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O centro democrático

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No ambiente turbulento da nossa política, uma aspiração parece galvanizar grande parte dos brasileiros: encontrar uma liderança capaz de expressar o pensamento democrata de centro, ou seja, equidistante dos extremos em que se situam a esquerda e a direita. A pouco mais de um ano da eleição de 2022, esse sentimento, contudo, não vai além de um anseio, uma vez que os partidos que poderiam viabilizá-lo não dão mostras de convergir para um nome que possa corresponder a esse perfil e seja dotado da necessária densidade eleitoral para tanto.

O quadro atual é inquietante: Lula encastelado no seu projeto de retornar à Presidência, pelo PT e pelos demais partidos da sua órbita; Bolsonaro, sem filiação partidária no momento, muito mais decidido a reeleger-se do que a governar. São dois candidatos obsessivos e compulsivos, no sentido de que vivem em função desse objetivo e por ele são capazes de tudo fazer. Se o primeiro não chega a ter comportamento extremista, nem por isso deixa de ser o ponto de atração dos radicais de esquerda; o segundo é um político declaradamente direitista. Dizer-se de direita deixou de ser, para os seus adeptos, um anátema para constituir quase uma virtude, a virtude de combater valentemente a esquerda. Assim como, para esta, durante muito tempo, todos os que não comungavam de sua ideologia eram logo batizados de direitistas.

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Cabe, aqui, um parêntese, para dizer que a direita, do ponto de vista rigorosamente ideológico, chegou a ter forte expressão no cenário político nacional, em determinados momentos. Primeiro, com a Legião de Outubro, formada pela falange dos camisas cáqui liderados por Francisco Campos, que se acercou do presidente Olegário Maciel, depois da Revolução de 1930, dos quais Pedro Nava nos fala, em página saborosa de O Círio Perfeito. Depois, com os integralistas, sob a chefia de Plínio Salgado, na mesma década de 1930, do século passado, movimento que muitos qualificam de “fascismo à brasileira”. Com o malogro do integralismo, depois do atentado ao Palácio Guanabara, em 1938, a direita desapareceu, no panorama político brasileiro, ainda que remanescentes daquela corrente viessem a engrossar, no regime militar, a chamada linha dura, que sufocou os propósitos de Castelo Branco no sentido de abreviá-lo.

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Com Bolsonaro, a direita ressurgiu, tendo o seu ideólogo Olavo de Carvalho e sua aguerrida militância. No cenário em que atua, contrapõe-se, com gosto e fervor, à esquerda que Lula encarna, gerando, assim, uma disputa curiosa e paradoxal, em que o êxito de um é cada vez mais dependente do potencial apresentado pelo outro para chegar ao segundo turno da eleição. Isso porque o crescimento mútuo dos dois antagonistas cria o ambiente de radicalização em que suas candidaturas podem florescer. Entre os dois, o coração de muitos brasileiros não balança, como sói acontecer nas escolhas difíceis; treme de preocupação e temor. Mas não há, até agora, quem se apresente em condições de salvar os nossos patrícios que assim pensam, isto é, de oferecer-lhes uma opção razoável. Em parte, por falta de nomes merecedores de apoio. Mas também – e sobretudo – porque os partidos políticos que poderiam revelá-los não são capazes de fazê-lo, por lhes faltarem ânimo, coesão, autenticidade e todos os demais atributos que se poderiam esperar num quadro partidário minimamente autêntico. Nessa dispersão geral, nessa apatia dos que poderiam fortalecer a democracia, nessa fuga espantosa do espírito público que deveria norteá-los, o que se vê não é uma linha política de centro democrático, mas a força atrativa do malsinado centrão, que nada tem a ver com o ideário político de que falamos.

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