Na semana passada, ao comentar sobre o novo arcabouço fiscal, o atual ministro da Fazenda disse que para que o país zere seu déficit fiscal não é preciso criar novos impostos e nem mesmo aumentar alíquotas, bastando que se cobre o que já existe e que as pessoas paguem aquilo que já está previsto. Na teoria ele está correto, mas, ao analisarmos a realidade prática, não é isso que a sociedade brasileira pensa.
Talvez por entender que já se tenha uma alta carga tributária ou talvez por não enxergar nenhum retorno no pagamento de tributos, o que se vê é que as pessoas buscam ao máximo encontrar brechas na lei para diminuir o pagamento de impostos. Um exemplo que vem crescendo muito nos últimos anos é a utilização da holding patrimonial familiar.
O direito empresarial, mesmo que sem qualquer intenção, possibilitou a criação de um mecanismo para se reduzir o pagamento de tributos em caso de herança, além de diminuir também a burocracia da sucessão pos mortem.
O art. 2º, §3º da Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76) prevê que a”companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades; ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se de incentivos fiscais”, ou seja, permite que se crie uma sociedade com o único intuito de se aproveitar de benefícios fiscais, sem que ela tenha que ter de fato uma atividade empresária. Com base nesse dispositivo de lei teve-se a ideia de se criar uma pessoa jurídica apenas para que ela possa gerir o patrimônio de uma determinada pessoa física. Esta transfere seu patrimônio para a sociedade através de integralização de capital (que na maioria das vezes não é tributada) e distribui as quotas aos herdeiros, ficando com a reserva de usufruto. Pronto! A pessoa vai usufruir do patrimônio normalmente, pois será dela a distribuição de lucros da holding, enquanto viva for, e ao falecer os herdeiros passam a ter a plena propriedade das quotas. Basta agora fazer a dissolução da sociedade com a distribuição das quotas e os herdeiros partilharão o patrimônio da pessoa jurídica e não do falecido, não tendo que fazer o pagamento do Imposto de Transmissão Causa Mortis.
Há algo de ilícito nesta conduta? Não, já que se tem um dispositivo legal que permite a criação de uma sociedade apenas para fins de benefício fiscal. Então basta que se use a lei. Pode ser que em alguns anos se discuta se este mecanismo não estaria se enquadrando em uma hipótese de abuso de direito em que se usa um mecanismo lícito, mas fugindo da real intenção do legislador. Porém, esta possibilidade não está sendo levantada por hora.
E este é apenas um exemplo em que a sociedade busca mecanismos de diminuir o pagamento dos tributos. Outra prática comum, envolvendo o direito empresarial, é a criação de pessoa jurídica por parte dos prestadores de serviço para receberem seus pro labores e não terem que pagar a alta carga de imposto de pessoa física para essas situações.
O que se vê é que a sociedade brasileira demonstra um anseio que vai na contramão do que foi ventilado pelo Ministro, ou seja, se depender da vontade do povo de pagar os impostos tais quais eles já existem, dificilmente será possível aumentar a arrecadação. Talvez porque a sociedade quer ver o efetivo retorno do tributo que paga. Quem sabe dessa forma não seja possível mudar nossa cultura?