O presidencialismo é um sistema de governo fadado a provocar crises políticas. Nele, o chefe do governo concentra, teoricamente, grande soma de poderes, mas nem sempre consegue exercê-los plenamente. Assim, ele tanto poderá ser um ditador constitucional quanto tornar-se refém do Congresso. Se contar com forte apoio na Câmara e no Senado, por pertencer a um partido forte ou por conseguir formar sólidas alianças partidárias, terá êxito. Se sua base no Congresso for pequena ou sem a necessária coesão, ver-se-á tentado a composições espúrias ou a práticas condenáveis. E se isso não der certo, ficará à mercê das crises políticas ou experimentará os entraves da ingovernabilidade. Tal só não ocorrerá sendo o presidente um político de forte personalidade ou uma figura carismática, capaz, até, de apelar ao povo contra as instituições – o que, porém, é sempre um risco de consequências imprevisíveis.
Entre nós, Jânio Quadros tentou fazê-lo com a jogada da renúncia e viu frustrado seu plano. Jango procurou contrapor à crescente oposição que o enfrentava as forças sindicais sob seu controle e chegou a reunir imensa claque no famoso comício da Central do Brasil – mas caiu. Collor e Dilma viram-se, de repente, em posições vulneráveis, em razão de erros que não tiveram perdão, porque estavam enfraquecidos politicamente. Juscelino, ao contrário, pôde levar até o fim a aventura de construir uma nova capital em cinco anos, porque tinha um grande partido a apoiá-lo. Lula governou durante oito anos por ser uma liderança carismática e sagaz, mas, sobretudo, à custa de um plano inescrupuloso de domínio do poder, cujas consequências só mais tarde se fariam sentir. Fernando Henrique foi, talvez, uma exceção, por beneficiar-se de um contexto histórico favorável. Político de outros tempos, Prado Kelly resumiu assim o paradoxo do presidencialismo: “Eis a tara do regime – identificar-se com o Chefe de Estado: ser grande ou pequeno como for o seu guia”.
Nos Estados Unidos, as eleições de novembro podem ser o prenúncio de crises semelhantes às que já experimentamos. De um lado, um político autoritário, inconsequente e histriônico, Donald Trump; de outro, uma candidata de qualidades pessoais inegáveis, que não é, contudo, uma forte liderança nacional, Hillary Clinton. Ambos parecem representar maus presságios para a estabilidade do sistema no país que o concebeu. Em todo caso, lá, como lembrava Afonso Arinos de Melo Franco, três fatores atuam para evitar ou conter as crises do presidencialismo: a perfeita ação dos partidos políticos, o sábio controle da Corte Suprema e o espírito público que faz de cada americano, pela sua consciência política, um constitucionalista natural.
No Brasil, urge promover ampla reforma política e reduzir o número de partidos para viabilizar o sistema presidencialista e assegurar condições de governabilidade ao presidente que o povo venha a eleger, em eleições livres e autênticas, imunes ao engodo dos marqueteiros.