedores, que repartem/Contigo os cabedais, que são do Reino”.

Quando a revolta se disseminou em Vila Rica e fez com que se reunissem na Conjuração Mineira homens de várias classes sociais, tinham em vista os seus líderes a libertação do jugo português não porque os movesse sentimento de ódio à pátria de origem, mas porque os irmanava a consciência de alguns valores fundamentais à vida em comunidade, entre os quais o da lisura no trato da coisa pública.

Decorridos mais de dois séculos, o ideal dos inconfidentes, nesse particular, ainda não foi alcançado. O país vive um quadro de corrupção sem precedentes: relações promíscuas entre governantes e empresários; tráfico de influência; favorecimento a determinadas empresas em contratos de obras públicas, mediante a contrapartida do pagamento de propina a administradores públicos; subsídios financeiros concedidos a líderes influentes a título de assessorias fictícias ou de palestras vazias; uso de cargos de direção na maior estatal para desvio de dinheiro em proveito próprio e de terceiros; locupletamento ostensivo de certo governador que se fez sócio de empresas nas obras realizadas, na volúpia de enriquecer, insensível ao empobrecimento do próprio estado; financiamento clandestino de campanhas eleitorais – tudo isso escandaliza, desencanta e revolta o nosso povo.

Gostaríamos de ouvir, neste dia, a voz de um líder sintonizado com as aspirações dos inconfidentes a repetir as palavras que, outrora, os empolgavam e de que hoje nos ressentimos. Um líder que fosse a expressão dos seus ideais, e não alguém que encarnasse de novo a figura do Fanfarrão Minésio.

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