Comprar produtos ou negociar serviços sem sair de casa tem sido cada vez mais a escolha de muitos juiz-foranos, mas a comodidade também pode causar dores de cabeça, – e daquelas. Só no primeiro semestre deste ano, a Agência de Proteção e Defesa do Consumidor de Juiz de Fora (Procon-JF) registrou 3.506 reclamações relacionadas a compras ou negociações on-line. O número é 18,4% maior do que as 2.960 queixas feitas no mesmo período de 2023. O índice é preocupante, já que, se levarmos em conta todo o ano passado, os problemas enfrentados por clientes digitais já haviam quase triplicado em comparação a 2022, saltando de 2.184 para 6.322 casos.
De janeiro a junho deste ano, os segmentos mais denunciados ao Procon-JF foram: bancos e financeiras; operadoras de telecomunicações; viagens, turismo e hospedagens. Os assuntos mais reclamados estão relacionados a cartões (de crédito, débito ou de loja); vestuário e outros artigos de uso pessoal; e pacotes de agências de turismo. Já as questões mais recorrentes enfrentadas pelos consumidores são referentes, principalmente, a ofertas não cumpridas, vendas e publicidades enganosas; retenções de valores e reembolsos; não entrega ou demora no recebimento do produto.
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As estatísticas, no entanto, podem ser bem maiores, já que muitos adeptos do e-commerce não chegam a denunciar as experiências malsucedidas ao Procon. É o caso de um designer gráfico, de 39 anos, ouvido pela Tribuna. Ele já estava acostumado a comprar em uma plataforma de comércio eletrônico conceituada, voltada para pessoas e empresas que desejam não só comprar, mas também anunciar itens e vender pela internet. Mas, há cerca de dois meses, a investida no mesmo site para aquisição de um tênis foi frustrada.
“Eu sempre comprava, até assinava o plano deles e tal”, conta o profissional, que preferiu preservar sua identidade. “Eu estava (no perfil) de um vendedor confiável, mas de click em click vi o link de uma promoção e pensei: ‘Como é nessa cor feia e só para malhar, deve ser isso mesmo”. O preço atraente, de R$ 150, ainda caiu para R$ 120 com um cupom. “Chegando aqui, o tênis era obviamente falso. O material era ‘vagabundo’, e a tinta estava descolando.” O designer gráfico chegou a reclamar e pediu para devolver o produto em troca de reembolso. No entanto, foi “engolido” pelo próprio período estipulado para a transação e ficou no prejuízo. “O prazo era uma semana e não tive tempo.”
Depois de esfriar a cabeça, o cliente percebeu toda a dinâmica do golpe: “(Não devolver o produto e ficar no prejuízo) é justamente o que eles esperam que você faça, por ser um valor relativamente baixo.” A saída encontrada por ele para contornar a situação foi denunciar a qualidade do calçado no próprio site, mas os fraudadores foram mais rápidos. “Na hora de avaliar, eu queria falar mal do tênis, mas eles já tinham passado o anúncio e criado outro quase idêntico para ‘zerar’ a reputação deles.” Ele afirma continuar tomando os mesmo cuidados que já tinha, como checar a confiabilidade do site e do vendedor, ou verificar se a loja é a oficial da marca. “Esse foi só um caso de compra no impulso mesmo”, admite.
A coordenadora de comunicação Beatriz Inhudes, 47 anos, também não chegou a levar ao Procon as duas vezes em que foi vítima na internet. Na primeira delas, em 2019, ela não recebeu um aparelho de depilação, que havia custado em torno de R$ 160. “Falaram que iriam enviar, mas não recebi. A única coisa que fiz foi colocar no (site) Reclame Aqui. Até tive resposta da empresa, que ficou de enviar o produto, mas nunca chegou. Passou o tempo, e eu desisti.”
Quase cinco anos depois, em dezembro de 2023, Beatriz ficou na expectativa de uma sandália adquirida em outra loja on-line, por cerca de R$ 200. Ela novamente obteve resposta pelo Reclame Aqui e, por meio do acompanhamento da compra, viu que o produto teria sido postado, mas o mesmo nunca chegou. “O tempo vai passando, e a gente desiste. Mas fico indignada, porque isso é perverso e até criminoso.” Diante das vivências de má-fé, ficou como aprendizado, segundo ela, sempre pesquisar as empresas vendedoras antes do click final.
Região Sudeste soma quase R$ 800 milhões em fraudes
No primeiro semestre de 2024, a Região Sudeste do país registrou 672.300 tentativas de fraudes no comércio on-line, totalizando R$ 764,7 milhões em pedidos fraudulentos, com tíquete médio de R$ 1.129. O levantamento é da ClearSale, empresa referência em inteligência de dados e soluções antifraude em diversos segmentos. Ainda segundo o Mapa da Fraude, foram mais de 42,8 milhões de compras on-line nessa área do Brasil, as quais movimentaram R$ 22,4 bilhões, o maior valor do Brasil nessa modalidade.
Minas Gerais registrou 1,5% de tentativas de fraude no volume de transações de janeiro a junho, representando 7,7 milhões de pedidos e valor médio de R$ 1.189. O estado que liderou o ranking foi o Rio de Janeiro, com uma taxa de 2,1% de rejeição, correspondendo a 7,7 milhões de compras e pagamento em torno de R$ 1.371. O Espírito Santo ficou em segundo lugar (1,7%), com 1,2 milhão de solicitações frustradas, girando ao redor de R$ 1.337 cada. Já São Paulo, teve a menor porcentagem de problemas (1,4%), mas o volume de aquisições fraudadas é de 26,2 milhões, com preço aproximado de R$ 1.027.
“Na região Sudeste, Invasão de Cadastro (Account Takeover) é o modus operandi com maior tendência na aplicação de fraudes, principalmente nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais”, destaca o estudo. “Este modus operandi acontece por meio de fraudadores que possuem acesso sem autorização às credenciais de clientes legítimos em lojas virtuais. É preciso ficar atento também às fraudes com cadastros novos e fraudes logísticas, que também têm recorrência relevante na região.”
Celular lidera a lista das categorias mais fraudadas
O celular está no topo da lista da ação de fraudadores on-line, conforme do Mapa da Fraude 2023 elaborado pela ClearSale. Naquele ano, houve 228 mil tentativas de golpe com a venda de aparelhos no país, com valor médio de R$ 2.872. Serviços de telecomunicação seguem logo atrás, com mais de 221 mil ações denunciadas, e preço em torno de R$ 276. Em terceiro lugar das categorias mais fraudadas está o setor de beleza, com mais de 208 mil possíveis fraudes, de R$ 408 em média. Na sequência aparecem tênis, utilidade doméstica, esporte, móveis, TV/monitor, geladeira/freezer e games.
O Mapa da Fraude também revela que as pessoas com idade acima de 51 anos têm seus dados mais utilizados nas tentativas de golpes no mundo virtual. No entanto, proporcionalmente, a faixa de até 25 anos é a mais afetada pelos fraudadores, com 1,9% de tentativas de fraude em relação a 35 milhões de pedidos, contra 1,8% na faixa anterior, no universo de 88 milhões de compras em 2023.
Entre as principais dicas para evitar fraudes está a verificação da autenticidade de sites e e-mails. “Antes de fornecer informações sensíveis em formulários de sites ou em resposta a e-mails, por exemplo, é necessário garantir que eles sejam verdadeiros. Com os fraudadores evoluindo, as formas de aplicar golpes, é preciso ter cuidado redobrado para não correr risco de ter dados vazados”, recomenda a ClearSale.