Chesterton, numa de suas grandes tiradas, disse que o mundo moderno não aceita nenhum dogma que se apoie em algum tipo de autoridade, mas aceita qualquer dogma que não se funde em autoridade nenhuma. Hannah Arendt escreveu algo parecido sobre as massas que perderam a capacidade de pensar nos antigos mistérios, mas “estão plenamente dispostas a acreditar – bem, em qualquer coisa”. Isso muito antes da era do TikTok e desse “coach” que monta armários, pilota helicóptero e mata tubarões a soco.
Essa perda de referência do ser moderno vem ganhando contornos assustadores em tempos de imersão tecnológica. Nunca a conversa de botequim se tornou tão influente – só que o botequim é virtual e falta a mesa de sinuca onde eram sepultadas as bobagens ditas depois de algumas cervejas.
Hoje as bobagens são eternas e tornam-se dogmas dos ressentidos ou monetização dos espertos. Se ao menos essa vida das redes sociais fosse algo supérfluo, tudo não passaria de um lazer tolo que ocupa nosso tempo de ócio. Mas não. Já não podemos separar o real do virtual. Políticos querem agradar suas bases com lacração; decisões são tomadas sem respeitar a autoridade das leis, mas a da “fanbase”. Terry Eagleton já observava com seu humor britânico: a criatura pós-moderna é incessantemente maleável, saindo-se muito bem na discoteca ou no supermercado (e no Instagram, acrescento), embora nem tanto na escola ou no tribunal.
Precisamos, contudo, de pessoas que se saiam bem nesses ambientes onde o respeito não é substituído por curtidas. Seja um ministro de tribunal, um político ou juiz local, presidente ou ministro de Estado, todos devem cumprir sua parte no resgate de certa solenidade que, longe de ser uma homenagem aos rapapés, revela submissão a uma autoridade maior que o desejo individual.
Não se trata somente de uma postura externa de falsas reverências, mas de real respeito pelos precedentes, liturgias, leis e Constituição, sem se deixar cair no canto sedutor das ideologias que querem submeter o mundo ao conjunto de valores do egoísta – que muitas vezes não passa de um fundamentalista sem fundamentos, o tipo mais perigoso de todos. O caminho passa pela moderação e sobriedade diante de um mundo de excessos.
É desafiador querer que nós, educados para tudo desejar, saibamos de repente conter-nos. No entanto, sem essa dose de respeito e contenção, estaremos condenados a confiar nosso destino à areia movediça da pós-verdade e da vaidade, onde quem governa são os instáveis e narcisistas influenciadores do TikTok.