Caro leitor, você já se perguntou qual é a importância da verdade na sua vida? Provavelmente, quando desejou descobrir uma mentira, ela foi essencial. Entretanto, antes desse querer, a situação enganosa te incomodou. Então, a sua indisposição foi o start para rompimento da barreira da comodidade. Só depois disso você se movimentou. Contudo nem sempre a mentira provoca algum sentimento negativo, e é aí que mora o perigo.
Por vezes, as nossas crenças mais profundas são alimentadas por mentiras, tornando difícil a tarefa de enxergar a verdade, o que equivaleria a desconstruir a própria personalidade. A manipulação de informações sempre existiu em nosso meio, mas a atual velocidade de propagação intensificou o poder desse ardil, que fragiliza a democracia, à medida que interfere negativamente no direito à informação (a verdadeira).
No atual contexto, a preocupação advinda dessa vulnerabilidade é com a ingerência no resultado das eleições de outubro. A grande quantidade de informações fraudulentas veiculadas provoca confusão em parcela dos eleitores, principalmente nos indecisos, já que, no meio do bombardeio de fake news, fica difícil distinguir o que é verdadeiro e o que é falso. Na prática, é como se uma mentira repetida mil vezes se tornasse verdade.
Em 2017, o então presidente do TSE, Gilmar Mendes, já profetizava que “o nosso temor é que, numa campanha de 40 dias, a gente tenha sérios problemas com a divulgação de fatos inverídicos”. Não podemos ignorar o poder de influência do conteúdo inventado. Nas eleições americanas, por exemplo, os internautas foram bombardeados por notícias fraudulentas em desfavor da democrata Hillary Clinton, derrotada por Donald Trump. Hillary foi acusada, dentre outras coisas, de chefiar uma rede de pedofilia e de vender armas para o Estado Islâmico, inclusive. Na mesma época, curiosamente, foi disseminado que Trump contava com o apoio do Papa Francisco.
De acordo com estudo da FGV/DAPP, no segundo turno das eleições de 2014, cerca de 20% das interações no debate entre os seguidores do candidato Aécio Neves foram motivadas por robôs. Para piorar esse quadro, recentemente, o Facebook passou por mudanças de algoritmo para priorizar as visualizações de perfis de amigos e familiares em vez das páginas institucionais, em desprestígio às fontes de notícias reconhecidas, seguras, disseminadoras de material jornalístico de qualidade.
Na tentativa de barrar essa rede de intrigas, instituições como o TSE e o Exército trabalham intempestivamente, enxugando gelo, o que coloca nas mãos do cidadão a tarefa consciente de identificar a notícia falsa.
Não que ela seja difícil; aliás, há várias dicas nesse sentido, como atentar-se para a fonte da informação, checar os autores, buscar fontes de apoio, entre outras, mas o problema iminente a essa missão relaciona-se com uma questão íntima: vencer os próprios preconceitos e ter consciência de que a zona de conforto na qual se situam nossas crenças e as mentiras que as alimentam não é um local seguro.
Precisamos reconhecer que a verdade, por vezes, não se alinha com a nossa visão de mundo. Certamente, as circunstâncias e os fatos objetivos devem prevalecer sobre as emoções e as crenças pessoais.