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Os embargos infringentes

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A suprema decisão de nossa Corte Maior sobre a sobrevivência dos embargos infringentes traz ínsita a constatação da balbúrdia que pode causar uma lei feita como se fazem as salsichas. Que valor pode ter um mandamento legal que conduz cinco ministros do STF a sufragar um entendimento diametralmente oposto ao de seis outros ministros componentes do mesmo tribunal? A confusão começa já pelo critério adotado para o julgamento de uma questão, digamos assim, burocrática. A questão burocrática é a seguinte: o recurso conhecido como embargos infringentes teria sobrevivido à promulgação da Constituição de 1988?

Para resolvê-la foram necessários seis votos, ou seja, maioria absoluta no STF. E para rever uma decisão condenatória qual o quorum exigido? Quatro votos num universo de 11. Uma simples operação matemática vai nos dizer que pouco mais de 1/3 é o bastante para fazer balançar uma condenação criminal e exigir revisão do julgamento. Sete votos condenatórios não prevalecem contra quatro votos absolutórios; 36,36% valem mais que 63,64% na apreciação de uma questão criminal de suma importância. Já quando se trata de decidir questão menos relevante, saber se tal ou qual lei ainda vige, reclama-se a maioria absoluta. A questão incidente aparenta ter mais importância que a questão do mérito penal. Parece-nos que mais justo – porque réu e vítima devem estar em pé de igualdade perante a Corte Suprema na hora do julgamento – seria exigir, para propiciar o reexame via embargos infringentes, cinco votos absolutórios.

Lado outro, se uma péssima lei subverte o equilíbrio da mais alta Corte de Justiça do país e conduz a uma decisão de quase empate – 6 x 5 -, não seria mais consentâneo com a justiça social e com a norma de que o coletivo deve prevalecer contra o particular que o voto desempatador prestigiasse a vítima, no caso, milhões de brasileiros sem cara e sem nome que sofreram as consequências do desvio de verbas públicas praticadas pelos réus e sua agressão ao Estado democrático pela tentativa de dominação? Não nos esqueçamos, mais, que a regra do in dubio pro reu pode ser afastada, considerando a existência de nada menos que sete votos condenatórios e o fato de que tal afastamento não é novidade no universo do direito penal.

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Se vigora o na dúvida favoreça-se o réu num julgamento por juiz singular, nos processos de competência do tribunal de júri a decisão de pronúncia já inverte o quadro, e, agora, prevalecerá o na dúvida favoreça-se a sociedade. Será pervertida nossa estrutura processual, que faz a Justiça ser carinhosa com os poderosos? Será nossa Justiça organizada para eternizar os processos e só punir os sem nome, os sem poder e os sem dinheiro? Disse o ministro Marco Aurélio, defendendo a não existência dos embargos infringentes, que admiti-los no Supremo Tribunal Federal enquanto eles não existem nos tribunais de Justiça estaduais nem nos tribunais regionais federais e nem no Superior Tribunal de Justiça seria uma incongruência porquanto a justiça não fecha. Isto propiciou um jocoso e mordaz comentário de João Ubaldo Ribeiro, para quem do lado de cá, a impressão que muitas vezes se tem é de que ela já fechou há muito tempo. E viva o Brasil.

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