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Com expansão do turismo, falta de segurança preocupa moradores de Ibitipoca

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Posto policial na entrada de Ibitipoca está desativado desde 2016; de acordo com a PM, não há instalação de postos em distritos (Foto: Leonardo Costa)
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Segurança e tranquilidade são o que motivaram muitos dos que hoje moram em Conceição do Ibitipoca, distrito de Lima Duarte, a deixarem os agitados centros urbanos e fazerem da vila sua casa. Mas, o que já foi um lugar remoto, atrai cada vez mais turistas, moradores e empresários. Com o desenvolvimento acelerado, os que vivem em Ibitipoca relatam um ambiente de crescente insegurança. Conforme depoimentos colhidos pela Tribuna, o número de furtos e invasões a estabelecimentos tem aumentado na região.

Mas dados do 27º Batalhão da Polícia Militar de Minas Gerais mostram que em 2023 o distrito registrou apenas quatro ocorrências entre janeiro e julho. No mesmo período de 2022, foram oito registros. Entre elas furto, dano, estelionato, ameaça, crimes ambientais e estupro de vulnerável. Quem mora em Ibitipoca, ou passa boa parte do tempo lá, entretanto sabe que esse número não reflete a realidade.

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Os entrevistados pela reportagem apontam a subnotificação das ocorrências motivada principalmente pela falta de um posto policial no distrito. O turista que chega na vila pela primeira vez e dá de cara com uma unidade da Polícia Militar (PM) pode até pensar que a região possui efetivo fixo de militares, no entanto, o prédio está desativado desde 2016. Essa carência dificulta a agilidade no flagrante policial, visto que as viaturas precisam percorrer cerca de 26 km do centro de Lima Duarte até a vila, com boa parte da estrada ainda sem calçamento.

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Questionada, a PM informou que a ausência de posto policial em Conceição do Ibitipoca é em razão de o local ser um distrito de Lima Duarte. “Não há postos policiais em distritos e sim em municípios. O distrito, da mesma forma que os bairros, está no rol de policiamento preventivo. Tal localidade é patrulhada diariamente pelas equipes policiais de serviço”, informou a corporação em nota. A PM também não confirmou que as ocorrências em Ibitipoca são subnotificadas, de acordo com os militares não é possível afirmar essa subnotificação, visto que seria algo “totalmente empírico”.

Invasões e furtos

A principal reclamação dos moradores do local é em relação a invasões e furtos a propriedades. Por abrigar o Parque Estadual do Ibitipoca, o distrito se tornou um dos destinos turísticos mais procurados de Minas Gerais. Com isso, o número de pousadas e casas de temporada cresce exponencialmente. Tais residências passam boa parte do tempo desocupadas e, consequentemente, vulneráveis a arrombamentos. Conforme relatos, casos de furto a essas casas têm sido cada vez mais frequentes.

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Quem mora em Ibitipoca há mais tempo se assusta com esse desenvolvimento acelerado e teme pelo fim da sensação de segurança. Proprietário da pousada Janela do Céu, Antônio Cézar Sousa, mora há 30 anos na vila. Conforme relata, a presença de pessoas desconhecidas na região tem ficado mais frequente, situação que levantam suspeitas em moradores mais antigos. “Depois da pandemia apareceram muitas pessoas novas, que ninguém sabe de onde vieram e quem são”, conta.

Ele afirma que essas “pessoas suspeitas” conseguem abrigo com moradores de Ibitipoca, o que, em seu ponto de vista, é uma irresponsabilidade que pode colocar em risco toda a população. “Se elas estão morando aqui, alguém ofereceu aluguel para elas. Se a gente traz esse tipo de gente para Ibitipoca, as nossas coisas depois podem ser arrombadas e invadidas. Cabe ao morador selecionar as pessoas para qual ele vai alugar um imóvel. Tentar pesquisar o mínimo de onde a pessoa veio, qual a referência dela, o que ela pretende fazer aqui. Essa questão precisa ser um esforço coletivo”, acredita.

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Cézar ainda aponta o alto fluxo de visitantes no Parque Estadual como mais um motivo para reforçar o policiamento na região, principalmente em épocas de feriado. Conforme dados do Instituto Estadual de Florestas (IEF), o parque recebe em torno de 90 mil visitantes ao ano, número 75 vezes maior que a população total do distrito, que é de 1.191 moradores. “Se Ibitipoca partir para um lado criminoso, que a gente vai precisar de segurança efetiva mesmo, da gente se sentir acuado. Eu não sei nem o que fazer, porque meus hábitos são completamente diferentes dos hábitos de uma cidade grande, onde a gente tem que tomar sérios cuidados.”

Sem posto policial, viaturas precisam percorrer cerca de 26 km do centro de Lima Duarte até o distrito, para patrulhamento; para moradores, situação dificulta flagrantes e reforça sensação de insegurança na vila (Foto: Leonardo Costa)

Falta de fiscalização

Outro problema relatado em Ibitipoca é a falta de fiscalização com o turismo. Casos de perturbação do sossego são frequentes. Sabrina Oliveira, proprietária da Poente Guest House, afirma que já teve que lidar com situações em que locatários de imóveis de temporada mantinham som alto até tarde, atrapalhando o sono dos hóspedes da pousada. “As pessoas alugam a casa e não têm noção do barulho que estão fazendo. É música e conversa alta noite adentro, o que acaba atrapalhando o turista que veio com outra proposta, de descansar, ou acordar cedo para aproveitar as trilhas do parque.”

Diante disso, os empresários da vila ficam impotentes. Não há fiscalização e, conforme Sabrina, nos casos em que é necessário acionar a polícia, raramente as viaturas sobem a Serra para atender o pedido. “Muitas das vezes sobra para gente (empresários da vila) o papel de fiscalizador. Mas isso nos coloca em risco. Nós nos sentimos abandonados, você liga para a polícia e eles nunca vêm. Há alguns anos, meu marido precisou intervir em uma festa que estava acontecendo em uma dessas casas de temporada, onde o pessoal estava passando dos limites. E ele acabou agredido, levou um golpe de copo de vidro no rosto, ficou ferido. Foi a primeira vez que eu tive contato com a violência de fato e isso me marcou muito.”

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Crime chocou moradores

Um crime recente que ganhou repercussão em Conceição do Ibitipoca e chocou moradores, segue sem solução: o assassinato do músico Chiquinho. Sócrates Francisco Lage Baldute, de 43 anos, foi encontrado caído na vila no dia 26 de fevereiro deste ano. Conforme informações da Polícia Militar, ele estava com um ferimento grave na cabeça. Chiquinho chegou a ficar 40 dias internado, mas morreu no dia 7 de abril.

Em contato com a Polícia Civil, o delegado responsável pelo caso, José Márcio de Almeida Lopes, afirmou que o inquérito policial foi concluído no final do mês de abril. Em nota, ele afirmou que a investigação teve início ainda em março, quando foi ouvida mais de uma dezena de pessoas e requisitados diversos exames periciais. “Com as diligências realizadas foi possível apurar que a vítima foi morta em um trilho na localidade de Ibitipoca, com golpes de uma pedra de 1 quilo e 20 centímetros.”

A Polícia afirmou que uma mulher, que tinha relacionamento com a vítima, foi indiciada pela morte do músico. Ela foi indiciada por homicídio qualificado, com pena de prisão de 12 a 30 anos. No momento, ela se encontra foragida. A polícia solicita para aqueles que tenham qualquer informação sobre o paradeiro da investigada que se dirijam a um Unidade Policial ou façam uma denúncia através do número 181.

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Rede de Proteção Integrada ao Turismo

Desde julho de 2022, o distrito de Conceição do Ibitipoca debate a instalação da Rede de Proteção Integrada ao Turismo, uma iniciativa do Governo de Minas Gerais, encabeçada pela Polícia Militar do estado em consonância com órgãos estaduais e municipais. O objetivo é garantir a segurança da população e preservação da região, que abriga o Parque Estadual do Ibitipoca.

A Associação dos Moradores e Amigos de Ibitipoca (Amai) também integra a rede e tem organizado encontros mensais para discutir o tema da segurança no distrito. Nesta quarta-feira (30), a Amai faz mais uma reunião sobre o tema, na Praça dos Multimeios. De acordo com o tesoureiro da associação, Marcos Horácio de Sousa, algumas articulações já estão sendo feitas para a instauração efetiva da Rede Integração de Proteção ao Turismo em Ibitipoca. Um dos projetos discutidos é o Olho Vivo, que busca instalar câmeras de seguranças na vila.

Conforme Marcos, são pleiteadas 23 câmeras para serem instaladas em nove pontos estratégicos da região central de Ibitipoca. Para arcar com esse projeto será necessário investimento de R$ 25 mil. O valor é levantado pela Amai junto a instituições públicas e privadas do município, como a Associação Comercial de Lima Duarte. “Estamos organizando as etapas para fazer Ibitipoca entrar na Rede de Proteção Integrada ao Turismo. A polícia teria acesso às imagens dessas câmeras e, na sede da Amai, um servidor ficaria responsável por isso. A Rede é essencial para nossa região e ela não vai oferecer uma proteção exclusiva ao turista, mas sim a aos empresários, moradores e tudo que tem função comercial ligada ao turismo.”

Monitoramento por mensagens expõe moradores

Umas das atuais formas de monitoramento em Conceição do Ibitipoca acontece por meio de grupo de Whatsapp, no qual fazem parte empresários do distrito, moradores e forças de segurança. Nele, são feitas denúncias relacionadas a perturbação do sossego, comportamentos suspeitos, furtos e invasões. A comunicação direta com a polícia funciona algumas vezes, mas conforme explica o ex-vice presidente da Amai, Fred Fonseca, a estratégia pode colocar os moradores que “deduram” em risco. “Grupo de Whatsapp é um perigo quando você não tem uma comunidade articulada. As mensagens vazam e no momento em que você faz uma denúncia, corre o risco da pessoa que foi denunciada ficar sabendo e querer fazer alguma coisa. Além disso, um grupo como esse acaba servindo apenas ao interesse dos empresários e de quem mora no centro da vila, com acesso a tecnologia. Mas a serra de Ibitipoca tem boa parte dos seus moradores em área rural. Cadê essa acessibilidade?”

O medo de se expor e ficar sujeito a possíveis retaliações faz com que o atual modelo não seja viável, segundo o empresário Antônio Cézar Sousa. Para ele, o risco é de que criminosos estejam infiltrados nessa rede de denúncias. “Eu não concordo. Não vou me inscrever em uma rede que tem bandido infiltrado. Dedurar possíveis pessoas que estejam envolvidas com o tráfico, assassinato. Eu não vou denunciar um bandido e correr o risco de depois ser perseguido. Uma rede como essa deve ser sigilosa, mas nunca é.”

Posicionamento da Prefeitura

Questionada pela Tribuna, a Prefeitura de Lima Duarte afirmou, por meio de nota, que possui uma boa relação com a Polícia Militar de Minas Gerais, responsável pela segurança pública em todo estado. Em relação ao distrito de Conceição do Ibitipoca, a Prefeitura pontuou que está em diálogo com diversos setores a fim de estruturar estratégias para o aumento da segurança pública. “Entretanto, em relação ao policiamento, o município não atua diretamente na gestão e organização, ficando a cargo do estado de Minas Gerais tal tarefa.” A Prefeitura disse que tem implementado ações de combate à violência em escolas municipais e está trocando o parque luminotécnico da cidade por LED, algo que “muito contribuirá para a segurança pública de todo município”.

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