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O incômodo de existir

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Diferentes motivos levam pessoas a morar nas ruas. Por divergências na família, ou por falta de uma, pela pobreza material, bebida, drogas ou pela simples vontade de viver livre. Diagnóstico realizado pela Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS) da Prefeitura de Juiz de Fora apontou que, em dezembro do ano passado, quase 900 pessoas se encontravam em situação de rua na cidade. Essa mesma pesquisa mostrou que 70% dessas pessoas sofrem de algum tipo de violência moral e 64% delas alegaram já ter sofrido algum tipo de furto ou roubo.

Em maio, fomos surpreendidos pelas ações do prefeito João Dória, na cidade de São Paulo, que, em um de seus desmandos, ordenou que fosse feita a internação compulsória de moradores da região conhecida por cracolândia. Como se não bastasse a violência do ato, especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU), em entrevista à BBC, afirmaram que a internação sem espontânea vontade do usuário de crack é ineficiente e que o nível de reincidência é alto.

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Além de obrigar que os moradores da região fossem internados, Dória deu início ao seu projeto de revitalização urbana, que obviamente não inclui as pessoas em situação de rua. Não podemos ignorar que o caso da cracolândia também envolve uma questão de segurança pública, visto que o tráfico também está presente no local. Porém, tratar em posição de igualdade os usuários de drogas, moradores de rua e crianças que dividem o mesmo espaço está longe de ser uma solução cabível para o problema. O caso foi tão longe que, durante a operação, um prédio que estava ocupado, começou a ser demolido com pessoas dentro.

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Em Juiz de Fora, a situação não é tão grave quanto em São Paulo, em poucos pontos da cidade acontece essa concentração de pessoas em situação de rua em uma única região. Há algum tempo, a presença de um homem de meia idade com seus dois companheiros caninos, faz parte do cotidiano de quem passa pela Rua Halfeld. Ele é o Sr. Lucélio. Infelizmente também é corriqueira a reclamação de comerciantes e pessoas que passam pelo Centro. Um dia desses, ouvi uma senhora dizer que a presença do Sr. Lucélio na Halfeld “é uma agressão à sociedade”.

Então, questionei-me qual crime o Sr. Lucélio poderia ter cometido para ser acusado de agressor. Segundo a SDS, o serviço de abordagem já foi até ele, tentando convencê-lo a participar de um dos programas sociais da Prefeitura, e ele se recusa. Talvez a agressividade esteja no olhar daquela senhora. Por que é tão raro conseguir ver humanidade nas pessoas que estão nas ruas? Por que é tão difícil enxergar vidas além das estatísticas?

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Falhamos como sociedade a partir do momento em que não tratamos todas as pessoas em pé de igualdade. Todos os seres humanos têm desejos, sentimentos, vínculos afetivos independentemente da sua condição. É lamentável ver o desconforto de algumas pessoas em relação a quem está em situação de rua, como se eles fossem meros objetos não estéticos ocupando a calçada na porta de uma casa ou comércio. Além de todas as dificuldades de uma vida tão incerta, os moradores de rua ainda enfrentam o grande incômodo de sua própria existência.

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