O Sistema Único de Saúde (SUS) inicia uma transformação na forma como realiza o rastreamento do câncer do colo do útero. A substituição gradual do tradicional exame de Papanicolau pelo teste de DNA-HPV promete ampliar a eficácia da prevenção, antecipando em até 10 anos a detecção do vírus causador da doença.
Trata-se de um marco na saúde feminina, que alia tecnologia de ponta à política pública, oferecendo às mulheres brasileiras um cuidado mais preciso, seguro e eficiente.
Entendendo o HPV
O HPV, sigla para Papilomavírus Humano, é um vírus transmitido principalmente por contato sexual e responsável por cerca de 99% dos casos de câncer do colo do útero. Existem mais de 200 tipos de HPV identificados, sendo que pelo menos 14 são classificados como de alto risco para o desenvolvimento de câncer.
No Brasil, estima-se que aproximadamente 10 milhões de pessoas convivam com o vírus, apesar da existência de vacinas preventivas e campanhas de conscientização.
A persistência do HPV no organismo, especialmente quando se trata dos tipos oncogênicos, pode levar ao aparecimento de lesões no colo do útero, que, se não tratadas, evoluem para câncer.
O papel do Papanicolau
O exame de Papanicolau, também conhecido como citologia oncótica, foi introduzido no Brasil na década de 1980 e se consolidou como o principal método de rastreamento do câncer cervical. Seu funcionamento é baseado na coleta de células do colo do útero, que são analisadas em laboratório para identificar alterações suspeitas.
Apesar de sua relevância histórica e do impacto na redução da mortalidade por câncer do colo do útero, o Papanicolau apresenta algumas limitações importantes: sua sensibilidade é moderada, o que pode gerar falsos negativos, e ele exige repetição frequente, a cada três anos, para ser eficaz.
Além disso, a cobertura do exame ainda é insuficiente, especialmente entre mulheres de áreas remotas ou em situação de vulnerabilidade social.
O novo exame
A nova estratégia do SUS aposta no exame de DNA-HPV como principal ferramenta de rastreio. Trata-se de um teste de biologia molecular, baseado na técnica de PCR (Reação em Cadeia da Polimerase), que permite detectar o material genético do HPV nas células do colo uterino, mesmo antes que qualquer alteração visível ocorra.
Isso significa que é possível identificar a presença do vírus muito antes do surgimento das lesões precursoras do câncer. Uma das grandes vantagens desse exame é sua maior sensibilidade, que supera a do Papanicolau.
Com isso, a periodicidade recomendada para mulheres com resultado negativo pode ser estendida para cinco anos, mantendo a segurança e aumentando a adesão ao rastreamento. Além disso, por se tratar de um teste mais objetivo, ele reduz a margem de erro associada à análise subjetiva do Papanicolau.
Impactos esperados no SUS e na saúde pública
A implementação do teste de DNA-HPV no SUS trará impactos positivos tanto para as pacientes quanto para o sistema de saúde como um todo.
Em termos de custo-benefício, embora o novo exame tenha um custo unitário mais elevado, sua maior precisão e a menor necessidade de repetição tornam-no mais econômico ao longo do tempo.
Além disso, ao detectar precocemente os casos com risco real de evolução para o câncer, será possível intervir de forma mais eficaz e evitar tratamentos mais complexos. A mudança também representa um avanço na promoção da equidade, garantindo que mulheres de todas as regiões do país tenham acesso a tecnologias de ponta.
A triagem com DNA-HPV ainda deve ser acompanhada por estratégias de educação em saúde, campanhas de incentivo à vacinação e capacitação dos profissionais que atuam na atenção primária, para que a abordagem seja realmente integrada e resolutiva.
Desafios e próximos passos
A transição para o novo modelo de rastreamento exigirá um esforço coordenado entre o Ministério da Saúde, secretarias estaduais e municipais, profissionais da saúde e a população.
Será necessário investir em infraestrutura laboratorial, ampliar a rede de coleta de exames, capacitar equipes e garantir o fluxo de diagnóstico e acompanhamento dos casos positivos. Além disso, será fundamental conscientizar a população sobre a importância do novo exame, explicando que, mesmo com menor frequência, ele oferece mais segurança.
Outro desafio é a continuidade do acompanhamento para mulheres que testarem positivo para o HPV, com a realização de exames complementares e eventuais intervenções preventivas.
A mudança também representa uma oportunidade para reforçar a importância da vacinação contra o HPV entre adolescentes, uma medida fundamental para interromper a cadeia de transmissão do vírus.