O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) arquivou, no final do ano passado, o processo de licenciamento ambiental para a construção da Pequena Central Hidrelétrica (PCH) Santa Rosa I, no Rio Preto. Em 2024, a Tribuna publicou uma reportagem sobre a luta de moradores de Minas Gerais e do Rio de Janeiro pela preservação do curso d’água, que fica localizado na divisa entre os dois estados, unindo os municípios de Porto das Flores, distrito de Belmiro Braga, e Manuel Duarte, distrito de Rio das Flores, no sul fluminense. Único rio da bacia do Paraíba do Sul que não é poluído, as águas do Rio Preto carregam uma rica biodiversidade, mas também representam um grande valor simbólico e cultural para a população. Há mais de 20 anos, um projeto de construção de uma PCH gera preocupação aos moradores e pesquisadores que temem mudanças no rio e na vida dos que por ali vivem.
Os despachos do Ibama apontam problemas no cumprimento de prazos, falta de estudos técnicos, criação de Monumentos Naturais e mudanças socioambientais como fatores que impediram a continuidade do licenciamento. Anteriormente, o projeto básico da PCH havia sido aprovado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e conseguido licença prévia emitida pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama). Agora, de acordo com o Ibama, se a empresa Minas PCH tiver interesse em prosseguir com o projeto será preciso abrir novo processo de licenciamento ambiental, através de uma nova solicitação por meio do preenchimento da Ficha de Caracterização Ambiental (FCA).
O documento também destaca que modificações nas condições socioambientais do lugar ocorreram desde quando o empreendimento obteve viabilidade ambiental, há 16 anos, e o mesmo se aplica em relação ao contexto ambiental avaliado pelo Ibama em 2011, quando a renovação da Licença Prévia (LP) foi concedida. Desde 2005, o Rio Preto é oficialmente considerado uma Área Prioritária para a Conservação da Ictiofauna – conjunto dos peixes que vivem em um certo ambiente, por conter ambientes propícios para a reprodução, alimentação e por incorporar espécies de vida restrita. Pesquisadores também identificaram a existência de espécies ameaçadas de extinção no curso d’água, como os peixes surubim-do-paraíba (Steindachneridion parahybae) e pirapitinga (Brycon opallinus), que são diretamente dependentes de água de boa qualidade para sua perpetuação.
A Tribuna entrou em contato com a Minas PCH, responsável pelo projeto, que informou que vai se manifestar apenas nos autos do processo.
Primeira Licença Prévia foi emitida pelo Ibama em 2002
A primeira Licença Prévia (LP) do empreendimento foi emitida em 2002, com validade de um ano, posteriormente renovada em 2011, por dois anos, e em 2019 por três anos e dois meses. Em 2023, foi emitida a LP no 680/2023, com validade de seis meses. Porém, para a emissão desta, como consta no documento do Ibama, não houve consulta aos órgãos gestores das duas unidades Unidades de Conservação (UCs), chamadas de Monumentos Naturais Corredeiras e Piracemas do Rio Preto, criadas em 2022 pelas prefeituras de Belmiro Braga e Rio das Flores. As UCs têm o objetivo de proteger a paisagem das margens e do leito do rio, que inclui correnteza, corredeiras, cachoeiras, poços e piscinas naturais. Além disso, também busca garantir a preservação da biodiversidade aquática e ribeirinha.
A Associação de Moradores e Amigos de Porto das Flores se manifestou a respeito do arquivamento do processo e destacou que ainda há caminhos a percorrer visando a preservação do rio. “Isso significa que todo o nosso empenho em conjunto, cada um com sua força, vem surtindo efeitos muito assecuratórios e que precisamos prosseguir no intuito de preservação mobilizando comunidade, solicitando e prestando apoio mútuo e constante. Temos um Rio Preto inteiro para livrar de barramentos. Temos PLs em tramitação e muitas outras providências a serem tomadas.”
Turismo local e espécies raras
Na matéria especial publicada em março de 2024, um dos moradores entrevistados pela Tribuna foi Annibal Magalhães, 50, que é representante da Associação de Moradores e Amigos de Porto das Flores e foi um dos precursores da causa em defesa do rio. Na época, ele disse que o projeto de construção da PCH não levava em consideração elementos importantes, como a presença de sítios arqueológicos e de comunidades originárias no local.
“A sociedade pode perder um rio desse por conta de uma PCH?”, indagou à época. Além disso, Annibal vê como potencial econômico da região o turismo ao redor do rio, que também, em sua visão, seria afetado por essa construção. “Aqui temos um rio limpo, com espécies diferentes e ameaçadas, além dessa parte histórica e das fazendas coloniais.”