Conheça a história da artesã Iza Maria
Aos 72 anos, ela produz bijuterias com pequenas miçangas e não pensa em parar
Iza Maria, de 72 anos, exibe na mesa as peças que faz com as próprias mãos desde que era criança: são diversos colares, brincos e pulseiras feitos de pequenas miçangas, misturando técnicas, materiais e também vivências. Além dos que mostra, também conta que faz o que quer que seja com tricô e crochê, já tendo produzido bolsas, luvas e coletes para entregar em todo o Brasil. Esse trabalho artesanal foi feito ininterruptamente ao longo de sua vida e ajudou Iza a pagar sua faculdade de Letras, complementar a renda como professora de inglês e, com o passar dos anos, ser uma fonte de alegria para ela, já aposentada. Em Juiz de Fora, ela está na feira de artesãos do Parque Halfeld, às terças-feiras, e também exibe suas peças em feiras noturnas e, aos sábados, na Rua Halfeld. Também vende peças em Bichinho, cidade próxima a Tiradentes, e aceita sempre encomendas de quem entra em contato. Afirma com segurança: “Você não encontra trabalho como o meu aqui em Juiz de Fora fácil, não”. Gosta que seja assim.
Todas as peças de miçanga foram inspiradas por sua mãe, Izabel, que Iza considerava muito elegante. “Eu fazia todas as coisas pensando nela, no que ela ia usar. Quando vinha aqui na cidade, ela vinha com várias bijuterias, de salto, com conjuntinho de roupa. E comecei a fazer pra ela usar mesmo, e ela adorava”, revela. Apesar de já ter falecido há muitos anos, ela sempre ressalta a importância que a mãe, costureira, e seu pai, alfaiate, tiveram para que ela resolvesse desenvolver essa veia artística. “Eu pegava retalhos para fazer bonecas, fazia cordão para elas. Ficava doida pra chegar da escola e fazer isso”, diz. Aos 8 anos, aprendeu a fazer tricô com a sua tia e mistura essa técnica com as peças em bijuteria. Não foi só ela que pegou amor pela coisa – entre seus irmãos, há quem faça xícaras de madeira, terrários e vários outros tipos de artesanato.
Foi por volta de 18 anos que Iza passou a querer comprar materiais para produzir suas próprias peças. Logo, algo chamou sua atenção: a conta de lágrima, miçanga de tamanho grande, que trazia a possibilidade para ela fazer peças bastante diferentes. “Eu fazia e eu mesma usava, e aí minhas amigas viam e elogiavam. E aí fui me aprimorando, aprendi a mexer com alicate para montar bijuteria e nisso fui crescendo. Consegui pagar a minha faculdade de Letras no CES assim. Muitas vezes levei meu trabalho para a aula e mostrava para os colegas”, conta. Logo que se tornou professora, no entanto, percebeu que não podia abandonar esse trabalho – nada substituía o gosto que tinha por juntar cada peça e ver, depois de tanto trabalho, o resultado final. Hoje em dia, Iza confessa que há peças mais trabalhadas que ela fica até cinco dias inteiros fazendo.
Nos últimos oito anos, Iza se aposentou e buscou focar totalmente em melhorar seu trabalho artesanal. “Comecei a gostar mais das miçangas miúdas do que das maiores. Fiz um curso on-line para aprender mais coisas. Meu filho foi me ensinando a mexer na internet. Sempre tento trazer esses diferenciais, e aprender nunca é demais. Adoro artesanato, esse é o meu doce de coco”, afirma. Confessa, ainda, que sua casa é cheia de miçanga, e que na sala é possível encontrar peças em cada cantinho. Mesmo com todo o esforço, sabe que nem sempre o trabalho é valorizado, e os preços acabam mais baixos do que seria um valor justo para o empenho e o estudo que as peças demandam. Mas não desanima: “Eu tenho aprendido que eu faço com amor o que eu gosto, e as pessoas também gostam do que eu faço. Coloco meu carinho, minha alma, meu suor. E é muito bom isso”, diz.
Estudando, aprendendo, observando
Iza sabe que nunca teve as melhores condições financeiras e estruturais para aprender artesanato, mas revela que isso nunca foi impedimento para que conseguisse o que queria. Muito do que conseguiu foi através da sua própria intuição e da observação ao entorno. “Reparava em alguma peça na rua, que alguém usava e que me chamava atenção e depois tentava fazer igual”, diz. Comprou o tricô que está usando em uma feira, por exemplo, para entender como era feito e poder se inspirar. Com o uso da internet, buscar inspirações ficou mais fácil, e ela carrega consigo uma pasta cheia de referências para basear as peças. Nunca se cansa de ver vídeos, ler textos e buscar fotos que a inspirem.
A escolha por miçangas miúdas, nos últimos anos, aconteceu após um encontro com um amigo indígena, que também trabalhava em feiras de Juiz de Fora. “Ele era Pataxó, e me ensinou como fazer pulseiras com miçangas pequenininhas e, a partir disso, fui procurando na internet, buscando aprender mais”, conta. O que a alegra é que, por serem peças mais diferentes do padrão de bijuteria, acabam sendo marcantes. “Outro dia, uma mulher me viu na rua viu minhas peças e se lembrou de algo que comprou comigo há 20 anos, e que usa até hoje. Isso é um reconhecimento”, diz.
“Impossível parar”
Não foi só a sua vida que foi alterada pelo amor com o artesanato – a de todos da família também. “Quando minhas irmãs ficaram desempregadas, ensinei para elas como fazer tricô. (…) Minha mãe era a minha maior apoiadora. Ela ficava com meu menino para que eu vendesse as coisas no calçadão. Minhas irmãs todas foram trabalhar em fábrica, e quem trabalha em fábrica acaba não aprendendo a fazer o todo, eu fui ensinando”, conta. Nunca deixou essa arte de lado, mesmo em momentos difíceis, como a morte do marido. Ficou dois anos desempregada, apenas cuidando do filho pequeno. As peças não a permitiam desanimar.
Hoje, ela não pensa em parar. “A Frida que eu faço em brincos, pulseiras e colares, por exemplo, é muito legal de ver ficando pronta. Você vai colocando uma miçanguinha de cada vez, um trabalho de formiguinha. E aí as pessoas veem e ficam felizes. Como vou parar?”, questiona. A satisfação em ver essas peças que dizem tanto sobre sua história é algo que sempre a emociona. “Meu filho às vezes diz: ‘você não precisa mais fazer isso, não precisa ir pra rua ficar vendendo isso na sua idade’. Eu respondo: ‘nessa idade seu nariz’. Eu preciso, sim, porque eu sou sozinha e é isso que eu gosto de fazer. Se eu ficar trancada dentro de casa, sem fazer nada, eu vou adoecer. É impossível parar, é algo que eu amo”, conta.