O Programa Cultural Murilo Mendes terá cinco editais de fomento à produção artística de Juiz de Fora. A informação foi confirmada nesta quinta-feira (5), em coletiva de imprensa, pela diretora-geral da Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage (Funalfa), Giane Elisa Sales de Almeida, e pela supervisora do Programa Murilo Mendes, Fernanda Amaral. Os editais estão previstos para serem lançados entre este mês de agosto e outubro. Serão R$ 2.040.000 para a cultura, o maior valor já investido pelo Município de Juiz de Fora desde a criação do mecanismo de incentivo, há 26 anos. Em 2019, o montante investido havia sido de R$ 1,5 milhão.
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Tanto a distribuição dos recursos em mais de um edital como o montante já haviam sido confirmados à Tribuna por Giane. A reestruturação, explica a diretora-geral da Funalfa, visa estender a promoção das ações de políticas afirmativas também à cultura. “A gente cumpre o programa de governo da prefeita Margarida Salomão (PT) anunciando tanto a expansão dos recursos para a cultura quanto a potencialização dos diversos territórios de Juiz de Fora e da imensa diversidade de fazedoras e fazedores culturais da cidade.” Giane ainda relembra o percentual mínimo de 5% de participação de pessoas idosas em projetos culturais e artísticos do Programa Murilo Mendes recentemente estabelecido por meio da Lei 14.202/2021.
O primeiro edital deste ano será publicado nesta sexta-feira, meia-noite, no Diário Oficial Eletrônico do Município. Anunciado ainda em abril, o “Cultura da/na quebrada” destinará R$ 200 mil aos fazedores de cultura de Juiz de Fora. “A gente trabalha com o conceito de periferia pensando em uma vivência que é coletiva e comum a determinadas pessoas que estão em determinados territórios. Estamos nos embasando nos territórios socioassistenciais utilizados pela Secretaria de Assistência Social. Estamos considerando periferias territórios de alta e regular vulnerabilidade.”
Exigências a proponentes do Programa Murilo Mendes acentuadas pela Lei Aldir Blanc, como, por exemplo, a exigência de certidões negativas de débito e comprovantes de residência, continuarão. As contrapartidas, segundo Giane, são impostas justamente para a execução dos recursos. “Tentamos alguns diálogos com a Secretaria da Fazenda no sentido de ver como a gente poderia facilitar a questão da burocracia dos editais. Infelizmente, a gente não tem como abrir mão por conta daquilo que está previsto para a execução de recursos no Poder Público.”
Atendimento
A supervisora Fernanda Amaral pontua que, além de buscas de campo para esclarecer eventuais dúvidas por meio do Departamento de Cultura e Território, a Secretaria de Desenvolvimento Sustentável e Inclusivo atenderá os interessados para auxiliá-los nas inscrições. A Funalfa ainda fará um tira-dúvidas por WhatsApp através do número (32) 98447-0403, de segunda a sexta-feira, das 9h ao meio-dia e das 14h às 18h. “Não existe legislação brasileira que abarque as questões culturais. Muitas vezes, a gente tenta fazer muita coisa, mas esbarramos e ficamos impedidos por causa da legislação federal, que exige, por exemplo, as certidões”, pondera Fernanda.
Uso do nome social
As inscrições do “Cultura da/na quebrada” serão abertas já nesta sexta. Aquelas presenciais serão feitas até 20 de agosto. Já as on-line, até às 23h59 de 22 de agosto. O edital terá características novas no âmbito do Programa Murilo Mendes. Permitirá, por exemplo, a participação de menores de 18 anos, uma das restrições suprimidas pela Funalfa à época da instituição da Comissão Municipal de Incentivo à Cultura (Comic). “O ‘Cultura da/na quebrada’ traz o protagonismo da juventude, do adolescente, que é uma inovação nos nossos editais”, afirma Fernanda. “A partir de 14 anos, já é possível ser um proponente do projeto do ‘da/na quebrada’. Obviamente, seguindo todos os trâmites legais, como o consentimento do responsável.”
Além da queda da restrição à participação de menores de idade, o edital terá a exigência de que os projetos sejam propostos por, no mínimo, três pessoas. “Não nos referimos a coletivos institucionalizados, mas a grupos formados por três pessoas. Com todo o desmonte da cultura promovido nos últimos anos com a ausência dos ‘Pontos de cultura’, que era um projeto do Governo federal, o ‘Cultura da/na quebrada’ faz uma tentativa de fomentar esses pontos de cultura nas regiões de Juiz de Fora, nos territórios, nos bairros, nas comunidades”, pontua Fernanda. O “Cultura da/na quebrada” contemplará até 20 projetos, com teto de R$ 10 mil para cada um.
Outro pré-requisito será a participação de ao menos um terço de mulheres, cis ou transgêneros, nos grupos interessados em submeter projetos no edital, assim como a possibilidade de utilizar o nome social. “Observamos que, a partir de um estudo feito nas edições anteriores da Murilo Mendes, mulheres são minoria no protagonismo e como proponentes nos editais.” A Funalfa também autorizará que os proponentes utilizem os nomes sociais. “Essas características inovadoras estarão presentes também em alguns outros editais”, coloca a supervisora do Programa Murilo Mendes.
Outros editais ainda em construção
Ao contrário do “Cultura da/na quebrada”, os demais editais anunciados pela Funalfa ainda não têm datas específicas para divulgação, uma vez que ainda são construídos pelo Executivo. Um deles é o intitulado “Murilão”, que, assim como a antiga Lei Murilo Mendes, será de ampla concorrência. O edital é o mais robusto dos cinco, já que terá R$ 1 milhão. “É aquele em que todos podem se inscrever, mais ou menos o que já acontecia nos últimos 25 anos. A gente espera conseguir divulgá-lo até a última semana de agosto”, estima Giane. Assim como o “Murilão”, o edital “Fernanda Müller de Cultura Trans” também pode ser publicado ainda em agosto. “Estamos em fase de construção, de consulta à Procuradoria-Geral do Município”, acrescenta.
O “Fernanda Müller de Cultura Trans”, assim como o “Cultura da/na quebrada”, terá R$ 200 mil. Os recursos serão destinados para a produção artística que valorize a cultura trans. “Ou a partir da própria experiência de transexualidade, travestilidade e de performance dragqueen ou dragking, ou a partir de fazedores, produtores e artistas que possam valorizar o modo como a cultura pode e deve ser produzida”, explica a diretora-geral da Funalfa. A travesti Fernanda Müller militou no Movimento Gay de Minas (MGM), bem como foi rainha da Parada Gay de Juiz de Fora e apresentadora do Miss Brasil Gay. Ela ainda foi rainha de bateria das escolas Turunas do Riachuelo e Unidos do Ladeira. Fernanda morreu em julho de 2013.
A Funalfa prevê para setembro, por sua vez, o edital “Quilombagens”, que, conforme Giane, cumpre a Semana da Consciência Negra e da Cultura Afro-brasileira em Juiz de Fora, celebrada entre 15 e 20 de novembro. “A gente traz um novo formato, mas pensando a quilombagem como um espaço onde as pessoas se agregam em nome da resistência e do enfrentamento ao racismo. O edital contempla tanto as pessoas negras quanto as pessoas que não são negras ou pretas que querem promover a cultura. Essa é a política do quilombo. O quilombo acolhe todo mundo”, afirma. O edital será de R$ 340 mil.
Semana de 1922
O último a ser lançado deve ser o “Pau-Brasil”, cujo valor é de R$ 300 mil. O edital está na perspectiva da Semana de Arte Moderna, cujo centenário será comemorado em fevereiro de 1922. Conforme Giane, embora seja um momento importante da História do Brasil, a Semana de Arte Moderna precisaria ser ressignificada a partir do que se entende hoje como produção artística. “Precisamos olhar para a Semana de 1922, valorizá-la e pensar o que seria hoje um manifesto artístico como o da Semana de Arte Moderna”, pontua. “A gente teve na semana passada um incêndio criminoso da Cinemateca. Então, esse incêndio e tantas outras ações dirigidas a fazedores de cultura e à cultura brasileira têm nos chamado e convocado a nos posicionar.”