Sete anos atrás, a Tribuna percorreu o trecho da BR-040 entre Juiz de Fora e o Rio de Janeiro constatando remendos, rachaduras e obras paralisadas. Agora, refazendo o percurso, estão diferentes o preço dos pedágios – 17% mais caro, passando de R$ 12,40 para R$ 14,50 – e a deterioração cada vez maior dos espaços destinados à Nova Subida da Serra (NSS) de Petrópolis, paradas desde 2016. De acordo com a concessionária, uma perícia judicial apontou a conclusão de 46,7% da intervenção.
Desde o km 38, na ida, já é possível perceber os primeiros desgastes no asfalto – que não chegam a ser frequentes nem a interferir no curso -, bem como os primeiros serviços de manutenção, como trabalhadores recolhendo vegetação caída à beira da estrada – na ocasião, no km 41.
Tanto que, em um ponto de parada, no km 70, já nas proximidades de Petrópolis, a opinião dos usuários que realizam trajetos mais curtos é positiva. É o caso dos frentistas Joyciele Flor e Leonardo Vieira, que moram em Cascatinha, distrito da cidade, e todo dia, de manhã e à tarde, fazem o mesmo trajeto: “Essa parte aqui é boa, não tenho o que reclamar não”, ele diz.
No mesmo ponto, João Pedro – que também vai diariamente de Petrópolis a Itaipava – recebia atendimento da concessionária por pane mecânica no veículo. Ele afirma que um atalho no túnel seria muito bom, mas que “essa estrada é muito boa, melhor do que muitas outras”.
Risco de acidentes na descida
Diferente deles, Rafael Augusto, que transporta mercadorias de uma plataforma de comércio eletrônico, passa por pedágios no trajeto que também faz rotineiramente – o mesmo realizado pela Tribuna. “A pista não está boa. Tem trecho que é todo esburacado, não tem sinalização direito”, reclama. Ele conta que, nos quatro anos que utiliza a pista, constantemente se depara com acidentes, principalmente na divisa de Petrópolis com Duque de Caxias, próximo ao km 92, pelo fato de a pista ser muito escorregadia. Em feriados, a empresa o envia por outro caminho, para evitar o grande fluxo que, segundo ele, melhoraria muito com o túnel de cinco quilômetros que foi iniciado para substituir a subida da serra, mas abandonado.
O risco de acidentes, em razão de “muitas curvas e descidas” também é a maior preocupação de Marcos Ubiratan, que transporta latas vazias de Três Rios à cidade do Rio de Janeiro, e ainda no mesmo trecho: “Chegando ao ponto da serra, tem motorista que vem de fora e não conhece, entra nas curvas e vai tombando. Ainda mais em época de chuva, que a pista fica escorregadia, tem deslizamento, aí é complicado.” As obras previstas no projeto da NSS também teriam o propósito de desacentuar e eliminar uma série de curvas.
Próximo ao Terminal Rodoviário de Petrópolis, no km 82, pela extensão de um quilômetro, começam, de fato, a aparecer mais rachaduras e remendos. Já no 89, o Viaduto do Grinfo, com construções que possibilitariam o seguimento da viagem nos dois sentidos, para quem quisesse apreciar a vista do miradouro – que também deveria ter sido revitalizado – já era ponto de pichações em 2017 e, agora, se tornou local para consumo de bebidas alcoólicas, com garrafas vazias espalhadas em meio aos pedaços de ferro retorcido.
Embaixo do viaduto, Marcos da Silva Souza precisou parar o caminhão em que transporta galões de água mineral. Todos os dias, ele carrega no km 97, no sentido oposto, e volta, descendo para a Tijuca, no Rio de Janeiro. “Subindo do km 97 até o retorno, aqui, está muito crítico. Muita buraqueira, o caminhão trepida muito. É parafuso que solta, quebra a mola, trinca a mola, quebra pino de centro. A balança de caminhão está trincada, vou gastar de novo. Justamente por causa dessa estrada, por causa da trepidação, que é muito grande.” Marcos explica que a manutenção gira em torno de R$ 1.200, depende de quantas molas quebram. Agora, para a balança, estima que precisará gastar R$ 2 mil.
Viaduto para lugar nenhum
Assim como os colegas de profissão, também diz que sempre há acidentes, inclusive com caminhões tombando, principalmente na subida da serra. “Com certeza as obras iriam ajudar, só que está tudo parado, os ferros todos aí, não tem condições. Uma estrada pedagiada não era para ser desse jeito. Está largado, totalmente largado aqui.”
Bem no já citado km 92 existe outro resto de obra, onde seria uma passagem de viaduto também abandonada e que não estabelece nenhuma ligação, assim como no 95, no 97, no 101 – logo antes do pedágio de Duque de Caxias – e em outros pontos, que também poderiam facilitar um retorno a Juiz de Fora. O primeiro só aparece a cerca de 20 minutos do Grinfo.
Maior tarifa
Em março deste ano, o Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu sobre uma representação do Ministério Público Federal (MPF), a respeito de possíveis irregularidades no trecho da concessão. Os reajustes “teriam ocasionado aumento de 57,5% no valor do pedágio, apesar das graves irregularidades e inexecuções contratuais existentes no contrato, já apuradas por este Tribunal e outros órgãos de controle”, destacou a decisão do TCU, que ainda cita a mudança de local de uma praça de pedágio de forma irregular.
Já a Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora-Rio (Concer), afirma, em nota enviada à Tribuna, que “o reequilíbrio resultante da mudança da praça não gerou prejuízo aos usuários nem ao erário”, de acordo com uma perícia realizada em uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal de Petrópolis.
O ministro-relator do acórdão do TCU, Walton Alencar Rodrigues, também fez um retrospecto da atuação da Concer, detentora da concessão desde 1996: “A Concer, em 2014, era a concessionária de rodovias federais que possuía a maior tarifa de pedágio por 100 km e a que, de longe, apresentava o maior índice de inexecução de suas obrigações”.
‘Tardança injustificada’
Justamente a partir de 2014, a Concer atribui a culpa do desequilíbrio financeiro a dívidas da União, que seriam de R$ 2 bilhões, em valores corrigidos: “Mesmo não recebendo os aportes financeiros nem a extensão do prazo de concessão previstos em termo aditivo para a execução da obra e reequilibrar o contrato, a Concer prosseguiu com as obras [da NSS] até esgotar sua capacidade de endividamento, em julho de 2016”.
O contrato da empresa deveria ter se encerrado em 2021, mas o Superior Tribunal de Justiça permitiu a prorrogação, até que seja realizada uma nova concessão, “que ocorre com tardança injustificada”, de acordo com o ministro Walton.
Ele recomendou que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e o Ministério dos Transportes tomem as providências para realizar a licitação com rapidez, já que “a empresa opera a concessão por força judicial, prestando serviços precários aos usuários”.
Quanto às reclamações dos usuários, a companhia reitera o desequilíbrio econômico, dizendo que mantém “seus compromissos com os credores, destinando todos os recursos livres à manutenção e operação da rodovia”.
A nota ainda afirma que os questionamentos do TCU foram integralmente esclarecidos pela Concer junto à ANTT.
Leilão deve ocorrer no segundo semestre
A ANTT afirma à Tribuna que foi impedida, pela Justiça, de reconhecer a caducidade do contrato de concessão e de exigir o cumprimento de diversas obrigações contratuais da Concer, com as obras também judicializadas.
A nota informa que o novo projeto de concessão encontra-se em revisão de estudos pela área técnica da ANTT. “Após essa etapa, os documentos serão enviados para análise do TCU. A Agência ressalta que o corpo técnico está empenhado em concluir o processo para envio ao TCU e que está dedicada à busca pela melhor solução para o trecho rodoviário. A expectativa da Agência é que o projeto seja levado a leilão no segundo semestre deste ano. No entanto, é importante observar que a publicação do edital se dará a partir da análise da Corte de Contas.”
Mesmo assim, a Concer afirma que “está pronta para reiniciar imediatamente as obras da NSS e concluí-la no menor tempo possível”. “O projeto executivo da NSS está pronto, revisado, atualizado e certificado, a concessionária conta com licenciamento ambiental e ainda reúne outros fatores que permitem entregar a obra em menos tempo”, prossegue a nota, com “intensas negociações” ocorrendo entre o Poder Público e a concessionária, em busca de uma solução consensual que viabilize a conclusão.
O Ministério dos Transportes não respondeu aos questionamentos da Tribuna.