A greve é um instrumento legítimo de resistência e a sua origem está diretamente ligada com a história de conquista de direitos por parte dos trabalhadores. O direito de greve está assegurado na Constituição Federal (art. 9º), competindo aos trabalhadores decidir sobre a melhor oportunidade de exercê-lo, bem como sobre quais interesses que devam por meio dele defender. A Lei n. 7.789/89 disciplinou sobre o exercício do direito de greve, definindo as atividades que são consideradas essenciais, regulando, inclusive, o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade e deu outras providências. Em contrapartida, o ordenamento jurídico brasileiro proíbe o lockout que é a paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos empregados (art. 17 da Lei n. 7.7789/89 e art. 722 da CLT).
A greve tem como finalidade exteriorizar a existência de um conflito entre a classe trabalhadora e a econômica acerca de questões definidas e não resolvidas através da negociação prévia. É uma forma legítima de autodefesa por parte dos trabalhadores organizados coletivamente através da participação de seu sindicato.
A deflagração da greve é ato último, devendo ser precedido, nesta ordem, nos termos da lei por: manifestação da insatisfação; provocação do sindicato representativo dos trabalhadores; convocação de assembleia; deliberação (quórum); pauta de reivindicações; tentativa de negociação diretamente com o patrão; negociação frustrada; nova assembleia; deliberação pela greve; comunicação no prazo legal (48 horas atividades e serviços ordinários e 72 horas antes nos essenciais) à entidade patronal, aos empregadores e a comunidade; início da greve.
As mudanças nas leis trabalhistas, nos últimos anos, contribuíram para a alteração da organização da forma de oferta do trabalho. Dois fatores podem ser observados como responsáveis diretos para essa nova organização, a diminuição do poder de mobilização dos sindicatos e o aumento da terceirização. A recentes modificações atingiram diretamente a forma de organização dos sindicatos em razão do fim do imposto sindical obrigatório, do papel fiscalizador das entidades nas terminações através das homologações e o fim da obrigatoriedade de prévia de negociação coletiva antes da realização de demissões plúrimas e coletivas.
A terceirização por sua vez, vem contribuindo para o rearranjo da mão de obra dentro das empresas, com a substituição de empregados por trabalhadores autônomos e ou empresas prestadoras de serviços. Ocorre que boa parte das empresas prestadoras de serviços são compostas exclusivamente pela mão de obra do empresário individual ou dos seus sócios, não contando com empregados.
O setor de transporte é, talvez, o melhor exemplo deste novo arranjo do mercado de trabalho, pois os antigos empregados, agora autônomos, empresários individuais ou sócios de empresas de pequeno porte estão se levantando contra as condições impostas pelo mercado nos últimos anos. O resultado é a dificuldade do Estado e do próprio mercado em identificar quem são os paredistas, pois há empregados, mas a maioria destes são os ex-empregados, hoje autônomos, empresários individuais ou sócios de sociedades empresárias sem empregados.
A negociação que antigamente era realizada com entidades sindicais hoje abre necessidade para a pulverização do dialogo com diversas entidades representativas como associações e grupos não organizados juridicamente, mas de forte apelo de mobilização, principalmente diante dos atuais e ágeis mecanismos de comunicação que são as redes sociais.
A reflexão que fica diante do atual acontecimento é se é melhor enfraquecer o sindicatos ou fortalecer estes contribuindo para a volta ao antigo modelo de organização e consequentemente para uma pauta centralizada com a identificação dos manifestantes, o que contribuiria, inclusive, para possível análise de abusividade do ato paredista e a responsabilização dos que abusassem dos seus direitos enquanto grevistas.
A lição que fica, aos olhos de um estudioso das relações trabalhistas, é que não há ação sem reação. As mudanças promovidas nos últimos anos, trouxeram novas formas de organização da mão de obra, e ao que parece, essa nem sempre passará pela participação dos sindicatos. Talvez aí esteja a dificuldade dos governantes, pois não se sabe com quem e para quem dialogar.