Em maio de 2009, alguns dias após o então presidente americano Barack Obama ter se referido ao presidente Lula como “o cara”, por entender que o brasileiro era o “político mais popular do mundo”, o Governo enviou uma comitiva com 13 ministros para Genebra. A trupe responderia indagações da ONU, que promovia uma sabatina para avaliar os direitos sociais no Brasil. Com as estatísticas de todos os programas sociais existentes ou em gestação na ponta da língua, o staff brasileiro foi surpreendido por uma pergunta proverbial do perito da ONU, Alvaro Tirado Mejiam, que denunciou a construção de muros entre favelas e bairros ricos no Rio de Janeiro. “O que está sendo feito contra esses projetos?”
No último dia 24 de janeiro, a Universidade Federal de Juiz de Fora anunciou que iria cercar o Lago dos Manacás, no campus universitário. Como justificativa, citou a necessidade de manutenção do espaço acadêmico-científico, a preservação da biodiversidade encontrada no local e a prevenção de acidentes. Até aí nenhuma novidade. No vexame na ONU em 2009, o então governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, explicou que seu objetivo era conter a expansão das comunidades e proteger a floresta.
Em seu portal na internet, a universidade chegou a citar dois experimentos científicos que tiveram o Lago dos Manacás como objeto de estudo. Um para obter dados climatológicos de alta precisão e outro para precisar qual o tempo de vida útil do lago. Também mencionou que usa a água armazenada para ajudar na estética paisagística. Lá no sexto parágrafo do release, há uma referência à prevenção de acidentes. Em bom português, as crianças e os adolescentes do Bairro Dom Bosco estão nadando no Lago dos Manacás e podem se afogar.
A partir daí, o texto, assinado pela Diretoria de Imagem Institucional, enumera uma série de “opções de lazer e interatividade para a comunidade externa”. No papel, as tais “opções de lazer e interatividade” parecem interessantes, mas, como a molecada continua nadando em local proibido, a efetividade das propostas merece ser questionada. Como também merece pouco crédito, o suposto apoio à medida dado pelos integrantes da Sociedade Pró-Melhoramentos (SPM) do bairro, que não se preocuparam em levar a contenda para seus representados.
Não precisa ter diploma universitário para saber que a cerca foi o caminho mais curto encontrado pelos doutores da Universidade Federal de Juiz de Fora para afastar a vizinhança incômoda. Se pularem a cerca, os seguranças poderão agir. Se afogarem, foi feito o possível para evitar. Estranho é o silêncio dos cientistas sociais da instituição, do pessoal do Serviço Social. Podem estar imobilizados pela política universitária ou talvez estejam só dormindo. Enquanto o perito da ONU não aparece, as crianças e os adolescentes do Bairro Dom Bosco terão que lidar com mais uma barreira.
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