Ícone do site Tribuna de Minas

Código de Defesa do Consumidor Negro lista práticas para transformar as relações de consumo

Foto Freepik
PUBLICIDADE

No mês passado, o Grupo L’Oréal no Brasil e o MOVER (Movimento pela Equidade Racial) lançaram, em parceria, o Código de Defesa e Inclusão do Consumidor Negro. O documento traz um conjunto de normas para guiar estabelecimentos comerciais, funcionários e consumidores do país a desenvolverem uma perspectiva afrocentrada sobre as relações que os envolvem. “Uma obra sem efeito jurídico, mas com efeito moral”, declara como propósito.

Em cada capítulo, os textos do código apresentam condutas problemáticas que ocorrem no dia a dia do comércio brasileiro, que são complementadas com dados da pesquisa “Racismo no Varejo de Beleza de Luxo”, realizada em agosto de 2024, e com relatos de situações vivenciadas por consumidores negros. Com base no conjunto, uma norma é proposta.

“É um olhar julgador, parece que está te vigiando mesmo. Fica atrás de você, se você vira no corredor, ele vira junto”, conta um dos entrevistados sobre uma experiência em uma loja. 

PUBLICIDADE

Nesta primeira contextualização são revelados como olhares e falas podem vir acompanhados de violências silenciosas, fazendo com que pessoas negras sintam-se julgadas e inferiorizadas. Para romper com estes comportamentos, a orientação é que os estabelecimentos capacitem seus funcionários por meio de letramentos raciais e treinamentos para erradicar práticas racistas, sejam estas verbais ou não verbais.

Dentre as outras propostas, estão a orientação a vendedores e atendentes quanto ao pronto atendimento às pessoas negras, a cautela e o respeito na abordagem, a implementação de medidas inclusivas para contratação de funcionários negros, a garantia de representatividade deste público na publicidade e a manutenção do estoque de produtos que atendem às características específicas destes consumidores.

“Racismo à brasileira” na hora de ir às compras

Segundo Julvan Moreira, professor da Faculdade de Educação e ex-diretor de Ações Afirmativas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), no país há o chamado “racismo à brasileira”, que é dissimulado, minimizado, negado e disfarçado, diz. Como consequência, mesmo as vítimas podem não perceber que algumas ações violentas sofridas na hora de ir às compras são frutos do racismo. “O Código tem força ética e transformadora, pois denuncia o racismo estrutural e sugere mudanças. Promove a equidade racial para consumidores negros em todos os setores, garantindo dignidade”, afirma.

PUBLICIDADE

O professor também destaca que iniciativas como esta, voltadas para o ambiente de trabalho, podem trazer impactos para a educação brasileira, ao exigir que os cidadãos sejam educados para uma sociedade de respeito à diversidade, com políticas inclusivas para acolher a todos. “A complexidade das relações interpessoais, particularmente no ambiente de trabalho, e as questões de discriminação tornam imprescindível a necessidade da educação antirracista e do letramento racial. Vigilância contínua, educação e medidas proativas são cruciais para proteger a dignidade de todos no trabalho.”

Educação antirracista e letramento racial

De acordo com Julvan, a educação antirracista deve denunciar o racismo e as discriminações, destacando o mito da democracia racial e a invisibilidade das populações negras, como também anunciar o respeito à diversidade. “A educação serve não apenas para denunciar, mas também para anunciar, ajudando a construir essas novas consciências e posturas nas perspectivas das diversas culturas, particularmente as de matrizes africanas e indígenas”, manifesta.

PUBLICIDADE

Quanto ao letramento racial, o professor explica ser uma forma de responder individualmente aos conflitos raciais vividos cotidianamente e tem como propósito reeducar para uma perspectiva antirracista — como um fortalecimento. “Minha compreensão do mundo é moldada pelas referências. As pessoas negras raramente têm referências de práticas positivas ou outras possibilidades que nos inspiram. Em livros e nos meios de comunicação, o corpo negro é frequentemente retratado como destinado a ocupar um espaço subordinado. Nesse sentido, todo letramento é político e cria significado.”

Sair da versão mobile