Desde a criação do orçamento secreto, o Congresso Nacional tem se valido de emendas para exercer um papel próprio do Executivo, por ter o papel de agenda na liberação de recursos para estados e municípios. Até aí é do jogo, mas o que se viu, no decorrer do tempo, foram ações pouco republicanas, já que muitos dos repasses, em vez de benefícios coletivos, estavam privilegiando grupos, muitas vezes ligados diretamente aos parlamentares. Em vez de solução, a liberação de emendas virou uma queda de braço.
Senador por mandato concedido pelo eleitor do Maranhão, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, conhece de perto as artimanhas e meteu o dedo na ferida e de modo simples: quer que os parlamentares apontem o destino das emendas e quais os benefícios que irão promover. Como o orçamento ainda tem contornos secretos, exigiu, também, que o nome dos autores fosse explicitado nos repasses ante a suspeita de ações cruzadas, isto é, um parlamentar beneficiaria projetos do outro e vice-versa.
No dia 2 dezembro, o ministro liberou o pagamento de emendas que estava restringido desde agosto, mas estabeleceu critérios que desagradaram os parlamentares. No dia 12, 17 líderes da Câmara enviaram ofício ao Governo pedindo a liberação de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão. O Executivo liberou, mas Dino, de novo, suspendeu o pagamento por considerar que as indicações não atenderam aos critérios estabelecidos: a identificação dos autores das emendas.
Nessa queda de braço, o Governo se mantém apartado, por não querer contrariar o ministro e muito menos o Congresso, sobretudo em razão das pautas que tramitam tanto na Câmara quanto no Senado. No domingo, Dino flexibilizou sua decisão, para evitar insegurança jurídica, mas voltou a ressaltar que o processo é uma verdadeira balbúrdia.
Não se sabe até onde vai esse impasse, pois o ministro está agindo isoladamente por ser o titular da causa, mas há necessidade de envolvimento dos pares, uma vez que o que ele ora cobra é fruto de uma reunião da qual participaram representantes dos três poderes. É necessário avaliar se o que foi acordado está sendo cumprido ou se o ministro está indo além dos autos.
Isto posto, não há margem para novos enfrentamentos entre os poderes, por darem motivo aos segmentos que questionam tanto o Congresso quanto o Judiciário, envolvendo também o Executivo, para apresentarem suas pautas contra as instituições. Ademais, o país entra em 2025 com uma série de questões que precisam ser resolvidas especialmente pelo Congresso.
Os futuros presidentes da Câmara e do Senado precisam estabelecer uma nova governança, capaz de pacificar os poderes e, sobretudo, atuar em pautas de interesse do país. O mandato de Arthur Lira, já na sua etapa final, foi marcado mais para dentro do que para fora, isto é, o parlamentar acumulou poderes por olhar mais para os seus pares do que para a sociedade.