A queda de usuários do sistema de transporte coletivo urbano em meio à pandemia de Covid-19, somada à revisão anual de custos fixos e variáveis, podem elevar a passagem de ônibus dos atuais R$ 3,75 para R$ 5, correspondente a acréscimo de 33%. Pelo menos este é o entendimento do Consórcio Via JF, que apresentou a estimativa nesta quarta-feira (17). Ainda de acordo com o consórcio, caso a revisão tarifária – inicialmente prevista para novembro – ocorresse este mês, o valor da tarifa poderia subir para R$ 4,20 em Juiz de Fora. Neste caso, a alta seria de 12%. Os dados têm por base acompanhamento mensal realizado pelas empresas que exploram o transporte coletivo urbano público na cidade. Os consórcios voltaram a pressionar a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) em busca de subsídio para garantir o “equilíbrio econômico-financeiro do sistema”.
O subsecretário de Mobilidade Urbana da Secretaria de Transporte e Trânsito (Settra), Themístocles Júnior, confirmou à Tribuna que uma das estimativas apresentadas pelo Consórcio Via JF é próxima àquela calculada pelo próprio Município. “Caso houvesse hoje um reajuste ou um reequilíbrio econômico contratual que elevasse a tarifa, o valor estaria, sim, bem próximo ao de R$ 4,21. (…) O modelo matemático utilizado pelos dois consórcios é o mesmo da Prefeitura, porque está previsto no contrato. Tanto que, na última revisão, em que houve uma diferença de R$ 0,19 daquilo que os consórcios apresentaram e o que a Prefeitura estabeleceu, os próprios consórcios entenderam que alguns parâmetros que utilizaram não estavam, no entendimento da Prefeitura, corretos, e, então, começaram a fazer este acompanhamento.”
Diante do cenário atípico de queda drástica de usuários devido às restrições de convívio social impostas pela pandemia de Covid-19, é possível, inclusive, que a revisão tarifária prevista para novembro seja adiantada, conforme o Consórcio Via JF. “Em condições normais, a revisão do preço da passagem aconteceria apenas em novembro. Porém, dispositivos contratuais abrem a possibilidade de antecipação da revisão por motivos de desequilíbrio no sistema ou força maior, cabendo às empresas entrarem com o requerimento junto à Prefeitura para a avaliação da situação.”
O contrato assinado entre a Prefeitura e os consórcios Manchester e Via JF em 2016 prevê que a remuneração integral da prestação de serviços do transporte coletivo urbano de Juiz de Fora ocorre por meio da cobrança das passagens. Conforme a cláusula 25ª do contrato, o reajuste tarifário anual deve considerar, em fórmula paramétrica, índices inflacionários, como o preço do litro de óleo diesel, a convenção coletiva/dissídio coletivo dos rodoviários, o índice ônibus e o índice geral de preços – os dois últimos calculados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
De acordo com Themístocles, embora as concessionárias tenham, de fato, o direito de reivindicar a antecipação da revisão tarifária, o Município não vê, neste momento, necessidade para tal. “Por força contratual, a revisão tarifária acontece anualmente em todo mês de novembro. E, quando fazemos o cálculo de qual será o novo valor caso precise de reajuste, levamos em consideração os 12 meses anteriores, ou seja, não somente os últimos meses. (…) Havendo alguma causa muito forte para que haja uma revisão, para que se faça uma análise de reequilíbrio econômico-financeiro antes deste período, isso também está previsto contratualmente. Neste momento, a Prefeitura não tem o entendimento de fazer qualquer ação neste sentido, mas, contratualmente, (a solicitação) pode ser feita a qualquer momento (pelos consórcios).”
Entretanto, como admite ainda o subsecretário de Mobilidade Urbana, as concessionárias, diante de desequilíbrio econômico-financeiro muito alto, podem reivindicar a revisão tarifária conforme outra fórmula, esta oriunda de planilha de apropriação de custos anexada no edital licitatório, como no último ano. “Conforme o contrato, por dois anos seguidos, utilizamos a chamada forma paramétrica, que faz uma correção da inflação no período. Depois de dois anos seguidos da fórmula paramétrica, utilizamos a planilha de apropriação de custos, que já leva em consideração mais itens.”
Caso esta revisão seja pleiteada pelas concessionárias, Themístocles afirma que caberá à Prefeitura analisar se atende ou não o pedido. “A reivindicação pode ser feita pelos consórcios a qualquer momento, mesmo que esteja previsto o reajuste conforme a fórmula paramétrica para novembro. Cabe à Prefeitura, ao poder concedente, através da Settra, avaliar se o requerimento traz motivação que leva a Settra a ter este entendimento, aceitar e fazer o cálculo pela planilha de apropriação.” Até o momento, confirma o subsecretário, nenhuma reivindicação oficial foi protocolada pelas concessionárias.
PJF estima queda de até 70% na demanda
O Consórcio Via JF ressalta ainda que, mesmo com a adesão do Município ao programa Minas Consciente, e, consequentemente, a flexibilização de funcionamento de determinados segmentos, “não houve aumento significativo no número de passageiros diários que consiga suprir as demandas financeiras do transporte público”. Conforme Themístocles, atualmente, a queda de usuários do transporte coletivo urbano de Juiz de Fora está entre 65% e 70% em relação ao quantitativo de 340 mil passageiros, por dias úteis, do transporte público antes da implementação de medidas restritivas ao convívio social, editadas pelo prefeito Antônio Almas (PSDB) em 16 de março.
“Em um primeiro momento, tivemos uma queda abrupta em torno de 70%. Tínhamos em torno de 340 mil usuários nos dias úteis e esta demanda diária caiu para algo em torno de 98 mil usuários. Hoje, a demanda está em torno de 120 mil usuários, oscilando um pouco mais, um pouco menos. A demanda atual está em torno de 30%, 35% da verificada antes do início da pandemia da Covid-19. Entretanto, para supri-la (…), estamos fazendo uma oferta de ônibus e linhas que está em torno de 50%, às vezes 55%, isto é, não é proporcional. Estamos oferecendo mais do que a demanda justamente para tentar respeitar, ao máximo, as condições exigidas pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para manter, dentro do possível, as condições de distanciamento social dentro dos ônibus”, detalha o subsecretário de Mobilidade Urbana.
Para o Consórcio Via JF, o modelo atual de remuneração dos sistemas de transporte não é mais sustentável. “Num futuro próximo, será preciso redesenhar o sistema por completo, com uma reestruturação de linhas, formas de remuneração, modelos de veículos e novas tecnologias que contribuam para diminuir os custos e o impacto no bolso dos passageiros.”
Valor do subsídio revisto deve chegar a R$ 2 milhões
Como revelado à Tribuna pelo Executivo municipal em 4 de junho último, a Prefeitura finaliza um projeto de lei para efetivar a concessão de subsídio para financiar parte dos direitos trabalhistas dos cerca de 3.500 rodoviários. Entretanto, a PJF não tem previsão para encaminhá-lo à Câmara Municipal, uma vez que ainda está sob análise jurídica da Procuradoria-Geral do Município, conforme a Settra. O diretor do Consórcio Via JF, Rafael Santana, ressalta que “ações do Poder Público, com o objetivo de subsidiarem o sistema, são necessárias e urgentes para assegurar a continuidade do fornecimento do serviço para a população e a manutenção da mobilidade urbana a preços mais baixos”.
De acordo com Themístocles, no entanto, depois de revisão da Secretaria de Fazenda, o subsídio, antes estimado em R$ 3 milhões, cairá para algo em torno de R$ 2 milhões, valor disponível pelo Município no Fundo de Transporte e Trânsito. “Hoje, a Settra, através do Fundo Municipal de Transporte, não consegue tirar uma parte, juridicamente amparada, no valor de R$ 3 milhões, mas de R$ 2 milhões. Houve uma correção neste valor. Caso o projeto de lei seja aprovado, R$ 2 milhões sairiam do Fundo Municipal de Transporte, que é o único valor, hoje, disponível. E, uma vez podendo ser utilizado com a aprovação da lei, iria diretamente para a complementação da folha de pagamento, ou seja, não pode ser utilizado para combustível, outros insumos, mais nada.”
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O subsecretário de Mobilidade Urbana pondera que este subsídio não é dado pelo Município às concessionárias; no cálculo da revisão tarifária previsto para novembro, o montante será descontado do preço final da passagem. “Fazendo uma conta rápida, vamos dizer que o projeto de lei foi aprovado hoje, a lei sancionada e eu conseguisse repassar os R$ 2 milhões no mês de julho para as concessionárias. Vamos supor que a folha de pagamento das empresas seja de R$ 10 milhões. A Prefeitura arcou com R$ 2 milhões, e as empresas entraram com R$ 8 milhões. Quando fizermos o estudo da revisão tarifária e chegar no mês de julho, não vamos considerar que os empresários colocaram R$ 10 milhões no sistema, mas, sim, R$ 8 milhões. É onde, de alguma forma, eu retomo os R$ 2 milhões para a Prefeitura. De que forma eu retorno? Conseguindo que o preço da passagem, naquele momento em que foi reajustado, seja de R$ 4,15 em vez de R$ 4,20, por exemplo.”
De acordo com o Executivo, o projeto de lei é necessário para regulamentar a subvenção municipal, estadual ou federal ao sistema de transporte coletivo urbano de Juiz de Fora, uma vez que o arcabouço jurídico do Município não permite este subsídio neste momento. Além disso, o Município entende que o transporte público é “um instrumento dentro do enfrentamento direto da crise da pandemia de Covid-19, já que ele transporta mais de 90% dos usuários que estão diretamente ligados aos serviços essenciais, principalmente os funcionários que trabalham nos hospitais e outros de serviços essenciais, como restaurantes e farmácias”, conforme Themístocles.
Procurada, a Astransp, que representa o Consórcio Manchester e a Viação São Francisco Ltda (uma das integrantes do Via JF), informou que corrobora das estimativas realizadas pelo Via JF, entende que os R$ 2 milhões não são suficientes e estuda a possibilidade de pedir a antecipação da revisão tarifária.