Ao longo do tempo e, principalmente, após a pandemia de Covid-19, a saúde mental alcançou novo patamar de importância devido ao desencadeamento de transtornos mentais em todo o mundo. Diante desse cenário, o Ministério da Saúde (MS) anunciou o aumento de mais de R$ 200 milhões no orçamento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para 2023, quase o triplo destinado atualmente.
Com 6% dos brasileiros sofrendo com transtornos mentais severos e persistentes e 12% necessitando de algum atendimento em saúde mental, o investimento da pasta vem ao encontro do fortalecimento das políticas de saúde mental de modo a promover o atendimento humanizado, ampliar o acesso da população aos serviços de atenção psicossocial ofertados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e fomentar a Luta Antimanicomial, nascida em 1987, sob o preceito de que a liberdade é terapêutica e deve andar de braços dados à saúde e à cidadania.
O movimento foi fundamental para a reforma psiquiátrica, por meio da Lei 10.216/2001, com o fechamento gradual de manicômios e hospícios Brasil afora, bem como dez leis estaduais sobre o tema, mais de três mil Centros de Atenção Psicossocial (Caps), projetos de economia solidária e geração de renda, consultórios de ruas dentre outras atividades em prol da ressocialização de pessoas com transtornos mentais.
É preciso estudar o passado para construir um futuro diferente, com base nas experiências vividas. Neste sentido, a história da saúde mental no Brasil é, ao mesmo tempo, triste e complexa, já que o país tinha o maior parque manicomial da América Latina, com mais de 100 mil pessoas internadas. Barbacena, inclusive, foi palco de uma das piores atrocidades brasileiras com o Hospital Colônia que, entre 1930 e 1980, contabilizou 60 mil mortes e era descrito como um verdadeiro campo de concentração.
Fato curioso, mais de 70% dos pacientes não sofriam nenhuma doença, eram crianças rejeitadas por mau comportamento ou por alguma deficiência, filhos nascidos fora do casamento, mulheres violentadas, epilépticos, alcoólatras, integrantes da comunidade LGBTQIAPN+. Ou seja, pessoas marginalizadas à época que apresentavam alguma característica diversa à ordem social e ameaçadora à civilização dos espaços.
Para além de resgatar a história dos manicômios no país, o Movimento Antimanicomial é norteador ao cotidiano dos profissionais de saúde, pautados pelos princípios basilares do SUS de cidadania, equidade e integralidade. Modelo esse que ganhou reconhecimento da Organização Mundial de Saúde (OMS) em função de uma rede estruturada, com a oferta de serviços terapêuticos, o engajamento de diversos setores políticos e sociais e uma política de saúde mental exemplar.
O avanço ao contexto de saúde mental no Brasil começa com um adequado investimento em políticas públicas de saúde mental, focadas na garantia da dignidade, reinserção psicossocial e cuidado integral e humanizado em liberdade, perpassa a reorganização do modelo de atenção em saúde no qual troca-se a lógica da internação compulsória e exclusão social por serviços abertos, comunitários e territorializados e termina com o combate aos diversos estigmas e paradigmas da saúde mental enquanto lugar da loucura e periculosidade em um intenso trabalho de conscientização dentro e fora das unidades de saúde.