O Governo federal editou, em julho último, a medida provisória (MP) que cria o Programa de Enfrentamento à Fila da Previdência Social (Pefps). O objetivo é diminuir as filas do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), conferindo aos servidores e peritos médicos que aderirem ao programa um pagamento bônus de R$ 68 e R$ 75, respectivamente, por processo concluído. Segundo o Instituto, a retomada do bônus de produtividade corresponderá ao investimento de R$ 129 milhões, montante já previsto dentro do Orçamento do Governo deste ano. Minas Gerais é o estado com a segunda maior fila de espera no país.
O Pefps, que, a princípio, terá nove meses de duração, se concentrará em processos que estão aguardando o benefício há mais de 45 dias ou cujo prazo judicial já tenha passado, além de perícias atrasadas por mais de 30 dias. As avaliações irão contar como atividade extra para os servidores, sendo somadas à carga de trabalho operacional diária.
Atualmente, de acordo com o Portal da Transparência Previdenciária, atualizado com dados até junho deste ano, quase 1,8 milhão de pessoas estão à espera de análise em suas solicitações de benefício e perícia médica. Em Minas Gerais, também até junho, as solicitações chegam a 160.744, tornando o estado o segundo maior com estoque de demanda represada, atrás apenas de São Paulo, que acumula pouco mais de 200 mil. A Tribuna requisitou ao INSS dados de Juiz de Fora, contudo, foi esclarecido que a mensura da fila agora é feita somente a nível estadual e nacional.
‘Situação caótica’
A extensa fila de espera do INSS é um problema que os últimos governos vêm enfrentando. Na avaliação de Viviane Perez, diretora da Federação Nacional de Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (Fenasps), o Programa de Enfrentamento à Fila da Previdência Social da gestão atual funciona como uma ação paliativa, mesma lógica dos governos anteriores, de Temer e Bolsonaro. “A política de bônus não solucionou o problema, como demonstram os números de pessoas aguardando resolução na fila durante todos esses anos. É importante que o governo considere que o INSS é a maior política pública do Brasil de redistribuição de renda, além de ser necessário tratar a questão do ponto de vista do diagnóstico e da mudança estrutural”, defende.
Para um servidor do INSS, que pediu para ter sua identidade preservada, a bonificação não traz efetividade na resolução dos problemas, que são históricos e muito mais profundos. “O INSS chegou a essa situação caótica devido ao abandono que a autarquia e o serviço público sofreram de 2016 a 2022 com falta de investimentos em infraestrutura, não realização de concursos e desvalorização financeira dos servidores. O INSS perdeu metade dos servidores nesse período devido a exonerações e aposentadorias sem reposição da força de trabalho. Enquanto isso, a demanda de segurados procurando o INSS só aumentou”, destaca.
Problemas estruturais no INSS são muitos, diz sindicalista
Cleuza Faustino, também integrante da diretoria da Fenasps, ressalta que um dos erros de gestão que atravancam o INSS de realizar sua missão institucional, prestando atendimento de qualidade aos segurados que contribuem com o sistema previdenciário, é a automatização do serviço. Ou seja, para a Federação, o que houve na prática foi o desmantelamento do atendimento presencial nas agências da Previdência, priorizando massivamente a modalidade virtual, por exemplo, com o aplicativo Meu INSS e o call center 135. “A lógica de todos os requerimentos do INSS serem através dos canais remotos, com uma população que não tem facilidade de acesso a tais canais, tem gerado alto índice de indeferimento. As pessoas não têm informação suficiente”, argumenta.
A política de bônus também faz ecoar o debate acerca da sobrecarga e o adoecimento da classe de servidores. Como enfatiza Viviane Perez, “implementar metas abusivas de produtividade, intensificar a jornada dos servidores e institucionalizar o assédio moral impacta diretamente na qualidade do trabalho, e muitos servidores acabam integrando a política de bônus por estarem diante de um cenário de perdas salariais”.
Para o servidor do INSS ouvido pela reportagem, o programa pode acarretar danos à saúde dos trabalhadores que a ele aderirem, uma vez que, para receber o bônus, é preciso trabalhar até aos finais de semana. “O instituto tem uma elevada quantidade de servidores afastados por motivos médicos. De imediato, o programa pode gerar interesse para muitos colegas devido a questões financeiras, mas em médio e longo prazo, a saúde pode, sim, ser prejudicada”, comenta.
A Fenasps, em comunicado oficial, atestou a entrega de dossiê ao atual ministro da previdência, Carlos Lupi, descrevendo as principais falhas e reivindicando melhorias no sistema da previdência. Dentre elas, estão a valorização da carreira, o atendimento presencial e a volta de concurso público. “Na minha opinião, o que vai resolver o problema da fila é a contratação de servidores através de concursos, reabertura das agências para atendimento aos segurados, que hoje são empurrados para requerer serviços pela via digital. Precisamos de mais servidores, infraestrutura e de agências abertas para atender ao povo”, complementa, de acordo, o servidor do INSS.