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Pandemia deixa gargalos na saúde para próxima gestão

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O conhecimento técnico da infraestrutura da rede de saúde pública e a retomada dos atendimentos suspensos durante a pandemia do coronavírus deverão ser os principais requisitos para a gestão da saúde pela próxima Administração municipal. Indiscutivelmente, as circunstâncias estabelecidas pela epidemia impuseram grandes desafios a serem encarados em todas as áreas. Entretanto, a rede de saúde pública é um dos segmentos em que os impactos da Covid-19 foram sentidos mais diretamente, exigindo medidas de mitigação. Para evitar que a rede do Sistema Único de Saúde (SUS) entrasse em colapso devido à demanda gerada, os critérios de assistência à população tiveram de ser revistos: enquanto os esforços se voltavam para ampliação do atendimento a “pacientes com Covid”, parte dos demais atendimentos em saúde ficou desassistida.

Em Juiz de Fora, por exemplo, conforme dados da Secretaria de Saúde, houve incremento de quase 70% no número de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) destinados a pacientes vítimas da Covid-19. De 108 leitos deste tipo vocacionados para o tratamento da doença existentes em março, o total subiu para 183 até o fim de setembro. Por outro lado, a maior parte dos procedimentos eletivos, considerados não urgentes, ainda está suspensa no município e sem data para ser retomada. Nesse sentido, o principal desafio que se coloca à frente de quem assumirá a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) em 2021 passa por medidas de controle da pandemia, mas que também garantam assistência em demais áreas da saúde.

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O secretário adjunto de saúde da PJF, Clorivaldo Rocha Corrêa, observa que a retomada precisará acontecer, mas pontua que a transição deverá ser feita de forma gradual e com “ponderação do risco-benefício” que trará para o paciente. “Exige uma necessidade de adequação da própria infraestrutura de saúde que existe hoje montada para esse momento novo que a gente está vivenciando. Então, se antes nós fazíamos procedimentos eletivos com certo grau de segurança, agora, a gente precisa implementar medidas ainda mais seguras para poder garantir, por exemplo, que determinado grupo de risco não tenha a contaminação pelo coronavírus como um agravo. E ainda assim terá de haver a preocupação se esse benefício vale a exposição desse paciente”, analisa.

Apesar de parte dos leitos de UTI destinados a outras doenças ter sido convertida para “pacientes Covid”, Clorivaldo afirma que houve manutenção dos leitos já disponíveis no município destinados a outros pacientes graves, mas que a demanda por determinados tipos de internação diminuiu de forma “drástica” em um primeiro momento. “Nós observamos uma queda drástica da causas de internação, por exemplo, por trauma, porque tivemos redução de acidentes de veículos. Também houve redução de esfaqueados e baleados. A demanda por internações foi menor porque as pessoas mantiveram-se mais restritas”, observa.

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Clorivaldo cita, ainda, que embora a atenção estivesse voltada para a ampliação de leitos e controle da pandemia, também continuou nesse período o trabalho na atenção primária, voltada para a prevenção de agravos, que é a assistência a pacientes com doenças crônicas, como diabéticos e hipertensos. “Além da atenção terciária, a saúde estava lá na atenção primária controlando, por exemplo, diabéticos, para não deixar descompensar, de forma que isso deixasse o paciente mais vulnerável ao coronavírus. (Mas) será preciso repensar o controle ainda mais rigoroso desses agravos e das doenças crônicas à medida que a pandemia avançar.”

Para especialistas, será preciso adaptar unidades para manter assistência a pacientes com doenças crônicas e, ao mesmo tempo, evitar contágio pelo coronavírus
Foto: Fernando Priamo

Necessidade de adaptação para prevenção ao coronavírus

A assistência a pacientes com outras enfermidades em meio às demandas geradas pela Covid-19 também é, na avaliação do infectologista e chefe do setor de Gestão da Qualidade e Vigilância em Saúde do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (HU/UFJF), Rodrigo Daniel de Souza, o principal desafio da saúde pública no próximo ano. O médico considera que, hoje, “o maior gargalo no sistema (de saúde) são os pacientes não Covid-19”. “Em algum momento será necessário voltar a atender as doenças que já demandavam um sistema de saúde já estrangulado. Nós tivemos aumento de leitos de UTI, mas poucos destinados a ‘pacientes não Covid’. Pacientes com doenças crônicas, por exemplo, precisam voltar a ser atendidos, porque podem precisar de internação, por exemplo. E isso deverá ser muito bem estruturado, porque os hospitais tenderão a ficar mais cheios”.

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Nesse sentido, o médico pondera a necessidade de uma mudança na estrutura dos atendimentos. “Será preciso voltar a atender, a fazer consultas, mas sem aglomeração. E isso será um grande desafio. Precisará dimensionar sala de espera e não repetir o que era feito antes. Será preciso uma rediscussão muito grande de todo o sistema de saúde e de atendimento. A prioridade ainda é o atendimento à Covid-19, mas não podemos ficar de braços cruzados, esperando outros pacientes adoecerem”, avalia.

Monitoramento epidemiológico e manutenção da infraestrutura

Por outro lado, controlar uma possível nova onda de Covid-19 também será um desafio da nova gestão, já que, além de não ser um doença completamente conhecida pela comunidade científica, ainda não há uma forma de tratamento eficaz. Para o secretário adjunto de Saúde, Clorivaldo Corrêa, o monitoramento de dados epidemiológicos e o acompanhamento técnico serão as principais balizas para o controle da pandemia.

“Nós estamos vivenciando uma situação inusitada. Precisamos entender a dificuldade de lidar com a patologia. Isso trouxe insegurança para o mundo inteiro no que diz respeito às ações que seriam efetivas no combate à pandemia. Portanto, esse acompanhamento é um processo que ainda não cessou e que não termina com o fim da atual gestão. É um processo dinâmico, que exige acompanhamento diário, continuidade das medidas de prevenção e gestão da rede de saúde. A gente continua na contratualização de novos leitos para serem garantidores de assistência, porque não sabemos como a pandemia vai evoluir.”

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Clorivaldo lembra que nos primeiros meses da pandemia foi necessária a implementação de diferentes medidas restritivas para que o sistema tivesse tempo de ser estruturado, o que considera o fator fundamental para que o sistema de saúde do município não entrasse em colapso nos últimos meses. Ainda na avaliação do secretário, esse foi um ganho que irá perpassar as gestões. “De certa forma, a pandemia trouxe um ganho pra dentro da saúde, a infraestrutura de atendimento foi ampliada e melhorada. Tivemos ampliação do número de respiradores, do número de leitos de UTI e de monitores. Convênios foram firmados. A Universidade Federal de Juiz de Fora passou a ser credenciada pela Fundação Ezequiel Dias (laboratório central em Minas Gerais), e isso é um ganho para o município e para a microrregião de Juiz de Fora, porque aumenta a resolutividade (diagnósticos de casos de Covid-19). Houve fortalecimento e maior robustez do serviço de saúde, e isso é muito importante, porque não sabemos como será o comportamento da patologia”, pontua.

Medidas de prevenção e isolamento continuarão sendo necessárias

A pandemia impôs à população a adoção de medidas comportamentais para evitar a propagação do vírus. Além do uso de máscaras, a higienização constante das mãos e, principalmente, o isolamento e o distanciamento social foram colocados como fundamentais para a prevenção da Covid-19 pelas autoridades de saúde. Com o correr dos meses, no entanto, tem ocorrido afrouxamento desses novos hábitos. Todavia, conforme destaca Clorivaldo Corrêa, além do trabalho feito pelo poder público, é essencial que as pessoas mantenham “o máximo que puderem tais ações, porque a pandemia ainda está aí. O isolamento social e as demais medidas de prevenção ainda são muito necessárias, e deverão continuar acontecendo por um período”, sinaliza. Desta forma, na próxima gestão, é necessário que a Administração municipal privilegie essas medidas.

Para o infectologista Rodrigo Daniel, as pessoas estão cada vez mais “relaxadas e banalizado as regras”. Contudo, o médico alerta que é preciso que a população aja com cautela, continue evitando aglomerações e, em caso de ir às ruas, que tome os cuidados possíveis. “É muito difícil estipular se teremos um controle da pandemia no próximo ano. Isso não depende somente do ente público. É preciso que a população também faça sua parte. Teremos de monitorar e analisar muito bem como o cenário vai se comportar daqui para frente para saber se teremos ou não de retroceder na flexibilização das regras. Essa decisão vai depender muito do suporte (de saúde) que o ente público vai ter”, comenta.

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