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‘O slam aceita todas as poesias’, diz a poeta Sophia Bispo

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Sophia Bispo se tornou slammer a partir de vivências com obras sociais no Retiro (Foto: Fernando Priamo)
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Ainda que participe de slams há apenas dois anos, Sophia Bispo começou a escrever bem cedo, lembra, como se os 15 anos já fossem tarde. “Até a minha mãe me lembrou outro dia que já escrevia mensagens de Dia dos Pais, das Mães, para ler no final das missas.” Mas ela percebeu que escrevia poesia mesmo em 2018. Aliás, à época, pensava que as próprias poesias não eram para slam, já que não tinham cunho de protesto. “Daí eu entendi que, na verdade, o slam aceita todas as poesias”, afirma. A prova cabal foi a vitória de Sophia no Slam da Escola Municipal Carolina de Assis, em 2019, quando ainda estava no ensino fundamental, e no III Intercolegial de Juiz de Fora, no último ano, quando já estava no Instituto Estadual de Educação – Escola Normal, onde cursa atualmente o 2º ano do ensino médio.

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O percurso de Sophia como slammer foi despertado a partir do envolvimento com iniciativas sociais no Bairro Retiro, Região Sudeste de Juiz de Fora. “Há dois anos, estava em uma aula de capoeira do ‘Gente em primeiro lugar’ (da Prefeitura de Juiz de Fora) com o professor Tirano. Ele me disse que eu tinha cara de quem escrevia. Quando falei que sim, ele me passou o contato do Antônio Carlos, um dos coordenadores da Confraria dos Poetas, que começou a me indicar para os slams.” As aulas de capoeira eram dadas na Obra Social Padre Nilton Fagundes Hauck, onde frequenta atividades culturais desde os 7 anos. “Participava do ‘Gente em primeiro lugar’, que oferece oficinas na Obra Social. Comecei fazendo break, depois hip hop, capoeira, e, recentemente, teatro. Essas coisas ajudam a saber quem eu sou. A capoeira, por exemplo, é um saber ancestral. E o teatro também influenciou em como eu performo e declamo poesias.”

A Obra Social Padre Nilton Fagundes Hauck, mantida pela Congregação Redentorista, da Igreja Nossa Senhora Aparecida – “onde praticamente nasci” –, ajuda a comunidade do Retiro como um todo e os adolescentes a criarem um senso de comunidade, explica Sophia. “Além de oferecer atividades culturais, a Obra oferece refeições para a população com fome, incentiva a empatia e a troca de saberes. Sou filha única, então as minhas melhores amigas vêm daqui.” Tanto a Obra quanto a Igreja têm papel fundamental na formação de Sophia. “Influenciam até o bairro em si”, pontua. “Porque todo mundo aqui vai nas festas da Igreja e na Obra Social para ajudar no acolhimento das crianças, por exemplo. Não é um bairro tão pequeno, mas também não é tão grande. Eu conheço bastante gente aqui e cada um tem uma história para nos contar.”

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A família de Sophia mora no Retiro desde a década de 1970. Quem a levou para o primeiro slam, o Batalha da Ágora, no Francisco Bernardino, que seria de duplas, mas não deu certo, foi a mãe, Deise Silva. Tanto Deise quanto André Bispo, o pai, a apoiam muito na arte, detalha. “No meu primeiro slam, a minha mãe estava passando mal, mas não deixou de ir. E o meu pai sempre me apoia. Se falo que vou apresentar algo hoje, os dois vão juntos para me assistir. Eles até apareceram em um sarau (on-line) na semana passada (risos). Têm muita vergonha, mas apareceram. Os meus pais me incentivam em tudo o que eu quero, na escola, qualquer coisa.” Inclusive, a relação de Sophia com o próprio bairro rendeu lhe rendeu, na última sexta-feira (9), o protagonismo na estreia do projeto da Funalfa “Arte na laje”, canal criado para divulgar artistas das periferias de Juiz de Fora.

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‘A gente escreve porque sente na pele’

As poesias que Sophia Bispo escreve são mais intimistas. “(São) De emoção, de saúde mental, até. Coisas bem pessoais, de certa forma. São questões minhas, mas que, de alguma maneira, um sentimento de ansiedade, de tristeza que quase todo mundo conhece.” Provocada se, mesmo assim, as poesias sobre saúde mental não teriam cunho de protesto, como sentia falta no início, Sophia concorda. “A gente vê que, querendo ou não, há bastante tabu ainda sobre saúde emocional, sobre assumir que estamos tristes. A gente percebe que todo mundo tem que se mostrar forte, invulnerável.” No entanto, nos últimos meses tem escrito poesias mais críticas, motivadas pelo cenário político atual. “A gente que é poeta escreve porque sente na pele mesmo não entendendo tanto sobre.”

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A virada, diz Sophia, foi a falta de empatia em meio à pandemia de Covid-19. Ela, inclusive, perdeu uma tia em junho de 2020, além de ter familiares que se contaminaram. “Desde o começo da pandemia, já sabia que seria difícil passar por essa pandemia por causa do governador e do presidente que a gente tem”, critica. “Mesmo assim, a gente fica abismado com tamanha falta de responsabilidade e amor ao próximo. Acompanhar pela TV, muita gente falando que a pandemia não existia, que era gripezinha…” Sophia ainda cita o assassinato de George Floyd, em maio de 2020, nos Estados Unidos, racismo que não acontece apenas lá, mas por aqui também, aponta.

A pandemia restringiu a participação de Sophia a apenas três eventos presenciais justamente no segundo ano enquanto poeta slammer. “Apesar de ter participado de apenas três, já consigo perceber que há muita diferença nos slams que fazemos virtualmente.” Neste ano, ela participou dos slams Fixe, Uai!, do Só para Elas e Ativista, todos virtuais, além dos mensais que a Confraria dos Poetas promove. “Em todos os slams, temos gritos para puxar a poesia, por exemplo, para que o poeta se sinta acolhido e menos ansioso. Todo mundo fala, aplaude, frita. Nos virtuais, apenas o slam master e o poeta estão ali falando. Tenho muitas saudades. A experiência é muito enriquecedora, até para a autoestima da pessoa.”

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