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Servidores públicos

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Os servidores públicos estão novamente na berlinda. Em mais uma dessas frases ditas e desditas, tão comuns no atual governo, o ministro da Economia chamou-os de “parasitas”. Lembro-me de uma canção carnavalesca, do início dos anos 1950 da centúria passada, que os ridicularizava na figura da Maria Candelária. Era a “alta funcionária”, que caíra de paraquedas na letra “O” (então um nível elevado) e trabalhava “de fazer dó”, indo a vários lugares, durante o expediente, para só voltar à repartição no fim do dia, quando “assina o ponto e dá no pé”. E a música, cantada pelo inesquecível Blecaute, terminava com este verso picardioso: “Que grande vigarista que ela é!”. Blecaute era faceiro e divertido, Paulo Guedes é mal-humorado e injusto.

Em qualquer país que busque eficiência no serviço público, um quadro funcional qualificado, estável e bem pago, é indispensável para possibilitar às administrações que se sucedem continuidade na prestação dos serviços e garantia de que as funções por estes exigidas estarão a cargo de pessoas que encontrem no seu exercício a mesma possibilidade de realização oferecida pela iniciativa privada. Ensinava um dos nossos maiores administrativistas, Ruy Cirne Lima, que, entre o funcionário e o Estado, estabelece-se uma relação dominada pela finalidade que o serviço público tem em vista, qual seja a de atender ao interesse dos usuários, enquanto na relação comum ao trabalho privado prevalece a vontade das partes contratantes – empregador e empregado. Esta é, pois, uma relação de trabalho; aquela, uma relação administrativa. Disso derivam para o servidor público deveres e restrições inexistentes na esfera privada, direitos e vantagens diversos daqueles que se atribuem aos empregados, propriamente.

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Em suma, os regimes de uma e de outra dessas categorias são distintos. O servidor goza – e deve gozar – de estabilidade, que lhe dê a garantia do cargo, depois de comprovada aptidão para o seu exercício, durante o chamado estágio probatório, e faz jus a determinadas concessões peculiares às suas responsabilidades, as quais compensam a falta de determinados direitos que só aos empregados particulares se reconhecem. Sem a garantia da estabilidade, o servidor se sujeitaria à vontade e aos humores do governante do dia, aos caprichos e às perseguições tão comuns em nosso país nos tempos, ainda recentes (e não de todo desaparecidos), do coronelismo político. Por outro lado, não desfrutam os servidores da proteção que têm os trabalhadores da iniciativa privada. Estes contam com uma Justiça especializada – a Justiça do Trabalho – e um processo próprio para a solução dos seus litígios, dominado pelo princípio da proteção, a partir do pressuposto de que constituem a parte mais fraca na relação de emprego.

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Ao lado dessa Justiça, há o Ministério Público do Trabalho, que vela pelos direitos dos empregados. Já os servidores podem esperar que, de repente, saia das páginas do romance de Victor Hugo para a realidade da vida um inspetor Javert, pronto a esmiuçar os seus prontuários e neles descobrir um direito a ser suprimido, uma gratificação supostamente inconstitucional, um pretexto, enfim, que sirva aos intuitos de cortar gastos tidos como supérfluos ou desperdiçados com a sua remuneração. Há, é certo, no Brasil, lei que impõe limite a isso: os atos administrativos só podem ser revistos pela própria Administração no prazo de cinco anos. Mas somos o país das leis, e não o dos homens públicos comprometidos a respeitá-las…

O ministro Paulo Guedes compõe o lado do Governo Bolsonaro que ainda inspira confiança e esperança aos brasileiros. Deve mudar a sua concepção sobre os servidores públicos.

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