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‘Comida boa é a que faz o bem’

o chef paranaense ajudou a preparar menus com as sobras de ingredientes das olimpiadas servidos nos moldes dos grandes restaurantes a populacao vulneravel angelo dalbodivulgacao

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O chef paranaense ajudou a preparar menus com as sobras de ingredientes das Olimpíadas, servidos nos moldes dos grandes restaurantes à população vulnerável (Angelo Dalbo/divulgação)
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O chef paranaense ajudou a preparar menus com as sobras de ingredientes das Olimpíadas, servidos nos moldes dos grandes restaurantes à população vulnerável (Angelo Dalbo/divulgação)

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Num cantinho da Lapa que costumava acumular carrinhos de ambulantes, na rua homônima ao bairro, nomes da mais alta gastronomia do Brasil e do mundo circularam nos últimos dias. Entre eles, o chef paranaense Mateus Abdo, radicado em Juiz de Fora, foi um dos que preparou menus pensados e executados com as sobras dos alimentos dos eventos oficiais olímpicos e paralímpicos, e servidos nos moldes dos grandes restaurantes mundiais à população vulnerável. “É incrível ver o resultado do projeto. O cara às vezes chega descalço, com uma sacolinha, e vai comer a comida do melhor chef do mundo, preparada com todo carinho, com técnicas de mise em place e empratamento, em copo de cristal e prato de porcelana. Muito além de uma iniciativa que alimenta, o Reffetorio Gastronomia também trabalha a sustentabilidade com o reaproveitamento dos alimentos e eleva a autoestima de quem vive oprimido”, opina Mateus, que também viu no projeto uma rara oportunidade de crescimento profissional. “Na prática, reunir os melhores chefs do mundo inteiro em um curto espaço de tempo é praticamente impossível. A absorção de conteúdo e técnicas e a experiência de ver as equipes trabalhando e o resultado disso proporcionaram um momento profissional mágico.”

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O projeto é uma parceria do chef italiano Massimo Bottura, à frente do atual melhor restaurante do mundo, a Osteria Francescana, com o brasileiro David Hertz, criador da Gastromotiva, que desde 2006 vem capacitando profissionais e promovendo outras formas de emancipação social por meio da gastronomia. O projeto é velho conhecido de Mateus, que já atuou como voluntário, cozinheiro e professor. “O David Hertz me deu aula na Anhembi Marumbi e quando ele quis começar o trabalho, treinando as pessoas em casa e de graça, topei de cara. Na profissão, tive oportunidade de trabalhar com grandes chefs, em lugares diferentes, trabalhar junto à elite e ao público humilde. Este projeto me possibilitou ajudar as pessoas por meio de minha formação, capacitando profissionais e mudando a realidade de vida das pessoas.”

Cozinha do Brasil e do mundo

Alex Atala, cuja gastronomia é celebrada no mundo inteiro, também remonta ao início da carreira de Mateus, que estagiou e trabalhou nos restaurantes do renomado chef brasileiro, chegando a ser chefe da produção de seus restaurantes, D.O.M. e Dalva e Dito. Segundo Mateus, uma das maiores influências em sua cozinha autoral é Laurent Suaudeau, chef francês radicado no Brasil, que comandou restaurantes estrelados e fundou a Escola das Artes Culinárias Laurent, hoje referência no ensino técnico de gastronomia. “Viajei pelo Brasil todo trabalhando com o Laureant, não tinha como não ter sua herança. Uso métodos de cocção e bases francesas, mas gosto muito de produtos locais, orgânicos: a erva cultivada por uma senhorinha, o porquinho de um pecuarista local… Acho que minha cozinha seria algo como “franco-brasileira-de-raiz”, reflete o chef, que teve um bistrô na charmosa Ibitipoca até o início do ano passado, fechado quando a filha nasceu e as viagens de Juiz de Fora para o vilarejo foram ficando inviáveis.

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Mateus destaca que é preciso repensar a onda gourmet e a febre de produtos culturais gastronômicos, devido aos impactos a longo prazo. “Acho ótimo que as pessoas estejam interessadas, discutindo e se informando sobre gastronomia. Mas isso levou a um boom, por exemplo, de cursos de gastronomia, o que, novamente, é bom também. Mas muitos destes alunos seguem o fluxo do modismo e se recusam, quando chegam a uma cozinha, a lavar louça. O cara se forma em gastronomia, arruma um investidor ou ele mesmo tem a grana e acha que gastronomia é simples. Tem que lavar louça, tem que ralar, tem que conhecer cada parte do processo para saber gerir uma cozinha.”

Para o chef, gastronomia de qualidade é um conceito relativo, já que a atividade está intimamente ligada ao relacionamento com pessoas. “Temos algumas técnicas a seguir. É preciso, por exemplo saber fazer um bom risoto al dente, mas se o cliente prefere o arroz mais mole, personalizar o prato não é ferir a técnica. Comida boa é a que faz o bem: a quem come, a quem trabalha, ao meio ambiente e à humanidade. Não adianta criar um prato molecular lindo, cheio de técnicas aperfeiçoadas, moderno, e o cliente não gostar disso. Ou gostar e ir depois comer um cachorro-quente na esquina porque ficou com fome.”

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