O Brasil vivenciou uma transformação importante no mercado de trabalho nos últimos anos, refletindo tanto os avanços econômicos quanto as incertezas que ainda marcam a economia.
O setor privado, por exemplo, registrou uma participação recorde de trabalhadores informais, um fenômeno que desperta preocupações e gera discussões sobre as condições e a qualidade do emprego no país.
Aumento do trabalho informal no setor privado
De acordo com os dados do IBGE, o número de trabalhadores sem carteira assinada no setor privado alcançou a marca de 14,2 milhões até o quarto trimestre de 2024, representando 26,6% de todos os empregados do setor.
Esse índice marca um recorde histórico, sendo a maior proporção de trabalhadores informais registrada no final de um ano desde o início da série histórica, em 2012. Esse aumento, embora preocupante, reflete o crescimento econômico acelerado observado nos últimos anos.
A crescente informalidade no mercado de trabalho está diretamente relacionada ao aumento no número de vagas de emprego. No entanto, isso não significa que a situação seja estável ou sustentável a longo prazo.
Embora o Brasil tenha visto uma expansão no número de postos de trabalho, a continuidade desse cenário ainda é incerta, especialmente com a previsão de desaceleração econômica em 2025.
Papel da economia aquecida no crescimento do trabalho informal
A economia brasileira, impulsionada por um PIB que avançou 3,4% em 2024, tem se mostrado dinâmica, mas com desafios pela frente. O aquecimento da atividade econômica nos últimos anos gerou um aumento geral no número de empregos, mas também trouxe à tona uma característica importante do mercado de trabalho: a contratação de profissionais sem carteira assinada.
Empresas que experimentam crescimento optam por contratar trabalhadores informais, em parte, devido à incerteza sobre o futuro econômico e, consequentemente, sobre a necessidade de manter esses empregados a longo prazo.
Em um cenário de incertezas, onde o empregador não sabe por quanto tempo o crescimento será sustentável, a informalidade se torna uma estratégia para testar a capacidade do trabalhador sem os custos e encargos trabalhistas de uma demissão futura.
Evolução das diferenças salariais
Embora os trabalhadores com carteira assinada ainda recebam, em média, salários mais altos do que os informais, a diferença salarial entre esses dois grupos tem diminuído ao longo dos anos.
Em 2024, o rendimento médio de um trabalhador formal foi de R$ 3.065, enquanto o de um trabalhador informal ficou em R$ 2.334. Essa diferença, que era de R$ 1.134 em 2013, caiu para R$ 731 no final de 2024, refletindo uma valorização dos trabalhadores informais e o aumento da competitividade no mercado.
Esse fenômeno pode ser interpretado como um reflexo da valorização do trabalho informal em determinadas áreas, em especial em ocupações temporárias e de baixa qualificação, onde a flexibilidade do contrato informal é vista como vantajosa tanto para empregadores quanto para empregados.
Impacto da desaceleração econômica
Apesar do crescimento robusto do PIB em 2024, as projeções para 2025 indicam um cenário de desaceleração econômica, especialmente devido ao aumento das taxas de juros e ao ajuste das contas públicas.
Nesse contexto, muitos dos trabalhadores informais contratados durante o período de crescimento podem ser impactados, com a possibilidade de enfrentarem a redução de vagas ou até mesmo o desemprego, caso a economia desacelere ainda mais.
O economista Renan Pieri, especialista da Fundação Getulio Vargas (FGV), alerta para a possibilidade de uma desaceleração do mercado de trabalho, que pode afetar principalmente os informais.
Além disso, ele destaca que a flexibilidade oferecida pelo trabalho informal, como no caso dos freelancers e prestadores de serviços temporários, também é um fator que contribui para o aumento da informalidade, pois as empresas buscam melhorar custos e reduzir riscos trabalhistas.
Crescimento dos autônomos
Além dos trabalhadores informais, outra categoria que tem se expandido no Brasil é a dos autônomos, ou trabalhadores “por conta própria”. De acordo com os dados de 2024, o Brasil registrou 26 milhões de autônomos, pessoas que trabalham por conta própria, sem vínculo empregatício, mas que podem ser considerados empreendedores ou prestadores de serviços individuais.
Esse crescimento reflete uma tendência crescente de desburocratização e flexibilidade no mercado de trabalho, com muitas pessoas buscando alternativas ao emprego formal devido à falta de oportunidades ou à busca por maior autonomia e liberdade.
Implicações para a qualidade de vida e direitos trabalhistas
O aumento do trabalho informal no Brasil tem implicações significativas para a qualidade de vida dos trabalhadores e para a estrutura econômica do país.
Trabalhadores informais não têm acesso a benefícios como férias remuneradas, 13º salário, e não estão protegidos contra demissões injustificadas. Isso os coloca em uma situação de vulnerabilidade social, uma vez que estão mais expostos a crises econômicas e à instabilidade no emprego.
Além disso, a falta de vínculo formal dificulta o acesso desses trabalhadores a outros direitos trabalhistas e previdenciários, o que pode comprometer sua aposentadoria e outros benefícios no futuro.
O futuro desse cenário dependerá da capacidade do Brasil de equilibrar crescimento econômico com segurança e justiça social para todos os seus cidadãos.